01/Oct/2025
Por maioria, o plenário do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) decidiu aplicar a medida preventiva que suspende a Moratória da Soja apenas a partir de 1º janeiro de 2026. O relator, conselheiro Carlos Jacques, e o presidente da autoridade da concorrência, Gustavo Augusto Freitas de Lima, foram os únicos dos seis integrantes do Cade a defenderem a retomada da vigência da medida preventiva. Jacques acompanhou a manifestação de 18 de agosto da Superintendência Geral (SG) do Cade, área técnica do órgão, e votou para manter a preventiva. Em 18 de agosto, a SG impôs a medida preventiva e instaurou processo administrativo contra as associações e empresas integrantes do Grupo de Trabalho da Soja (GTS), que são signatárias do acordo conhecido como Moratória da Soja, por considerar um acordo anticompetitivo entre concorrentes que prejudica a exportação de soja.
A medida preventiva determina que o Grupo de Trabalho da Soja se abstenha de coletar, armazenar, compartilhar ou disseminar informações comerciais referentes à venda, produção ou aquisição de soja, bem como que se abstenha de contratar processos de auditoria. Seus membros devem também se abster de compartilhar relatórios listas e documentos que instrumentalizem o acordo, bem como retirar a divulgação de documentos relacionados à moratória de seus sítios eletrônicos. A penalização pelo descumprimento da medida preventiva é multa diária no valor de R$ 250 mil. Dias depois dessa decisão da área técnica do Cade, em 20 de agosto, a Justiça Federal suspendeu, por meio de uma liminar, a decisão preliminar e que determinou a paralisação da Moratória da Soja não poderia ocorrer até que houvesse o julgamento do recurso administrativo apresentado pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) pelo tribunal do órgão concorrencial, o que ocorreu nesta terça-feira (30/09).
O pacto multissetorial firmado entre setor privado (tradings e compradores de grãos), organizações não governamentais e órgãos do governo, prevê a não comercialização, o não financiamento ou a aquisição de soja produzida em áreas desmatadas na Amazônia. A sessão de julgamento que analisou a Moratória da Soja foi acompanhada presencialmente pelas diversas partes interessadas e pelo superintendente-geral do Cade, Alexandre Barreto. Excepcionalmente, o órgão instalou detectores de metais na entrada do auditório onde aconteceu a sessão. O relator Carlos Jacques apontou indícios de uma infração da ordem econômica, por se tratar de um acordo entre concorrentes, que versa sobre variável competitiva relevante, com número elevado de tradings. "Mas isso não é necessariamente um cartel, muito longe, aliás, de ser um cartel. É uma cooperação, provavelmente", ponderou. Ele sustentou que a não adoção da medida preventiva é prejudicial à concorrência.
"Não há dúvidas de que a Moratória da Soja possui o condão de operar sérios efeitos anticompetitivos no mercado", destacou o voto do relator. Em seguida, o conselheiro José Levi do Amaral Júnior abriu divergência e foi acompanhado pelos conselheiros Victor Fernandes, Diogo Thomson e Camila Cabral. Em seu voto, José Levi citou a liminar da Justiça Federal e a decisão vigente do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspende até 31 de dezembro de 2025 norma estadual que veda benefícios para empresas participantes de acordos da espécie da Moratória da Soja. Ele frisou que a Moratória da Soja possui natureza privada, é integrada por diversos entes públicos e privados e vem sendo reconhecida como instrumento de fomento ao desenvolvimento sustentável. O conselheiro afirmou que, para fazer valer a decisão vigente e vinculante do STF, seria adequado manter suspensa a eficácia da medida preventiva adotada pela SG até 31 de dezembro de 2025.
Esse tempo será destinado para diálogo entre as partes privadas e os agentes públicos, como colocou o ministro do STF, Flávio Dino. "Nestes termos, penso eu, a decisão do Cade fica rigorosamente alinhada ao quanto se tem, até aqui, do Supremo Tribunal Federal." Por sua vez, o conselheiro Fernandes ressaltou que esse é um tema que está em voga no mundo todo, com autoridades antitrustes de vários países publicando guias sobre acordos de sustentabilidade, mas com divergências sobre a forma de compatibilizar os acordos com a defesa da concorrência. "Entendo que o papel central que o Cade pode ter neste momento é o de identificar os casos de acordo de sustentabilidade que, a princípio, não geram preocupações concorrenciais relevantes", sustentou. Thomson pontuou que a complexidade do arranjo e suas especificidades demandam análise mais aprofundada pelo órgão antitruste.
