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09/Jan/2023

Biodiesel: aumento da mistura expandirá produção

AUMENTO DA MISTURA DEVE DAR FORTE IMPULSO À PRODUÇÃO

Superar as perdas de 2022 e otimizar a capacidade de produção viraram lemas para o setor de biodiesel em 2023. Entidades do segmento afirmam que a demanda pelo biocombustível pode ficar até 45% maior caso haja um aumento substancial da parcela a ser misturada ao diesel fóssil. Não há dúvidas de que os combustíveis renováveis serão estimulados com um governo ambientalmente mais consciente, mas não se sabe qual será o incremento da procura para este ano. O mercado trabalha com dois cenários diferentes para o ano. Caso o Brasil mantenha o atual mandato de mistura de 10% de biodiesel ao diesel fóssil (chamado de B10) até março e passe a 15% a partir de abril, o consumo nacional tende a alcançar 8,8 bilhões de litros, incremento próximo de 45% em relação à demanda registrada em 2022, de 6 bilhões de litros. Em um cenário menos otimista, se o País adotar um porcentual menor e mantê-lo por todo o ano - considerando mistura de 12% a partir de abril - a demanda será de 7 bilhões de litros. O volume, mesmo assim, é 16% maior ante o de 2022. Os resultados se alinham com as projeções de entidades do biodiesel, que defendem um cenário intermediário a esses citados, com avanço progressivo dos porcentuais até o B15 (15%). Esse aumento de mistura, para ser sustentável, tem que ser gradual.

A obrigatoriedade na mistura de biodiesel ao diesel fóssil começou em 2008, com o B2, e avançou a 10% até 2018. Naquele ano, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) definiu que o porcentual subiria gradualmente até alcançar o B15, com a mistura de 15% de biodiesel ao equivalente fóssil a partir de março de 2023. O cronograma, no entanto, não previa uma série de revezes que fizeram com que o governo Jair Bolsonaro reduzisse a mistura de forma subsequente em 2021, fixasse o mandato em 10% até o fim de 2022 e depois prorrogasse a medida até 31 de março de 2023. A Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), que representam 90% das indústrias do setor, enviaram carta pedindo para que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalie, agora em janeiro, a possibilidade de aumento da mistura para fevereiro e março (que poderia ser entre 12% e 14%).

As entidades pedem, ainda, para que a gestão defina, até o fim de fevereiro, um cronograma para alcançar o B15. O aumento gradual é mais sustentável para o mercado, mais orgânico, porque as distribuidoras não conseguem virar uma chave, tem que haver um incremento da logística. No relatório final do grupo técnico de Agricultura, Pecuária e Abastecimento da transição do agora governo, publicado no dia 14 de dezembro, há recomendação para revogar a resolução do CNPE, que fixou o B10 em 2023. Embora o documento traga apenas sugestões e não defina se o aumento da mistura será gradual ou imediato, as entidades do segmento acreditam que o governo Lula terá um entendimento “holístico do programa” e defenderá os biocombustíveis como uma política de Estado. As entidades são unânimes em dizer que a interlocução com o governo ao longo dos dois últimos anos foi deficitária.

AUMENTO DA MISTURA DEPENDERÁ DO TAMANHO DA SAFRA DE SOJA

O aumento da mistura obrigatória de biodiesel ao diesel fóssil no Brasil em 2023 dependerá de a safra brasileira de soja, principal matéria-prima para produção do biocombustível, atingir o esperado recorde e do mercado internacional. Temos um excelente cenário para poder abastecer essa indústria, mas precisamos lembrar que vai depender do externo. É preciso aguardar dados mais consolidados. A produção brasileira de soja na safra 2022/2023 deve ficar entre 150 milhões de toneladas e 153 milhões de toneladas. Em 2021/2022, a safra atingiu 125,5 milhões de toneladas. Apesar do volume menor produzido, apenas com o que foi exportado no ano passado (2 milhões de toneladas de óleo de soja), já seria possível incrementar o programa nacional de biodiesel. Mesmo assim, consolidar a safra é um passo importante rumo ao aumento da mistura, prevista para subir para 15% (B15) até março de 2023, segundo o cronograma nacional de 2018. Hoje o mandato está em 10%. Para atingir a meta neste ano, o calendário inicialmente projetado - de aumento gradual da mistura - precisaria ter sido cumprido. No entanto, uma série de instabilidades nacionais e globais culminou no congelamento do mandato em 10% em 2021 e 2022.

Tivemos duas ocorrências de La Niña - em 2021 e 2022 -, o que acabou reduzindo significativamente a principal matéria-prima para o biodiesel no Brasil e na Argentina, além do conflito entre Rússia e Ucrânia, dois países muito relevantes no abastecimento de óleo de girassol, concorrente do óleo de soja. O conflito Rússia-Ucrânia e as perspectivas de produção da Argentina, maior produtor e exportador de óleo de soja, devem permanecer no radar. O ritmo de demanda na China, importante importador de soja, também dará sinais para esse cenário. O segmento de biodiesel argumenta que a safra de soja já é suficiente para a mistura avançar e ainda ressalta que o ano de 2023 traz boas perspectivas quanto aos preços da matéria-prima no mercado externo. Os preços das commodities estão se estabilizando e, com isso, o impacto do preço do diesel em função do biodiesel vai ser mínimo, segundo a Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio). A abertura de mercado brasileiro para exportação de farelo de soja para a China é outro fator que tende a estimular a produção de biodiesel neste ano. Segundo a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), para se possa produzir farelo e ofertar em quantidade para a China, temos que ampliar o esmagamento de soja e dar a vazão ao óleo produzido nesse processo.

