23/Oct/2025
À frente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), o ex-embaixador Rubens Barbosa tem uma visão privilegiada do cenário de trocas comerciais do Brasil. Para ele, os entendimentos sobre as exceções ao tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, serão conquistados com a pressão de empresas prejudicadas. São os interesses econômicos e comerciais das empresas norte-americanas e brasileiras que estão moldando a política comercial dos Estados Unidos em relação ao Brasil. O ex-embaixador avalia que uma mudança na lista de exceções ao tarifaço seria construída em paralelo ou a partir do encontro entre os presidentes Lula e Donald Trump, no domingo (26/10), na Malásia, durante a Cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático. A redução poderia chegar a 40%, retomando o nível de 10% anterior ao tarifaço. Segue a entrevista:
Quais são as expectativas para a safra de trigo que está sendo colhida no País?
Rubens Barbosa: Nós trabalhamos com os números da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento): 7,7 milhões de toneladas. É menor do que o ano passado. E a volatilidade do preço é enorme.
E quanto às importações?
Rubens Barbosa: Haverá um aumento das importações da Argentina. Há aumento da demanda para farinha. No ano passado, foi de 3%. Então, estamos projetando um aumento da demanda. E, até o momento, já foram importadas mais de 5 milhões de toneladas da Argentina, mais dos Estados Unidos, da Rússia, do Uruguai e Paraguai. Acho que neste ano teremos importação de mais de 6 milhões de toneladas da Argentina.
Quais são as perspectivas para o preço?
Rubens Barbosa: O preço do trigo é fixado na Bolsa de Chicago, na Bolsa de Kansas e pelo trigo da Rússia, que é mais barato, pelo preço da Argentina. Não é fixado aqui, tem uma influência muito grande do mercado internacional. E a volatilidade do preço no mercado internacional está muito grande, sob impacto do clima nos EUA, a geopolítica da Rússia. Não dá para prever o que vai ser agora com a entrada da safra brasileira. O preço aqui tem sido muito deprimido, e esses últimos dias subiu um pouquinho.
Em quanto se estima a necessidade do Brasil?
Rubens Barbosa: A necessidade do Brasil é 12,5 milhões a 13 milhões de toneladas de farinha.
A volatilidade de preços pode levar à falta de trigo?
Rubens Barbosa: Não há nenhum problema de abastecimento. Está sobrando trigo no mundo. E neste ano a gente vai comprar mais da Argentina também porque o preço lá está bom. O volume pode até passar de 6 milhões de toneladas. E os moinhos do Brasil compraram muito no primeiro semestre, logo no primeiro trimestre. Compraram quantidades que nunca compraram antes. E também virá alguma quantidade dos EUA e da Rússia por causa do preço. Para os Estados do Norte e Nordeste, fica mais barato do que trazer da Argentina.
Em relação às negociações do Brasil com os EUA, a lista de exceções ao tarifaço pode aumentar?
Rubens Barbosa: Isso aí vai sair por interesse norte-americano. Não é por pressão brasileira. Os empresários americanos é que estão levando isso ao governo dos EUA e os empresários brasileiros que foram afetados. O Joesley [Batista, acionista da J&F, controlador da JBS] tem a carne pagando 50% mais. Ele contribuiu para a eleição americana, ele foi lá reclamar. São os interesses econômicos e comerciais das empresas americanas e brasileiras que estão moldando a política comercial dos EUA em relação ao Brasil. A nossa exportação para os EUA representa 1% das importações americanas. Não é importante. E, dentro das nossas exportações, os EUA são apenas 10%. Também não é importante.
Quem está sendo mais afetado?
Rubens Barbosa: Os outros, que têm 20%, estão sofrendo. São pequenas e médias empresas de madeira, autopeças, que não tem como recolocar os produtos. O café foi para a China. A carne também foi para outras praças. Mas os produtos industriais, como calçados, foram afetados, pois são feitos sob medida para outras empresas, não tem como redirecionar.
O sr. acredita que a mudança nas exceções pode acontecer ainda neste ano?
Rubens Barbosa: Isso vai coincidir com o encontro entre os presidentes. Se o presidente Lula não fizer nenhuma coisa diferente, por causa da Venezuela, acho que quando eles se encontrarem, vão bater o martelo. Isso porque é pouca coisa a se negociar, o trabalho técnico já foi feito. Eu acho que o big tech é muito mais importante que o comercial.
Como o senhor vê essas negociações?
Rubens Barbosa: Pelo que o vice-presidente e ministro de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, informou, ele fez duas reuniões e tem uma agenda. Se isso for mantido, é muito fácil. Apresenta-se a agenda, eles aprovam, e o setor privado americano discute com o governo brasileiro a agenda que eles mesmos já aprovaram.
O tarifaço deve acabar?
Rubens Barbosa: O tarifaço vai ser negociado para diminuir muito. Pode ser que diminua até 20%, 25%. Era 10%, acrescentou mais 40%. Esses 40%, acho que vão desaparecer.
Fonte: Broadcast Agro.