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09/Mai/2022

Trigo pode ser commodity de exportação do Brasil

Em uma das maiores cooperativas agrícolas do País, a Cotrijal, no Rio Grande do Sul, o trigo anima os produtores. Depois de um verão de forte estiagem que prejudicou cultivos de soja e milho no Estado, as terras das quase 19 mil propriedades associadas preparam a semeadura de inverno, com expectativa de crescimento de pelo menos 20% de área destinada ao cereal. O mais importante que influencia a decisão do produtor é o mercado. Os produtores têm dependido menos de governo, e o mercado do trigo dá sinal de preços atrativos. O interesse é relacionado à alta da commodity no mercado internacional. O preço, que já vinha subindo desde o ano passado, disparou depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, no fim de fevereiro. A cotação chegou a um patamar 78% maior que o registrado há um ano, aponta o Programa das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). A guerra trouxe instabilidade para toda a cadeia do cereal, o terceiro mais consumido do mundo, atrás do arroz e milho.

A queda na oferta do trigo ucraniano e a desaceleração dos embarques da Rússia, potências fornecedoras, desorganizaram o mercado e movimentaram o setor no Brasil. É uma nova era para o trigo. Há quatro anos, o trigo era vendido a R$ 30,00 por saca de 60 Kg. Hoje, o produtor vende por pelo menos a R$ 94,00 por saca de 60 Kg. Depois de anos de recuo e instabilidade, a área de cultivo do cereal no Brasil deve aumentar. Além de Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, responsáveis por cerca de 90% da produção nacional, São Paulo e Minas Gerais são outros polos importantes. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) observa a tendência de expansão, mas pontua que ainda é cedo para cravar os números. A semeadura do trigo começa em maio e segue até junho, com colheita até outubro. Antes de o plantio ter início, a Conab estimava que pelo menos 7,9 milhões de toneladas seriam colhidas até o fim do ano, 3% a mais que a safra anterior.

Originário do Sudeste Asiático, o trigo chegou ao Brasil por volta de 1530, com os colonizadores. Por ser uma gramínea que necessita de temperaturas mais frias, geralmente entre 10 ºC e 19 ºC, a produção se concentrou na Região Sul do País. Embora tenha sido praticamente extinto em 1822 por causa da doença ferrugem, o cultivo reapareceu no século XX e virou prioridade de Estado. Entre 1967 e 1990, a cadeia tritícola foi regulada pelo governo federal, com subsídios aos produtores e preço de venda garantido. Com o fim da intervenção estatal, a área plantada encolheu de 3,91 milhões de hectares em 1986 (a maior já registrada no País) para 1 milhão de hectares em 1995. O período coincidiu com a criação do Mercosul, o que aumentou a competição e colocou a Argentina como uma das principais fornecedoras do Brasil. Segundo a Associação Brasileira Indústria Trigo (Abitrigo), há preocupação com a vulnerabilidade da dependência brasileira do fornecimento para atender o mercado interno.

O País Importa 60% da farinha que consome, principalmente da Argentina, Estados Unidos e outros países do Mercosul. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) estima que há um potencial de até 22 milhões de hectares extras para o plantio no País inteiro. Para suprir a demanda interna, o avanço da cultura para o Cerrado é visto como uma alternativa. No Cerrado, existe um bom potencial, de 1 milhão a 2 milhões de hectares para próxima década. Isso significa um crescimento de até 100% da área que existe hoje. Se os planos derem certo, o País deve passar de importador a exportador importante. Isso vai colocar o Brasil até como um possível fornecedor internacional. O País produz quase 8 milhões de toneladas e o consumo é de 12 milhões. Se nos próximos anos houver aumento da área plantada e da produção, vai haver excedente para a exportação. Em 2021, a produção brasileira de trigo foi de 7,7 milhões de toneladas, com importação de outras 6,2 milhões.

Por causa do preço internacional, nem tudo o que é produzido no Brasil fica no País, 1,1 milhão de toneladas seguiram para países como Arábia Saudita, Vietnã e Indonésia. Na Região Sul, onde muitas terras não são usadas durante o inverno, a expectativa é que elas passem a receber mais trigo. A área usada para plantios de verão, principalmente soja, é cerca de 5 a 7 vezes maior que a de inverno. É preciso que haja uma utilização melhor para a terra. O trigo é uma necessidade para o Brasil. No Cerrado, em vez de ocupar novas áreas, o trigo entraria no processo de rotação com as outras culturas, principalmente a soja. Isso significa que ele não está competindo com a soja, ou feijão. O trigo ajuda a quebrar o ciclo de certas pragas. Mas, ele exige certas demandas, como altitude e temperatura. Apesar das expectativas, o cenário traz também temores. Para a WWF-Brasil, essa movimentação tem que ser acompanhada com bastante atenção. Aumentar a demanda por terra e por produção no Cerrado pode estimular mais desmatamento.

É preciso olhar para áreas degradadas e dar a elas um uso mais nobre, além de medidas mais efetivas de comando e controle. O estímulo à expansão da cultura vai colocar mais sobrecarga no valor da terra e especulação imobiliária. Entre agosto de 2020 e julho de 2021, o Cerrado perdeu 8,5 mil Km² de vegetação nativa, o que significa uma alta de quase 8% em relação ao período anterior, segundo dados do Prodes Cerrado, coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O monitoramento do segundo maior bioma do País, porém, foi praticamente paralisado em abril por falta de verba do governo federal. A questão da segurança alimentar, que ficou mais evidente na pandemia e com a guerra na Ucrânia, não pode ser usada como justificativa para aumentar a área de produção em detrimento da conservação ambiental. Não dá pra desconectar segurança alimentar e segurança climática, senão o resultado será o fracasso. Fonte: Isto É Dinheiro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.