ANÁLISES

AGRO


SOJA


MILHO


ARROZ


ALGODÃO


TRIGO


FEIJÃO


CANA


CAFÉ


CARNES


FLV


INSUMOS

23/Jan/2025

Balanço da Indústria de Óleos Vegetais em 2024

Três assuntos foram mais marcantes em 2024 para a indústria de óleos vegetais: reforma tributária, lei do combustível do futuro e as pressões sobre a Moratória da Soja. Antes de entrar nos temas, é importante fazer um resumo do desempenho do setor no ano passado para situar o leitor. A safra de soja em 2024 foi 6,8 milhões de toneladas menor do que a de 2023. Essa menor oferta foi ajustada da seguinte forma: 3 milhões a menos de exportação de soja em grão, 2,2 milhões de toneladas a menos de estoque de passagem de soja, crescimento das importações em 641 mil toneladas e um crescimento de 835 mil toneladas no processamento de soja, mas que teria sido maior se a produção não tivesse caído por problemas de clima, sobretudo no Centro-Oeste. Fazendo um cenário: caso a produção de soja de 2024 tivesse sido semelhante à de 2023, o processamento de soja cresceria quase 4 milhões de toneladas.

Assim, além do ajuste ocorrido no volume exportado, houve um ajuste importante no volume processado de soja, que deveria ter sido maior. Com um crescimento do processamento inferior ao necessário, dois ajustes ocorreram: caíram as vendas de farelo no mercado interno e caíram as exportações de óleo de soja (queda de 1 milhão de toneladas), dado que a produção foi direcionada para atender à crescente demanda por biodiesel. Para 2025, tudo vai depender do tamanho da safra de soja. Se for safra grande, como é esperado, exportações e processamento vão crescer com tranquilidade para atender ao crescimento da demanda. Será muito bom para o Brasil ter uma safra grande de soja em 2025, porque pode ser que, com os movimentos dos Estados Unidos, a demanda pela soja brasileira cresça. Pelo menos oferta de soja teremos para suportar um crescimento de demanda internacional, se ela vier. Voltamos aos assuntos marcantes de 2024. O primeiro deles é a lei complementar da reforma tributária.

Com a sanção da Lei Complementar 214/2025, a etapa legislativa principal da implantação do imposto sobre valor agregado no Brasil terminou. Daqui para frente serão, sobretudo, regulamentações infralegais. As preocupações, agora, se concentrarão nas questões operacionais do funcionamento do IBS e CBS. O trabalho desenvolvido pelo nosso setor em todo o processo da reforma tributária, tanto na proposta de emenda constitucional, quanto na lei complementar, tinha uma linha mestra: pelo perfil exportador do nosso setor, nosso objetivo era reduzir ao máximo possível o acúmulo de créditos. Nosso setor sempre acreditou que o modelo proposto de IVA, com crédito financeiro e devolução ao contribuinte antes da partição com os entes federados, era eficiente, no papel. Na prática, atribuímos alto risco de não recebermos os créditos ou de recebermos em prazo muito longo, com elevado impacto no fluxo de caixa.

Assim, estabelecemos uma linha argumentativa baseada em lógica: se eu vou exportar a soja (65% da soja produzida no Brasil é exportada) e o farelo de soja (55% do farelo de soja produzido é exportado), e a exportação é imune de IBS/CBS, para que colocar todo o crédito da compra da soja na nossa operação se vamos receber tudo de volta no futuro (em 30, 60 ou até 180 dias)? Esse crédito se transformaria em custo de carregamento apenas, puro custo de transação. Melhor que, no caso da exportação, o acúmulo nem ocorra já na compra da matéria-prima. Nosso argumento lógico foi bem recebido, e há possibilidade de compra de soja (não só de soja, pois a regra é geral para todos os exportadores) sem incidência de IBS/CBS, seja para exportação do grão, seja para industrialização e posterior exportação do produto processado. Há várias exigências para ter acesso à suspensão (não incidência), mas o importante é que o conceito de não acumular crédito foi contemplado.

O mais importante destes dispositivos é que eles beneficiam todos os exportadores, e não apenas nosso setor, e não terão nenhum impacto em alíquota ou aumento de custos para o consumidor brasileiro. Além disso, eles não discriminam contra a industrialização, pois tanto a matéria-prima in natura exportada quanto o produto processado exportado podem ter sua matéria-prima comprada com suspensão. Tínhamos outras prioridades na reforma tributária, mas a redução do acúmulo de crédito na exportação foi a principal. A Lei do Combustível do Futuro foi aprovada visando criar instrumentos para dar o pontapé inicial, aprofundar ou acelerar a descarbonização no setor de combustíveis. Para o biodiesel (que nosso setor é grande produtor) e o etanol, ela permite maiores teores no diesel e na gasolina, criando maior demanda, portanto estimula um processo de descarbonização já em curso.

