27/Sep/2024
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) quer a revisão, por parte do governo federal, da cota adicional para importação de trigo fora do Mercosul com isenção de imposto de importação. A cota extra, aprovada pela Câmara de Comércio Exterior (Camex) na última semana, entrou em vigor ontem e vai permitir a entrada no País de 250 mil toneladas de trigo sem a aplicação da Tarifa Externa Comum (TEC) de 9% até 31 de dezembro. Para a CNA, a entrada desse cereal sem imposto de importação no País vai pressionar os preços pagos ao produtor, que se encontram abaixo do patamar mínimo em algumas regiões produtoras. O pedido de reavaliação da cota extra será encaminhado pela CNA em ofício, acompanhado da nota técnica apontando os impactos da medida, ao Ministério da Agricultura e ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), ao qual a Camex está vinculada. A entidade já havia manifestado a repulsa pela medida em virtude dos impactos aos triticultores. É uma decisão recente que precisa ser revisada.
O timing da decisão é inadequado em meio à entrada da safra nacional e à queda dos preços do cereal. Não há benefício direto aos consumidores, apenas impactos desproporcionais aos produtores rurais. A cota adicional para importação de trigo isenta da Tarifa Externa Comum do Mercosul (TEC) para países de fora do bloco foi pedida em junho pela Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), ocasião na qual solicitou volume extra de 500 mil toneladas. A indústria alega maior necessidade de compras externas do cereal após a frustração da safra passada. Há uma cota em vigência de 750 mil toneladas anuais sem incidência da TEC para importação de trigo de países de fora do Mercosul. De acordo com o MDIC, 95% da cota anual já foi utilizada. O MDIC justificou que o aumento temporário da cota para importação de trigo visa evitar eventual desabastecimento do cereal. Entretanto, o setor produtivo era contrário à medida, sobretudo pelo eventual impacto nos preços domésticos e pela conjuntura atual de abastecimento.
Os dados mostram que o Brasil, mesmo diante de quebras de safra e de crises internacionais importantes, se ajustou setorialmente para manter o abastecimento interno de trigo por meio de ajustes domésticos e com importação do Mercosul ou mesmo usufruindo da cota já estabelecida. Dessa forma, a complementação da cota não se justifica diante das atuais condições de mercado e de abastecimento. Com isso, a CNA comunica sua oposição à elevação da cota de importação de trigo com alíquota zerada, argumenta a entidade no ofício direcionado ao governo. Os preços do cereal recebidos pelos produtores seguem achatados, acompanhando o recuo de 40% nos preços internacionais do grão, saindo do máximo de US$ 350,00 por tonelada há dois anos para US$ 211,00 por tonelada neste mês. No Rio Grande do Sul, o preço recebido pelo produtor no dia 25 de setembro, data de início da vigência da cota, atingiu R$ 68,00 por saca de 60 Kg em Não-me-Toque, abaixo do Preço Mínimo para a região, de R$ 78,51 por saca de 60 Kg.
A persistência desse patamar, somada aos custos de produção ainda elevados, vai levar à discussão da necessidade de medidas do governo de apoio à comercialização para reduzir o prejuízo ao produtor rural, o que é contraditório com a adoção da cota. O recuo dos valores deve aumentar em outubro e novembro com o avanço da safra nacional. O impacto real da cota extra nos preços internos do cereal vai depender também do descolamento das cotações domésticas com as externas. Os preços internacionais sinalizam para a redução, com perspectiva de aumento no balanço de oferta global e demanda mundial tímida. Nesse cenário, a cota é um agravante para os preços domésticos. A situação atual de abastecimento do mercado com a colheita da safra nacional e maior oferta argentina do cereal é confortável à demanda doméstica, sem a necessidade de incremento na cota de importação.
A CNA cita a recuperação na produção nacional de trigo, para 8,807 milhões de toneladas previstas neste ano, devendo chegar a uma oferta total de 15,31 milhões de toneladas com importação, contra um consumo interno estimado de 11,89 milhões de toneladas. Não há déficit de suprimento pela produção nacional que demande complementação externa para além das previsões já feitas. Além disso, a produção argentina deve crescer 14%, com aumento previsto de 40% nas exportações. A Argentina é o principal fornecedor de trigo ao Brasil. A eventual entrada "exacerbada" de trigo com isenção tarifária, dada a elevação da cota pelo governo, combinada com os preços pouco remuneradores, pode frear o movimento de expansão do cultivo do cereal no País. A mensagem do governo ao mercado é de interferência artificial. A sinalização é a de que o governo está disposto a ceder a qualquer eventual necessidade acima da cota, independentemente do equilíbrio de mercado, o que desestimula a produção e leva o triticultor a recorrer a outras culturas. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.