28/Mar/2025
Desde a corrida presidencial para a Casa Branca, no ano passado, estiveram presentes no mercado os temores de que um novo governo Trump poderia impactar o mercado de soja por meio de uma política comercial mais protecionista. Após sua posse, em 20 de janeiro, o presidente eleito reforçou sua intenção de impor tarifas contra vários países ao redor do mundo, adotando diferentes discursos e argumentos, e com avanços e recuos frequentes nessas decisões. Ainda em janeiro, Trump anunciou novas tarifas de 10% contra a China, que deveriam passar a vigorar no início de fevereiro, mas que foram postergadas por um mês, em meio a cobranças de ações contra a entrada de substâncias ilícitas, como o fentanil, nos Estados Unidos. Contudo, no início de março Trump voltou a anunciar a implementação das tarifas, adicionando mais 10% sobre produtos chineses, o que resultou em uma alíquota acumulada de 20%.
Nesse contexto, a China anunciou uma série de medidas retaliatórias, com repercussões no mercado de soja. No caso da oleaginosa, o governo chinês implementou uma tarifa de 10% sobre o produto norte-americano, vigente desde a segunda semana de março. Apesar de esse porcentual ser inferior ao adotado no primeiro mandato de Trump (quando a alíquota foi de 25%), a competitividade do grão dos Estados Unidos tende a ser prejudicada. Com isso, a soja brasileira pode ter sua demanda reforçada, destacando que o Brasil já exporta mais de 100 milhões de toneladas para todos os destinos em anos de safra favorável, como deve ser o resultado do ciclo 2024/2025. É importante ressaltar, contudo, que por mais que a procura pela soja brasileira deva ser favorecida nesse contexto de disputa tarifária, com sustentação dos prêmios nos portos por aqui, a China já vem reduzindo sua dependência do produto norte-americano nos últimos anos.
O país asiático também tem realizado esforços para reduzir o componente proteico das rações, o que se reflete diretamente no farelo de soja. Por essas razões, uma nova rodada de guerra comercial deve ter impactos de proporção menor sobre o mercado da oleaginosa. De qualquer forma, caso a China compre ainda mais soja brasileira, a soja norte-americana tende a se deslocar para outros destinos, havendo uma reorganização dos fluxos internacionais da commodity e não, necessariamente, uma grande sobreoferta de soja dos EUA. Assim, não se espera escassez de soja para outros destinos, caso a China compre ainda mais o grão brasileiro, contudo, pelo menos em um primeiro momento, essa mudança nos fluxos da oleaginosa tenderia a favorecer o produto do Brasil, pelo qual a concorrência seria maior. Atualmente, o Brasil está em seu período de exportações mais aquecidas, em meio ao aumento da disponibilidade de soja, com o avanço da colheita.
Nas três primeiras emanas de março, segundo os dados preliminares da balança comercial, foram embarcadas 10,3 milhões de toneladas, com dados de lineup de navios indicando que as exportações de soja no mês de março como um todo podem ficar ao redor de 15 milhões de toneladas. Com isso, a demanda pela soja brasileira nos próximos meses tende a ser reforçada pela procura chinesa, aproveitando a disponibilidade da oleaginosa. Mesmo assim, por mais que o impacto inicial dessa taxação seja baixista para os preços da soja em Chicago, enquanto os prêmios nos portos brasileiros se fortalecem, não necessariamente vai faltar demanda pelo grão norte-americano. Deve levar algum tempo até que a soja dos Estados Unidos encontre novos destinos, o que pode ocasionar uma situação de sobreoferta momentânea no mercado.
Ademais, é preciso lembrar que entre 2018 e 2019 a China sofreu com a peste suína africana (PSA), que reduziu seu rebanho de porcos quase pela metade, diminuindo consequentemente a demanda por soja. À época, o país já importava cerca de 100 milhões de toneladas por ano, tendo reflexos significativos nos números de importação global. Atualmente, o contexto é diferente e a importação da oleaginosa deve continuar avançando anualmente ao redor do mundo, à medida que a população cresce e passa a consumir mais proteínas de origem animal. Pelo menos por enquanto, os impactos no mercado de soja tendem a ser mais limitados. Em vista das incertezas que ainda rondam a política comercial americana, no entanto, essa situação pode se alterar no caso de um acirramento da guerra comercial atual, seja pelo anúncio de novas tarifas ou pela retaliação dos países afetados. Fonte: Ana Luiza Lodi. Broadcast Agro.