ANÁLISES

AGRO


SOJA


MILHO


ARROZ


ALGODÃO


TRIGO


FEIJÃO


CANA


CAFÉ


CARNES


FLV


INSUMOS

03/Ago/2021

Polêmica sobre a liberação do trigo transgênico

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) está em fase de conclusão do parecer técnico quanto à solicitação da empresa argentina que pediu a liberação de importação de farinha de trigo transgênico no Brasil. Em sua última reunião, realizada em 10 de junho deste ano, a Comissão adiou a decisão, esperada para este mês, sobre a liberação comercial no Brasil da primeira variedade de trigo geneticamente modificado para consumo humano e animal, solicitando mais informações e documentos à Tropical Melhoramento & Genética (TMG), que protocolou pedido no Brasil. Estas análises determinaram, até o momento, a não aprovação de utilização de trigo GM por não serem identificados benefícios evidentes às pessoas, sendo objeto exclusivo de busca de aumento de produtividade do campo. O tema está presente no ambiente da pesquisa submetida a severos parâmetros de controle. Além disso, o relatório da FAO sobre trigo GM registra apenas duas variedades aprovadas no mundo, sendo uma nos Estados Unidos em 2004, que gerou grande repercussão negativa mundial e a interrupção de sua produção e comercialização, e a outra variedade aprovada na Argentina, ainda sem comercialização.

O trigo transgênico foi autorizado na Argentina por meio da Resolução 41/2020 da Secretaria de Alimentos, Bioeconomía y Desarrollo Regional del Ministerio de Agricultura, Ganadería y Pesca daquele país. No entanto, a autorização na Argentina foi condicionada à aprovação da importação e uso comercial no Brasil pela CTNBio. Como Brasil e Argentina seriam os únicos países do mundo a aprovarem tal tecnologia, até o momento sem precedentes internacionais, o tema merece ser considerado em sua maior abrangência possível pelas autoridades brasileiras, dada a repercussão mundial que esta decisão irá trazer, com desmembramentos sobre a imagem do País, imagem do agronegócio, reflexos econômicos sobre a cadeia do trigo e reflexos sobre o consumo deste alimento considerado essencial quando se trata de segurança alimentar das nações. É importante, neste contexto, ressaltar que, há cerca de 30 anos, este assunto tem sido objeto de análise da comunidade científica internacional, de governos e consumidores nos países que têm no trigo fonte essencial de alimentação, como Canadá, Estados Unidos, Austrália e Comunidade Europeia, onde o consumo per capita supera em duas vezes o consumo brasileiro.

Em contato com entidades representativas da cadeia do trigo na Argentina, como a Federação Argentina da Indústria Moageira, as Câmaras Arbitrais Argentinas e Associação dos Exportadores Argentino, fomos informados da posição contrária à produção e comercialização dos produtos transgênicos, manifestada publicamente junto às autoridades daquele país. No Brasil, o tema gerou polêmica e reações por parte de diversas entidades, entre elas a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), representante da indústria de produção de farinhas e derivados do trigo, a Abimapi e a Abip, que se posicionaram contrárias à liberação da comercialização tanto da farinha, como do trigo transgênicos no País. Em uma pesquisa interna, promovida pela Abitrigo com os moageiros brasileiros, 85% não foram favoráveis à utilização de trigo GM e 90% informaram estar dispostos a interromper suas compras de trigo argentino, caso se inicie a produção comercial naquele país e sua exportação para o Brasil.

Vale salientar, também, que não foi identificado nenhum movimento de demanda dos consumidores brasileiros por soluções transgênicas; ao contrário, há manifestações públicas de associações de consumidores com restrições ao uso desses produtos transgênicos. Opiniões emitidas em eventos regulatórios, processos judiciais, manifestações de órgãos de defesa de consumidores e clientes permitem inferir que o mercado brasileiro se posicione de forma reativa e preocupado quanto à adoção de alimentação transgênica. Com forte oposição de setores empresariais (em especial da cadeia de produção do trigo), da sociedade civil e de consumidores brasileiros, a liberação no Brasil ainda incorre em inúmeros questionamentos e estudos insuficientes de avaliação sobre os impactos do trigo geneticamente modificado à saúde humana, animal e à biodiversidade, além de seus impactos socioeconômicos. A Abitrigo sempre apoiou o progresso da pesquisa científica do trigo no Brasil, que prioriza segurança alimentar nos seus desenvolvimentos, sempre alinhada às demandas dos consumidores, sem relegar os necessários fatores de produtividade do campo.

Este processo, capitaneado pela Embrapa e pela pesquisa privada, tem promovido grandes avanços na qualidade e produtividade do trigo, sem a necessidade da utilização da tecnologia de modificação genética. O processo conduzido pela CTNBio é restrito a elementos técnicos, sem considerar aspectos mercadológicos e sociais, como o posicionamento de consumidores brasileiros, importadores de produtos brasileiros à base de trigo, comunidade científica internacional e mercado mundial. Se aprovado pela CTNBio, a Abitrigo, junto à outras entidades ligadas ao trigo no País, já sinalizaram que vão solicitar que o tema seja analisado pelo Conselho Nacional de Biossegurança, integrado pelos ministros chefe da Casa Civil, que o preside, da Justiça, da Ciência e Tecnologia, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde, do Meio Ambiente, da Economia, das Relações Exteriores e da Defesa, para que o governo se pronuncie quanto à conveniência e a oportunidade da liberação do trigo e da farinha transgênicos. Fonte: Rubens Barbosa. Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo). Agência Estado.