A lei cria um mandato de redução de emissões para o setor de aviação, permitindo a substituição do querosene de aviação por SAF (combustível sustentável de aviação), produzido com matérias-primas e rotas que resultam em menores emissões. Tanto os óleos vegetais, por meio da rota HEFA (ésteres e ácidos graxos hidroprocessados), quando o etanol, por meio da rota ATJ (etanol para jet), vão ofertar o combustível sustentável de aviação para cumprir o mandato de redução de emissões estabelecido na lei. A lei autoriza os operadores aéreos a usarem meios alternativos de redução de emissões, tais como substituir diesel por biodiesel em equipamentos que operam em aeroportos, tais como geradores, tratores e ônibus. A questão-chave aqui, que será discutida em regulamentação, são as metodologias para contabilização das emissões de cada rota. Nosso setor vai trabalhar tecnicamente para que a rota com óleos vegetais seja mensurada de forma eficiente. A lei criou mandato para o diesel verde (também chamado de HVO, óleo vegetal hidrotratado), substituto do diesel, assim como o biodiesel.

O diesel verde será produzido pela rota HEFA, usando óleos vegetais como matéria-prima principal. Assim, os mandatos de biodiesel, SAF e HVO vão aumentar a demanda por óleos vegetais. Tendo em vista que as oleaginosas produzem concomitantemente óleos vegetais e farelos proteicos, utilizados como fonte de proteína na alimentação animal, o aumento da demanda por óleos vegetais para energia é muito bem-vinda, porque vai aumentar a oferta de proteína para a alimentação animal, reduzindo custos na produção de alimentos. A indústria de proteína animal deverá crescer, fruto dos efeitos indiretos da maior demanda por combustíveis renováveis. É bom para todo mundo. Por fim, a lei estabelece que a metodologia da análise de ciclo de vida, que vai mensurar as emissões no ciclo de produção, precisa ser do poço à roda (do berço ao túmulo a partir de 2032), acabando com a mensuração das emissões apenas no cano do escapamento, o que beneficiava artificialmente combustíveis fósseis e eletrificação.

Enquanto os dois assuntos anteriores são agendas positivas, o último tema, as pressões sobre a Moratória da Soja, trouxe grandes desafios para o setor. O ano de 2024 foi marcado pela aprovação de legislações estaduais vedando acesso a benefícios fiscais para companhias signatárias da Moratória da Soja e outras iniciativas com funcionamento multisetorial. Os Estados de Rondônia e Mato Grosso sancionaram leis em 2024, e o Estado do Maranhão acabou de sancionar sua lei. Há projetos de lei em discussão nas assembleias legislativas do Pará e de Goiás. A lei de Rondônia veda acesso aos benefícios se a companhia segue exigências que vão além da legislação brasileira via acordo multissetorial, por meio de compromisso individual baseado em variáveis de sustentabilidade (interpretado como forma de impedir o avanço da produção agropecuária no Estado) ou se atende exigências de mercados importadores.

Já as legislações de Mato Grosso e do Maranhão, graças ao senso de realidade dos governadores, que vetaram certos dispositivos, confinam a vedação aos benefícios à participação da companhia em acordos multissetoriais, sem atingir compromissos individuais ou requerimentos para atender exigências de clientes importadores. Devido às ações de inconstitucionalidade impetradas no Supremo Tribunal Federal contra as legislações de Rondônia e Mato Grosso, a Moratória da Soja segue seu funcionamento normal enquanto a discussão sobre constitucionalidade das legislações ocorre no STF. Em 2025, sobre reforma tributária e lei do combustível do futuro, o foco de atuação política do setor serão as regulamentações que precisam ser publicadas pelo Executivo. Quanto à Moratória da Soja, vamos continuar insistindo naquilo que o setor acredita: em uma solução que atenda às demandas dos produtores rurais, sem ferir a relação de confiança e parceria que temos com as organizações da sociedade civil na proteção ao meio ambiente. Parafraseando Albert Einstein, o impossível existe até que alguém duvide dele e prove o contrário. Fonte: André Meloni Nassar. Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Broadcast Agro.