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12/Sep/2024

Questões pertinentes quanto à Moratória da Soja

Por que faço tais perguntas? Porque, embora o pacto multissetorial esteja em vigor desde 2006, ele ganhou visibilidade com as recentes manifestações contrárias por parte de associações de produtores rurais e políticos que atuam regionalmente. Dado que muita informação errada tem sido difundida por esses atores, há a necessidade de esclarecimentos por parte da indústria da soja, que é uma das integrantes da iniciativa.

O que é a Moratória da Soja?

É um pacto multissetorial do qual participam duas associações do setor de processamento e exportação de soja, Abiove e Anec, cinco organizações da sociedade civil, Greenpeace, WWF, TNC, Imaflora e Ipam, várias revendas que distribuem insumos e recebem grãos e até o Banco do Brasil. A iniciativa conta a anuência do governo federal, por meio do Ministério do Meio Ambiente, que ratificou a Moratória em 2016, além de basear todo o trabalho técnico em fontes oficiais, tais como Inpe e Ibama, para citar dois exemplos. A Moratória da Soja é gerenciada pelo Grupo de Trabalho da Soja, GTS, do qual participam todos os membros da iniciativa. Além do GTS, que tem reuniões trimestrais no modelo de plenária, uma vez que todos os membros são convidados, há o Comitê Gestor que gerencia o dia a dia e dá agilidade decisória para a Moratória. Participam do Comitê Gestor as cinco ONGs e cinco representantes da indústria. A tomada de decisão é sempre por consenso. O objetivo da Moratória da Soja é garantir controle na origem para dar transparência e visibilidade aos importadores de que a soja adquirida por eles não foi plantada em área desmatada no bioma Amazônia.

Por que a Moratória da Soja foi criada?

A Moratória da Soja foi criada porque ONGs de renome internacional e com influência sobre a indústria de alimentos europeia, que consome produtos contendo derivados de soja, fizeram uma campanha afirmando que a soja brasileira estava contribuindo para o desmatamento da floresta amazônica. Os clientes europeus e as ONGs exigiram ações concretas dos exportadores brasileiros. Abiove e Anec foram forçadas a tomar uma decisão para não perderem o mercado europeu, até hoje responsável por 50% das exportações de farelo de soja brasileiro. A decisão tomada foi garantir que a soja processada e exportada seria livre de desmatamento, tendo como referência para desmatamento a data de julho de 2008. Lembrando que julho de 2008 é data fixada pelo Código Florestal brasileiro.

Quais as consequências da Moratória da Soja?

A área de soja no bioma Amazônia era, em 2006/2007, ano de início da Moratória, de 1,4 milhão de hectares. Os dados da safra 2022/23 mostram que a área de soja no bioma cresceu para 7,4 milhões de hectares. Ou seja, na vigência da iniciativa, a área de soja cresceu 6 milhões de hectares, ou 430%. A área de soja no Brasil, no mesmo período, cresceu 113%, o que comprova que a Moratória da Soja viabilizou a expansão da lavoura no bioma Amazônia. Sem ela, a soja produzida ali seria recusada nos mercados internacionais. A principal consequência da Moratória da Soja foi proteger a soja brasileira e, com isso, premiar todas das fazendas produtoras localizadas no bioma Amazônia que expandiram o plantio em áreas abertas antes de julho de 2008.

Por que associações de produtores não integram o GTS?

Quando a Moratória foi criada, em 2006, as associações de produtores rurais se recusaram a participar da iniciativa. Mesmo diante da negativa, ao longo destes anos todos a indústria teve diversos debates com as associações de produtores rurais, sobretudo quando havia pressão por parte deles. Foram feitos vários convites para essas entidades integrarem ou acompanharem os trabalhos do GTS. Em 2019 houve um movimento contrário à iniciativa encabeçado por uma associação de produtores de Mato Grosso, exigindo que ela se limitasse ao controle do desmatamento ilegal. A Abiove propôs à entidade um trabalho a quatro mãos, no qual as entidades de produtores fariam a análise da legalidade do desmatamento nas propriedades rurais identificadas pela Moratória com desmatamento após julho de 2008, e a Abiove negociaria com as ONGs uma mudança nos procedimentos da iniciativa para monitoramento do desmatamento ilegal. No entanto, a entidade de produtores optou por não levar em frente a ideia, afirmando que preferiam se manter do lado da pressão contrária à iniciativa. Em 2024, uma deputada federal propôs que duas entidades de produtores deveriam ser convidadas para o GTS e para o Comitê Gestor. A Abiove afirmou publicamente que era favorável e que faria esse convite às duas entidades para integrarem o GTS e, após algumas reuniões, defenderia a participação delas no Comitê Gestor também. Uma das entidades declarou publicamente que não tinha interesse em fazer parte do GTS, posição que foi seguida pela outra. Portanto, as entidades de produtores rurais não acompanham as reuniões do GTS por decisão própria.

A Moratória da Soja impede o produtor de produzir ou de desmatar legalmente?

A decisão do que produzir, quanto produzir e de desmatar a propriedade privada é de livre arbítrio do produtor rural. A Moratória da Soja não impõe nenhuma restrição ao produtor rural. Os critérios da Moratória da Soja, sobretudo a não aquisição de soja produzida em áreas desmatadas após julho de 2008, são conhecidos há anos, não representando surpresa para os produtores rurais. Além disso, a Moratória da Soja possui procedimento estabelecido, já adotado por muitos produtores, que mediante o não plantio de soja na área desmatada, a produção volta a ser adquirida pelas companhias signatárias da iniciativa.

Qual o futuro da Moratória da Soja?

A não aceitação de lavouras agrícolas plantadas em áreas desmatadas é uma realidade. O Brasil exporta 2/3 da soja e 50% do farelo de soja que produz. Além disso, 60% do óleo vegetal produzido a partir da soja vai para biodiesel. Nem o mercado de alimentos, nem o de biocombustíveis aceita matérias-primas plantadas em áreas desmatadas recentemente. O mercado consumidor mudou e, se o Brasil quer continuar ocupando a maior parte do crescimento de demanda internacional, precisa eliminar desmatamento na produção agrícola. A Moratória da Soja é uma iniciativa antiga, já tem 18 anos, que foi visionária pois desenvolveu procedimentos de verificação de controle de origem e transparência na cadeia de suprimentos, os quais são exaltados, sob o conceito de rastreabilidade, nos dias atuais. O futuro da iniciativa é incerto, mas o futuro das lavouras plantadas em áreas desmatadas é conhecido: o mercado consumidor não gerará demanda para elas.

Fonte: André Meloni Nassar. Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Broadcast Agro.