28/May/2025
A nova regulamentação da União Europeia para produtos livres de desmatamento (EUDR) pode restringir o acesso da soja brasileira ao mercado europeu, mesmo quando cultivada de forma legal no Cerrado, e redirecionar exportações para países com exigências ambientais menos rigorosas. A conclusão é de estudo publicado pela Agroicone em parceria com a organização dinamarquesa Concito, com base em consultas a empresas, entidades setoriais, ONGs e órgãos do governo. A EUDR proíbe toda deflorestação após dezembro de 2020, legal ou ilegal. Esta abordagem vai além dos requisitos de conservação do Código Florestal brasileiro, que permite certo desmatamento legal. Isso pode excluir produtores que estão em conformidade com a legislação nacional, mas cultivam em áreas onde houve supressão legal de vegetação nativa após o marco temporal europeu.
Pelas regras da EUDR, que entra em vigor em 30 de dezembro de 2025 para grandes empresas, produtos agrícolas como soja, café, cacau e carne bovina só poderão ingressar no mercado europeu se forem comprovadamente livres de desmatamento após a data estabelecida. Isso tende a afetar de forma desproporcional os produtores do Cerrado, onde ainda há áreas autorizadas para abertura de vegetação nativa. O estudo aponta que a medida pode levar ao desvio comercial de volumes para mercados que não exigem comprovação de desmatamento zero, como China, Índia e países do Oriente Médio. Mudanças como essa poderiam deslocar geograficamente os impactos do desmatamento em vez de eliminá-los, minando, em última análise, os objetivos ambientais da EUDR, alerta o documento ao tratar do fenômeno conhecido como "deforestation leakage" (vazamento de desmatamento).
Outro entrave identificado é a necessidade de rastreabilidade total da soja exportada, com geolocalização de todas as áreas de produção e comprovação documental da regularidade fundiária e ambiental. Para soja, o principal desafio é a segregação, que requer infraestrutura especializada e redes de transporte para segregar produtos livres de desmatamento. Isso pode ser prejudicado pela mistura do grão em múltiplos pontos da cadeia logística. Embora o Cadastro Ambiental Rural (CAR) tenha sido apontado como instrumento central para a conformidade, o documento observa que sua validação ainda é incompleta em diversos Estados. Apesar do alto número de registros, o volume de análises concluídas permanece baixo. Apenas 101.349 cadastros tiveram sua conformidade ambiental completada até outubro de 2023, de um total de 7,2 milhões de registros. O relatório também destaca que os sistemas de segregação são hoje limitados a regiões com maior infraestrutura logística e presença de grandes tradings.
Embora cruciais para atender aos requisitos da EUDR, esses sistemas são frequentemente limitados a certas regiões ou grandes traders, criando barreiras para produtores menores. A análise revela diferenças regionais significativas nos riscos de conformidade. Na Amazônia, a Moratória da Soja oferece uma base favorável ao limitar o plantio em áreas desmatadas após julho de 2008. Porém, a Moratória da Soja está sob pressão política após o governo de Mato Grosso aprovar regulamentação para retirar benefícios fiscais de empresas participantes. No Cerrado, onde se concentra a expansão da soja, a situação é mais complexa. A sobreposição significativa entre desmatamento e produção de soja torna grandes partes do bioma Cerrado suscetíveis a serem avaliadas como zonas de alto risco sob a EUDR. Os dados mostram forte correlação entre desmatamento recente e produção nas regiões de Bahia e Maranhão, com municípios como Formosa do Rio Preto, São Desidério e Balsas liderando tanto em conversão de vegetação quanto em volume produzido.
Apesar das dificuldades, a regulação europeia pode funcionar como catalisador de boas práticas. A EUDR pode servir como um impulsionador adicional para implementar o Código Florestal, fortalecendo incentivos baseados no mercado. Entre as soluções propostas, o estudo sugere a criação de incentivos econômicos, como prêmios de mercado para produtos comprovadamente livres de desmatamento. No dia 22 de maio, a Comissão Europeia classificou o Brasil como país de "risco padrão" para desmatamento, junto com outras 49 nações. A classificação implica que 3% dos operadores brasileiros serão inspecionados, contra 1% para países de baixo risco. Até a implementação completa da EUDR, o Brasil segue buscando alinhamento técnico e político com os países-membros da União Europeia. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.