10/Dec/2025
O novo pacote de ajuda de US$ 12 bilhões anunciado pelo governo norte-americano para aliviar as perdas dos produtores em meio ao impasse comercial com a China teve repercussão morna entre agricultores e analistas do setor. Embora a medida busque compensar o impacto de custos elevados e preços baixos em 2025, os produtores consideram o apoio insuficiente e pouco efetivo para enfrentar problemas estruturais da agricultura dos Estados Unidos. Segundo a consultoria Muddy Boots Ag, muitos agricultores encaram o pacote como um simples paliativo, um "curativo" diante de questões profundas que afetam a competitividade e a renda do setor. Parte dos produtores rejeita a ideia de pagamentos diretos, avaliando que o dinheiro tende a ser absorvido por fornecedores de insumos, bancos e demais agentes da cadeia, sem fortalecer de fato a atividade no campo. Além disso, cresce o temor de que essas transferências se tornem uma prática recorrente, criando dependência e, a longo prazo, agravando a fragilidade econômica do meio rural.
A percepção geral é a de que, apesar de aliviar pressões imediatas, o pacote não traz soluções estruturais e pode até ampliar a instabilidade no futuro. Analistas também avaliam que a ajuda financeira pode levar produtores a postergarem vendas de grão à espera de preços mais altos, efeito que pode gerar apenas um movimento pontual no mercado, sem alterar os fundamentos que mantêm pressão sobre a renda agrícola. Assim, ajuda é bem-vinda para atravessar as dificuldades de curto prazo, mas é vista como insuficiente para resolver os desafios profundos que o setor enfrenta. A Associação Americana de Soja (ASA) avaliou que o pacote de assistência de US$ 12 bilhões é um “primeiro passo positivo” para aliviar a pressão financeira sobre os produtores, mas defendeu soluções de mercado capazes de sustentar o setor no longo prazo. O programa cria um pagamento único aos sojicultores como uma “ponte econômica” até a safra de 2026.
O Programa de Assistência aos Agricultores é um primeiro passo positivo para restabelecer a segurança, enquanto os produtores de soja comercializam a safra deste ano e planejam a temporada de plantio de 2026. A entidade pretende trabalhar com o Congresso norte-americano e com a Casa Branca em medidas “orientadas pelo mercado, que fortaleçam a demanda pela soja norte-americana e permitam que os agricultores compitam e prosperem no mercado global”. Segundo o governo, US$ 11 bilhões serão distribuídos por meio do Programa de Assistência em Transição para o Agricultor (FBA), destinado a produtores de grãos, enquanto US$ 1 bilhão servirá para outras commodities. A secretária de Agricultura, Brooke Rollins, afirmou que os produtores poderão se registrar ainda em dezembro e que os recursos devem começar a ser liberados no fim de fevereiro de 2026. A ASA afirmou que os agricultores enfrentaram nesta safra uma combinação de preços baixos, custos de produção elevados e perda de mercados externos.
As tarifas impostas por Donald Trump sobre a China no início de 2025 reduziram as importações chinesas de soja norte-americana de cerca de 29 milhões de toneladas por ano para zero, até a assinatura de um acordo em outubro. A China é o maior comprador global de soja e absorve parte relevante da oferta dos Estados Unidos. No primeiro semestre de 2025, as falências agrícolas no país aumentaram cerca de 60% na comparação com 2024. Após o acordo com a China, os preços da soja subiram acima de US$ 11,00 por bushel, mas voltaram a recuar. Até agora, a China comprou apenas 20% do volume prometido para este ano, dentro do compromisso de 12 milhões de toneladas em 2025 e 25 milhões de toneladas anuais pelos próximos três anos. Durante o primeiro mandato, quando Trump impôs tarifas sobre a China, o governo desembolsou cerca de US$ 23 bilhões para compensar agricultores. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) estimou que os produtores de soja responderam por mais de 70% das perdas naquele período. Desde então, a China intensificou investimentos na cadeia agrícola de países como o Brasil para reduzir sua dependência da oferta norte-americana.
A consultoria Demetrica afirmou que o pacote de US$ 12 bilhões anunciado pelo governo Trump atende a uma necessidade imediata dos produtores, mas não resolve os desequilíbrios que pressionam a agricultura norte-americana ao longo de 2025. A medida parece menos uma política proativa e mais uma tentativa de estabilizar uma situação que vem se formando ao longo do ano. O pacote chega em um momento em que muitos produtores enfrentam dificuldades financeiras após a queda abrupta das exportações de soja para a China e o aumento dos custos de produção. O alívio imediato não substitui a necessidade de previsibilidade. A grande questão não é se a assistência financeira é necessária agora. Muitos agricultores realmente precisam de apoio agora, especialmente depois que oportunidades de exportação desapareceram. A grande questão é: qual é o plano de longo prazo? Onde estão os sinais de mercado consistentes e duráveis (domésticos e internacionais) que orientam investimento, decisões de plantio e expansão da indústria? Enquanto os Estados Unidos anunciaram um acordo de swap cambial de US$ 20 bilhões para auxiliar a Argentina, esse país ampliou os embarques de soja para a China. A China ajustou sua origem de soja. Os volumes sul-americanos sobem.
Os agricultores dos Estados Unidos ficam com grãos não vendidos. A indústria doméstica de esmagamento hesita em expandir porque regulações-chave de biocombustíveis ainda permanecem sem solução. E agora o setor é convidado a enxergar um apoio de US$ 12 bilhões como clareza suficiente para o próximo ano. O ano foi marcado por decisões tomadas para responder a cada nova tensão do mercado, e não por uma estratégia clara de longo prazo. O gesto do governo norte-americano pode ser comparado ao conceito romano de panem et circenses ("pão e circo"), usado para descrever medidas de curto prazo destinadas a conter frustrações sem resolver causas estruturais. Conforto de curto prazo projetado para aliviar a frustração imediata sem abordar os desafios estruturais mais profundos. A agricultura dos Estados Unidos precisa de estabilidade regulatória e de políticas que permitam planejamento. A agricultura norte-americana não precisa de ‘teatralidade’, mas de previsibilidade, parcerias fortes e estruturas de política que não mudem a cada ‘manchete’. Sem uma estratégia clara e de longo prazo, medidas emergenciais tendem a se repetir sem resolver os problemas que afetam a competitividade e a renda dos produtores. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.