19/Aug/2024
Em uma vitória do agronegócio e dos fabricantes de biocombustíveis, o relator do projeto de lei do "Combustível do Futuro", senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), manteve a adição de até 10% do biometano ao gás natural e não previu o combustível sintético fabricado pela Petrobras, chamado de R5, na fatia dedicada ao diesel verde. O objetivo do texto, que integra a pauta "verde" do Palácio do Planalto, é descarbonizar a matriz energética do transporte nacional por meio do uso de biocombustíveis, um negócio promissor que vem colocando as petroleiras e a bancada ruralista em rota de colisão. A expectativa é de que o parecer seja analisado na Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado nesta terça-feira (20/08), e depois siga ao plenário da Casa. Se aprovado, terá de retornar à Câmara para uma nova análise. O projeto fixa que o diesel (o principal produto vendido pela Petrobras) terá uma mistura crescente de combustível de origem vegetal (biodiesel e diesel verde) a partir do ano que vem, reduzindo a parcela do combustível que ela produz. A Petrobras afirmou que ainda está analisando o relatório.
Hoje, 14% do diesel vendido nas bombas é composto por biodiesel, produzido principalmente com óleo de soja. A lei determina que o percentual deverá chegar a 20% até o fim desta década e, a partir de 2031, poderá alcançar 25%. Além disso, o texto reserva outros 3% para o HVO ou diesel verde, que é fabricado a partir de óleos vegetais, como de soja e de palma, além de gorduras animais. Durante a tramitação do projeto na Câmara, a Petrobras primeiro tentou retirar os percentuais obrigatórios de mistura de biocombustíveis do texto legal. Vencida, tentou então incluir no percentual reservado ao diesel verde o combustível sintético que só ela produz, chamado de R5, alegando que ele também tem uma parcela renovável (de 5%). A investida bateu de frente com os interesses do agronegócio e foi brecada pelos votos da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e pela Frente do Biodiesel (FPBio), que acabou vencendo a disputa na Câmara. Mas, por influência do então presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, a relatoria foi designada a Vital do Rêgo, que preside a Frente de Energia e é próximo do setor de óleo e gás.
Isso prometia um segundo round na disputa entre os biocombustíveis e a Petrobras no Senado. No meio do caminho, porém, Prates perdeu a presidência da companhia, e o cargo foi ocupado por Magda Chambriard, que, por sua vez, decidiu levantar a bandeira branca com o setor de biodiesel. No dia 21 de junho, ela se reuniu com representantes da bancada do biodiesel e disse que a Petrobras não seguiria na disputa. Segundo a FPBio, a Petrobras entendeu que um hidrocarboneto (derivado do petróleo) não pode estar em um projeto dedicado aos biocombustíveis. O coprocessado (como é chamado o R5) pode ser vendido pela Petrobras como um combustível mais limpo, como o S10 por exemplo, mas não é renovável. O ministro de Minas e Energia (MME), Alexandre Silveira, teve papel crucial para convencer a Petrobras. Magda Chambriard, ao contrário do antecessor no cargo, trabalha em sintonia com o ministério. A FPBio projeta investimentos da ordem de R$ 200 bilhões com o novo marco legal, que também amplia a adição de etanol à gasolina, de 27% para 35%, e cria as bases legais para o desenvolvimento do Combustível Sustentável de Aviação (SAF).
O Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP) diz que o setor ficou decepcionado com a não inclusão do coprocessado da Petrobras no texto, mas que já esperava a derrota. Para a entidade, o País perde a oportunidade de produzir um diesel verde mais barato e de estimular a migração de refinarias para biorrefinarias. O coprocessado não é uma ameaça, apenas mais uma opção. O projeto do Combustível do Futuro também fixa como obrigatória a adição de 1% de biometano ao gás natural a partir de janeiro de 2026, em outra vitória do setor de biocombustíveis. O biometano é fabricado principalmente a partir do bagaço da cana-de-açúcar, mas também há produtores oriundos de aterros sanitários. O percentual poderá ser alterado pelo Comitê Nacional de Política Energética (CNPE) até o teto de 10%. Os atores do setor de petróleo alegam que a regra vai encarecer o gás natural, argumento que é corroborado pela indústria consumidora, sobretudo a que faz uso intensivo de energia. O MME estima que o impacto relativo ao primeiro estágio da meta, de 1%, será de 0,47% no preço do gás.
O segmento produtivo, porém, contesta e afirma que o impacto é mais elevado. Pelos cálculos feitos pela Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) em março, haverá gastos extras de até R$ 1,7 bilhão ao setor, que é o maior consumidor de gás natural (usa tanto como combustível como matéria-prima). O aumento do gás natural, provocado pela entrada do biometano, vai retirar capacidade de competir da indústria instalada no Brasil frente a concorrentes externos. É diferente do biodiesel, que o consumidor seguirá comprando no posto de gasolina, porque a demanda não vai parar. No caso da indústria, um produto que fica mais caro porque é fabricado com gás misturado ao biometano, é deslocado por um importado mais barato. O texto trata de combustíveis e não deveria abordar o uso do biometano, que também é matéria-prima industrial. Assim como ocorreu com o hidrogênio, o tema deveria ser tratado em texto legal à parte. O relator previu que a inserção do biometano será feita de acordo com estudos de impacto econômico, o que pode atender aos pleitos da indústria, mas ainda assim, na visão da Abiquim, há insegurança jurídica sobre como o tema será tratado no futuro.
O Brasil já tem o gás mais caro do mundo e vai ficar ainda mais caro com o biometano. Para tentar amenizar as críticas, o relator no Senado acrescentou atenuantes nas exigências ligadas ao biometano, como a exclusão das térmicas conectadas ao Sistema Interligado Nacional. Pelo parecer, o consumo flexível de gás natural dessas usinas ficará fora da base de cálculo da meta de redução de gases de efeito estufa. Nos bastidores, parlamentares ligados ao agronegócio afirmam que tentarão reverter esse ponto, sobretudo no retorno do texto à Câmara, já que o consumo de gás pelas termelétricas é alto. O biometano é um produto excelente para descarbonizar, mas ficou um 'jabuti' (matéria estranha ao texto principal) dentro de um projeto de lei sobre mobilidade. Estão criando um programa que vai atingir a indústria e ela deveria ter sido escutada, afirma o IBP. Há uma diferença grande entre os cálculos do MME e da indústria em relação ao impacto nos custos. Isso já demonstra que o tema não está maduro o suficiente para avançar.
O projeto de lei do “Combustível do Futuro” fixa como obrigatória a adição de 1% de biometano ao gás natural a partir de janeiro de 2026. O percentual poderá ser alterado pelo Comitê Nacional de Política Energética (CNPE) até o teto de 10%. Os atores do setor de petróleo alegam que a regra vai encarecer o gás natural, argumento que é corroborado pela indústria consumidora, sobretudo a que faz uso intensivo desse tipo de energia. O Ministério de Minas e Energia (MME) estima que o impacto relativo ao primeiro estágio da meta, de 1%, será de 0,47% no preço do gás. O segmento produtivo, porém, contesta e afirma que o impacto é mais elevado. Pelos cálculos feitos pela Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) em março, haverá gastos extras de até R$ 1,7 bilhão ao setor, que é o maior consumidor de gás natural (usa tanto como combustível quanto como matéria-prima). O aumento do gás natural, provocado pela entrada do biometano, vai retirar capacidade de competir da indústria instalada no Brasil frente a concorrentes externos. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.