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20/Jul/2022

Pesquisa valida a alta qualidade do trigo brasileiro

O Brasil produz trigo de alta qualidade. É o que atesta a pesquisa conduzida pela Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), Embrapa Trigo (RS) e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) com o trigo cultivado no Cerrado Mineiro (MG). Além do desempenho tecnológico, mostra bom rendimento no campo e na agroindústria, com características especiais que habilitam seu uso na panificação industrial, segundo a Instrução Normativa nº 38/2010, do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A expectativa é que o resultado incentive ações de pesquisa e desenvolvimento para geração de novas cultivares adaptadas ao solo nacional e estimule políticas públicas de fomento à cadeia produtiva, reduzindo a dependência brasileira da importação do cereal.

O estudo foi publicado no Journal of Food Processing and Preservation sob o título: Brazilian Cerrado Wheat: Technological Quality of Genotypes Grown in Tropical Location (“Trigo do Cerrado Brasileiro: qualidade tecnológica dos genótipos cultivados em locais tropicais”, em tradução livre), e contou com financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Foram estudadas 34 amostras provenientes de 12 genótipos de trigo desenvolvidos pela Embrapa e cultivados sob sistemas irrigado e de sequeiro, em cinco municípios do Cerrado Mineiro. Os testes clássicos de caracterização físico-química e reológica (viscosidade) das amostras de trigo tropical mostraram qualidade tecnológica muito boa.

As análises indicaram elevada força de glúten na maior parte delas, comprovando que o cereal é apropriado para ser utilizado na panificação ou mesmo em mescla com trigo de força menor, em caso de ser melhorador. Segundo a Embrapa Trigo, existe um enorme potencial comercial a ser explorado com o cultivo do trigo em ambientes tropicais, como o Cerrado Brasileiro. A região de Cerrado é caracterizada por não ter chuva na época de colheita, assim, os grãos são sadios com baixa atividade da enzima alfa-amilase, ou seja, não se apresentam germinados, sendo, portanto, adequados para produção de farinha para fazer pão. Além disso, os grãos, em geral, apresentam textura dura, gerando um bom rendimento em farinha, o que é muito interessante para os moinhos em termos comerciais.

Na moagem industrial, quando os grãos são duros, a casca ou farelo separa-se mais facilmente do endosperma (parte branca do interior do grão), permitindo rendimentos mais elevados em farinha branca. Além dos estudos reológicos clássicos, a equipe de pesquisa realizou uma abrangente caracterização do amido, a partir de análises inéditas com o trigo do Cerrado. A equipe promoveu uma correlação estatística com 36 variáveis, que compreenderam desde aspectos ligados ao plantio até a transformação industrial do trigo em farinha para uso alimentício. “Identificamos um equilíbrio entre os teores do amido danificado e da força de glúten nas amostras analisadas, adequados para produção de pães de qualidade, com miolo macio, crosta crocante e visual atraente. Especialmente as variedades cultivadas no município mineiro de Piumhí (MG) expressaram um alto nível de amido resistente, devido ao clima e ao solo da região.

Esse trigo apresenta uma estrutura molecular de amido mais cristalina, compacta e organizada, o que indica ser mais resistente à digestão, compatível, portanto, com potencial efeito prebiótico. Essa fração de amido resistente possui ação metabólica de fibra alimentar, trazendo benefícios para a microbiota intestinal e, consequentemente, para a saúde humana. Trata-se de um diferencial superinteressante do trigo cultivado no Cerrado Mineiro para o desenvolvimento de alimentos funcionais que contribuem para a promoção de uma alimentação mais saudável. Em síntese, os dados analisados pelos pesquisadores e publicados no artigo científico indicam que o Cerrado possui grande potencial para se tornar uma das maiores regiões produtoras de trigo de alta qualidade no mundo.

Para alcançar esse patamar, é preciso continuar investindo em pesquisa e desenvolvimento de novas cultivares de trigo adaptadas ao solo nacional e avançar em políticas públicas para incentivar a cadeia produtiva. Com a alta global de preços de cereais como o trigo, que aumentou mais de 50% nas últimas quatro décadas segundo o índice global de preços da Organização das Nações Unidade para a Agricultura e Alimentação (FAO), a expansão da produção de trigo em território nacional com qualidade e produtividade pode tornar o País menos dependente dos impactos do mercado internacional. Com alta produtividade e qualidade de cultivo em várias regiões do País, como o Cerrado Mineiro, qualquer um pode se perguntar o motivo de o Brasil ainda importar trigo.

A resposta para esta questão não é simples, e sua solução envolve a atuação de vários atores da cadeia produtiva. A questão logística afeta negativamente a triticultura, devido aos altos preços do transporte terrestre em um país com dimensões continentais como o Brasil. O excedente do trigo produzido no Rio Grande do Sul é exportado para outros países, e não abastece as Regiões Norte e o Nordeste do País. Uma das razões é que não há onde armazenar os grãos de trigo produzidos em excesso no Brasil. Nos silos de armazenagem de grãos no Brasil, o carro-chefe é a soja, em segundo lugar, o milho, e o trigo vem apenas em terceiro lugar.

Faltam políticas de compra pública e de armazenamento de grãos, que ainda é precário em um país tropical como Brasil. O trigo brasileiro é de nível internacional, mas os produtores precisam de segurança para ampliar a área plantada e contar com a compra garantida pelo governo. É preciso investir em políticas públicas para este setor e para outras culturas de inverno, para ser mais rentável ao produtor investir nesta cultura. Para tentar superar esta dificuldade, no setor privado começa a ser observada uma estratégia comercial dos moinhos em subsidiar uma parte da produção nacional de trigo com garantia de compra após a colheita.

Com a cevada, por exemplo, praticamente toda a produção é comprada pelas fábricas de cerveja nacionais. Outra questão importante sobre o cultivo de trigo na região de Cerrado é a suscetibilidade à seca e a brusone, que é a principal doença do trigo na região tropical. É necessário um contínuo desenvolvimento de novas cultivares com resistência à seca e a brusone, combinadas com elevada produtividade de grãos e qualidade tecnológica adequada ao uso final, seja para uso doméstico ou industrial para essa região. O Programa de Melhoramento Genético de Trigo da Embrapa desenvolve cultivares adaptadas a cada uma das regiões brasileiras.

Para isso realiza inúmeros testes em campo e cruzamentos entre genótipos de trigo para avaliar quais novas plantas e manejos fitotécnicos são indicados para cada região. Para a tropical são feitos cruzamentos a partir de genitores que confiram maior resistência à seca, produtividade, bem como qualidade tecnológica adequada principalmente à panificação, que é o maior nicho de mercado no Brasil (mais de 55% da demanda). A cultivar BRS 264 adotada em ambientes tropicais tem se mostrado bem resistente à seca e excelente para produção de pães.

Por ser um produto de ótima qualidade, a farinha produzida a partir desse trigo pode ser comercializada a preço superior e resultar em produtos alimentares, como diversos tipos de pães, biscoitos tipo “cracker” e massas alimentares secas que atendam a demanda de consumidores mais exigentes. Nesse sentido, é imperativo o contínuo investimento público em programas de melhoramento de trigo no Brasil. A Embrapa sempre desenvolvendo novas cultivares de trigo para atender às necessidades que surgem no campo e às demandas da indústria moageira e de uso final ao longo do tempo. É um trabalho contínuo que beneficia todo o complexo agroindustrial do trigo. Fonte: Embrapa. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.