"No presente caso, os elementos que caracterizam cartel de compra ou não foram observados ou permanecem inadequadamente explorados nos autos, dado inclusive o caráter inicial do processo administrativo", observou. Por sua vez, a conselheira Camila Cabral ressaltou que a adesão ao pacto é voluntária e possui metodologias públicas. "A posição mais cautelosa neste momento é reconhecer a insuficiência de indícios de danos concorrenciais", defendeu ela, frisando que é preciso completar a instrução probatória. Ao proclamar o resultado, Gustavo Augusto, que votou com o relator, defendeu que o prazo adicional para a aplicação da preventiva, de três meses, dará tempo para as empresas entrarem em conciliação e eventualmente se adequarem. Mas, ele observou que não tem visto esse cenário acontecer. "Eu estou vendo as empresas partindo para a briga." O presidente indicou ainda que, até o final de 2025, os órgãos ambientais podem normatizar essa política pública através de medida provisória, decreto, resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) ou outro instrumento.
"Eu não vou dizer qual o instrumento, porque isso não me cabe, mas faz-se um normativo, garantindo que seja de uma forma não discriminatória", defendeu. Recentemente, a União entrou como terceira interessada no processo administrativo que analisa a Moratória da Soja, por intermédio do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O governo federal é apoiador da Moratória da Soja e representantes dos órgãos envolvidos se reuniram nos últimos dias com o relator e outros conselheiros para apresentar a posição favorável ao pacto como política pública consolidada de combate ao desmatamento ambiental e pelo reconhecimento da legalidade do acordo. Havia preocupação dentro do governo Lula de que o acordo fosse suspenso às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), que será sediada em Belém (PA) no próximo mês de novembro. A suspensão da Moratória da Soja neste momento poderia respingar de forma negativa sobre o governo perante a comunidade internacional.
A Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) comemorou a decisão do Cade de aplicar a medida preventiva e suspender a Moratória da Soja a partir de 1º de janeiro de 2026. Para a Aprosoja-MT, o acordo é ilegal. "O fim da moratória é um marco histórico na defesa da livre concorrência e da produção legal no campo, devolvendo segurança jurídica e dignidade aos milhares de produtores que sempre atuaram em conformidade com o Código Florestal e as leis ambientais brasileiras", afirmou a entidade. A Aprosoja-MT afirmou ainda que os votos do relator, conselheiros Carlos Jacques, e do presidente do Cade, Gustavo Augusto de Lima, durante o julgamento, reforçam os "indícios de cartel e as distorções geradas" pela Moratória da Soja. Para a associação, as práticas são "anticoncorrenciais e lesam o ambiente de mercado justo e competitivo".
A Aprosoja-MT argumenta ainda que a Moratória da Soja é um acordo privado sem respaldo legal, que vem impondo barreiras comerciais injustas aos produtores, sobretudo os pequenos e médios, impedindo a comercialização de safras cultivadas em áreas regulares e licenciadas. A Aprosoja-MT seguirá vigilante e atuante para garantir que produtores que respeitam a lei também tenham o direito de produzir, prosperar e contribuir com o desenvolvimento do País, concluiu. A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) afirmou que no julgamento do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) prevaleceu a decisão vigente do Supremo Tribunal Federal (STF). O tribunal manteve suspensa a medida preventiva da Superintendência Geral até 31 de dezembro de 2025, prazo destinado a permitir que agentes privados e públicos dialoguem em busca de uma solução.
A Abiove continuará acompanhando os desdobramentos no Cade e segue à disposição para colaborar com as autoridades competentes, em prol da segurança jurídica e da previsibilidade regulatória do setor. A legalidade da Moratória da Soja foi reconhecida por decisão liminar vigente pelos ministros Flávio Dino, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Edson Fachin e Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal. Quatro ações diretas de inconstitucionalidade contra leis estaduais que retiram incentivos de empresas signatárias da moratória da soja tramitam na Suprema Corte. A Moratória da Soja é um compromisso multissetorial, voluntário, 100% transparente e referência internacional em desenvolvimento sustentável há quase duas décadas. Ela conta com a participação do Estado, por meio de instituições como o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama, é reconhecida pela União, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), como uma política pública ambiental em vigor há mais de 20 anos, defende a Abiove.
A Moratória da Soja é um pacto multissetorial firmado entre setor privado (tradings e compradores de grãos), organizações não governamentais e órgãos do governo, que prevê a não comercialização, o não financiamento ou a aquisição de soja produzida em áreas desmatadas na Amazônia após 22 de julho de 2008, data da aprovação do Código Florestal Brasileiro. O pacto firmado em 2006 proíbe a compra de soja cultivada em áreas do bioma Amazônia desmatadas após julho de 2008, mesmo quando o desmatamento ocorrer dentro dos limites estabelecidos pelo Código Florestal, que permite a supressão de até 20% da vegetação em propriedades no bioma. A Moratória da Soja gera discordância há anos entre produtores e tradings. Os produtores elevaram o tom contra o pacto no último ano, com apoio de parlamentares, pedindo a suspensão da prática pela indústria e alegando que o acordo fere o Código Florestal Brasileiro e que tem indícios de prática de cartel. As indústrias processadoras e exportadoras de soja, porém, negam tais práticas. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.