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19/Nov/2025

Cerrado: desmate gera perdas econômicas à soja

Segundo estudo da Zero Carbon Analytics divulgado na segunda-feira (17/11), o Cerrado brasileiro poderia ter produzido US$ 9,4 bilhões adicionais em soja entre 2013 e 2023 se nenhuma área tivesse sido desmatada desde 2008. Os impactos climáticos do desmatamento superam amplamente os ganhos da expansão agrícola. A análise conclui que, para cada tonelada produzida em novas áreas, outras três deixaram de ser colhidas em lavouras já estabelecidas por causa da redução de chuvas e do aumento da aridez regional. O levantamento mostra que a expansão da soja reduziu a umidade do bioma, alterou o regime de chuvas e deteriorou a produtividade. A evapotranspiração anual caiu cerca de 44% entre 2006 e 2019 e as temperaturas subiram aproximadamente 3,5°C. O desequilíbrio hídrico prejudica até áreas altamente tecnificadas. Em 2023, a região registrou 1,1 milhão de hectares desmatados, superando a Amazônia no mesmo ano. O Cerrado está ficando mais seco do que seria sem o desmatamento.

A pesquisa avaliou 840 municípios do Cerrado e cruzou dados de desmate com indicadores de aridez, precipitação e rendimento agrícola. As áreas com maior perda de vegetação apresentaram clima mais seco e produtividade inferior. Em cenários alternativos, evitar apenas 10% do desmatamento acumulado teria gerado quase US$ 1 bilhão adicionais em produção. Reduções de 25% e 35% representariam ganhos de US$ 2,35 bilhões e US$ 3,29 bilhões. O estudo mostra que 91% dos municípios que reduziram o desmate entre 2008 e 2022 mantiveram ou aumentaram a produção, com corte médio de 56% na abertura de novas áreas. A Zero Carbon Analytics identificou um paradoxo econômico central: o produtor individual tende a lucrar ao abrir áreas novas, mas a perda climática decorrente do desmatamento se espalha por todo o município. Um agricultor que desmata 100 hectares captura todo o ganho da área expandida, mas internaliza apenas cerca de 6% das perdas indiretas provocadas pelo impacto no regime de chuvas.

O restante se distribui pelas propriedades vizinhas proporcionalmente ao tamanho. O agricultor captura o ganho direto, mas só arca com uma pequena parte do prejuízo climático que ele mesmo ajudou a gerar. As perdas se intensificam dramaticamente em anos chuvosos. O estudo mostra que, quando a precipitação supera a média, áreas desmatadas perdem a capacidade de reter água, enquanto regiões com vegetação nativa capturam e armazenam umidade. Em algumas localidades, o corte de 1.000 hectares em anos úmidos levou a perdas superiores a 14.000 toneladas de soja, quase 12 vezes o impacto observado em anos secos. Um único ano muito chuvoso pode apagar vários anos de ganhos da expansão. O estudo conclui que modelos econômicos baseados em médias anuais ignoram esses extremos e subestimam os riscos financeiros do desmate. O relatório também identifica um limite ecológico. A análise mostra que o impacto do desmatamento na aridez diminui quando a paisagem já está altamente degradada.

Quase todos os municípios do Cerrado permanecem abaixo desse ponto de inflexão, o que significa que políticas de conservação ainda podem reverter parte dos danos. O Brasil enfrenta uma janela crítica. A oportunidade de proteger produtividade e clima não vai durar indefinidamente. O estudo destaca que as perdas de produtividade têm efeitos diretos sobre a segurança das cadeias globais. A China, maior compradora da soja brasileira, obtém 60% de suas importações do Cerrado de três Estados: Mato Grosso (29,7%), Goiás (20,1%) e Bahia (10,1%). A exposição chinesa soma quase US$ 5 bilhões em capacidade produtiva perdida nas regiões de onde o país importa. Do volume originado no bioma, 24,7% vêm do Matopiba, fronteira agrícola que reúne Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A concentração geográfica amplia o risco de interrupções no fornecimento. A consultoria simulou três cenários futuros para os municípios que abastecem a China.

Se o ritmo recente de desmatamento, próximo de 361.000 hectares por ano, continuar, outros US$ 3,8 bilhões em produtividade serão destruídos até 2033, elevando a perda total desde 2013 para US$ 8,7 bilhões. Um retorno às taxas mais altas observadas entre 2008 e 2022, de 435.000 hectares anuais, significaria uma destruição adicional de US$ 4,5 bilhões. Em cenário de aceleração do desmate para cerca de 1 milhão de hectares por ano, a perda pode chegar a US$ 15,5 bilhões. Sem conservação, o risco não é apenas ambiental, mas econômico e logístico Entre grandes importadores, a Alemanha lidera a intensidade de exposição, com US$ 43,00 perdidos por tonelada importada. As compras alemãs se concentram em municípios com desmate recente, especialmente no Matopiba, de onde vêm 52% das importações do país. A Alemanha é seguida por Arábia Saudita (US$ 28 por tonelada), Espanha e Romênia (US$ 25 cada) e Japão (US$ 23).

A China tem a maior exposição total devido ao volume, mas intensidade menor (US$ 11,00 por tonelada). A Espanha aparece em segundo lugar em exposição absoluta, seguida por Holanda e Alemanha. Para a União Europeia, a Zero Carbon Analytics estima pelo menos US$ 2,47 bilhões em perdas ocultas de produtividade relacionadas ao Cerrado durante o período estudado. A Romênia apresenta a maior exposição por tonelada entre países da União Europeia (US$ 72,00), sugerindo que suas cadeias de suprimentos estavam particularmente ligadas a novos desmatamentos antes do prazo limite do regulamento europeu, que proíbe importações de áreas desmatadas desde 31 de dezembro de 2020. A França tem a maior exposição absoluta entre países da União Europeia (US$ 45,8 milhões). A conservação pode proteger a base produtiva brasileira e reduzir riscos para os compradores. Preservar o Cerrado não é uma pauta ambiental isolada. É uma medida de estabilidade econômica para produtores, tradings e países importadores. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.