IMPORTAÇÃO E PARTICIPAÇÃO NO RENOVABIO

O setor de biodiesel acumula uma série de pautas na agenda. Além da persistente solicitação para que o governo acate o cronograma de evolução do porcentual de mistura do biocombustível ao diesel fóssil, discussões sobre a abertura do mercado de biodiesel brasileiro para importação devem ser constantes. Em consulta pública, o segmento apresentou as fragilidades jurídicas da medida, mas, até o momento, não vê sinais de uma mudança de planos pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). É provável que a ANP abrir para importação, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). A ANP decidiu no fim de 2020 que o Brasil abriria, em 2023, o mercado de importação de biodiesel para cumprir com o porcentual de mistura obrigatória do País. O mandato pretendia ser elevado para 15% (chamado de B15) em março deste ano, mas, até o momento, está fixado em 10% (B10). Essa tomada de decisão da ANP foi feita em um cenário totalmente avesso ao que temos hoje, segundo a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio).

Com a aposta de que ocorreria o aumento da mistura até 2023, indústrias do segmento investiram em expansão e hoje relatam ociosidade. Segundo a Ubrabio, as 57 indústrias do biocombustível do País possuem capacidade instalada para produzir 13 bilhões de litros por ano, mas geraram apenas 6 bilhões de litros em 2022, com a mistura em 10%. O setor não tem receio nenhum de competitividade com a importação, mas não dá para abrir mercado com ociosidade, segundo a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio). Caso a capacidade total de produção de biodiesel fosse adotada, o País poderia reduzir até mesmo a importação de diesel fóssil, que cairia para 8 bilhões de litros (ante 15 bilhões de litros adquiridos do exterior em 2022). A inclusão de outros produtos no programa do biodiesel também é uma demanda que estará em constante debate. Refinarias e distribuidoras solicitam que combustíveis com parcelas renováveis integrem o programa nacional para diversificar as fontes de mistura. As entidades pedem para que o aumento do mandato venha antes dessa adesão.

O setor espera que o governo faça uma mediação inteligente disso. O ideal é que o governo falasse que, com o cronograma para B15, se discutiria o estímulo a outras rotas. O setor também está pronto para exigir mais participação no programa nacional de estímulo aos biocombustíveis, o RenovaBio. A contribuição do biodiesel no programa de descarbonização é comprometida pela dificuldade de rastrear todo o canal de produção da soja, o que garante as notas pela sustentabilidade da cadeia. O segmento defende que o RenovaBio incorpore uma análise por regiões que tenham comportamentos ambientais homogêneos ou mesmo permita uma certificação coletiva para produtores de óleo de soja. O objeto não é maquiar a sustentabilidade, mas que sejam utilizados novos métodos que comprovem a sustentabilidade da matéria-prima que a gente está utilizando. As entidades pedem uma avaliação com parâmetros menos punitivos e afirmam que, se as requisições forem ouvidas, o setor de biodiesel poderá praticamente dobrar a emissão de Créditos de Descarbonização (CBIOs) entre 2023 e 2024.

PRODUÇÃO DE RENOVÁVEIS SINALIZA PARA MERCADO PRÓSPERO

Apesar das incertezas em relação ao cenário externo e das dúvidas no curto prazo quanto ao aumento da mistura obrigatória de biodiesel ao diesel fóssil no Brasil, as perspectivas para o mercado do biocombustível melhoram expressivamente quando acrescentamos alguns anos à conta. A safra brasileira de soja deve atingir 165 milhões de toneladas até 2027, ante cerca de 150 milhões de toneladas previstas para 2022/2023. A soja é a principal matéria-prima para produção do biodiesel, o que sugere um bom cenário. O Brasil está muito bem-posicionado e está muito competitivo. No médio prazo, em cinco anos poderemos ter um cenário positivo para o biodiesel. A expansão da produção de diesel verde (HVO) é outra tendência global a ser observada no médio prazo. O diesel renovável é a grande aposta e pode ser que se veja um mercado exportador mais forte no futuro.

O HVO é um tipo de biocombustível que utiliza óleo de cozinha usado, gordura animal, óleo de peixe e subprodutos de processos industriais em sua composição. Por usar hidrogênio no processo de produção, o diesel verde é mais limpo ambientalmente e tem uma vida útil mais longa que o biodiesel convencional. Estados Unidos e Canadá já estimulam o esmagamento de soja e de canola para abastecer essa indústria e este pode ser um mercado aproveitado pelo Brasil. Poderemos ver um estímulo para aumentarmos a produção de óleo de soja, se observarmos um incentivo para o consumo desses biocombustíveis aqui no Brasil também. Segundo a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), o atraso atual no cronograma de mistura do biodiesel ao diesel fóssil no País gerou imprevisibilidade, o que afasta investimentos e impede a inserção em mercados como este.

O HVO tem que vir, é uma revolução dos novos combustíveis, mas o investimento para a produção é cerca de 4% a 5% maior do que uma usina de biodiesel. O avanço do produto no mercado depende da retomada das perspectivas para o mandato do B15. Uma vez alcançada a mistura de 15%, a ideia das entidades do biodiesel é não parar. Segundo a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), a meta do setor é avançar para o B20 até 2028, mas o prazo poderia ser até antes para a Aprobio. A viabilidade não seria um problema dada a ociosidade. Dados da Ubrabio mostram que as 57 indústrias de biodiesel do País possuem capacidade instalada para produzir 13 bilhões de litros por ano, mas fabricaram apenas 6 bilhões de litros no ano passado. Se houver previsibilidade, a indústria tem uma velocidade de resposta muito grande. Uma vez estimulada a produção, o mercado já há perspectiva de construção de novas indústrias em áreas de fronteira agrícola, como o oeste baiano.

Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.