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10/Nov/2022

Impacto do preço do biodiesel no diesel comercial

Há uma discussão sobre qual o impacto do preço do biodiesel no diesel comercial (aquele que compramos no posto de combustível) com a retomada da mistura aos níveis estabelecidos em legislação. A diferença de resultado no cálculo decorre de qual diesel o biodiesel substitui caso o teor venha a ser elevado: o diesel produzido no Brasil ou o diesel importado. Utilizando Petrobras e S&P Global Platts como fonte dos preços, todos na mesma base, e a primeira semana de novembro como referência, temos: R$ 6,35 por litro para biodiesel, R$ 5,27 por litro para diesel A importado e R$ 4,93 por litro para o diesel A nacional. De cara a diferença de preços do diesel A nacional e do importado já deixa claro que o impacto de preço do aumento do teor de biodiesel é muito menor quando o diesel A importado é substituído. Elevando o teor para 15%, que é o esperado para março de 2023, o efeito no preço do diesel B será de R$ 0,06 por litro, ou seja, apenas 0,93%. Esse é o impacto substituindo diesel A importado. Apenas por curiosidade, substituindo diesel A nacional, o impacto seria de R$ 0,09 por litro, 1,39%.

Ao redor de 23% do diesel A consumido no Brasil é importado. O País não é exportador de diesel. A produção de diesel A brasileira cresce devagar: em 2021 as vendas de diesel A nacional cresceram cerca de 700 mil de m³, ou seja, 1,9%. Já a importação, neste mesmo período, cresceu 2,7 milhões de m³, 18,7%. Enquanto isso, as vendas de biodiesel cresceram 1,17 milhão de m³, 14,7% sobre 2020. Ou seja, se não tivesse incremento da mistura de biodiesel em 2021, as importações teriam sido muito maiores. Assim, a forma correta de avaliar o impacto do aumento do teor de biodiesel no diesel B é substituindo o diesel A importado. No quesito preço, assim, não há mais óbice para se elevar a mistura, uma vez que o impacto de 15% de biodiesel é, a preços de hoje, apenas 0,93% no preço de diesel na bomba. A fixação em 10% para o ano de 2022 foi decidida no final de 2021. O argumento foi de que a mistura impedia redução de preço do diesel ao consumidor final. Na ocasião da decisão, os preços do biodiesel eram sensivelmente mais altos do que o do diesel A importado.

A evolução dos preços do biodiesel no decorrer de 2022 comprova que o produto ficou muito mais competitivo frente ao diesel. Para se ter uma ideia, entre o pico de preços, ocorrido em maio de 2022, e os preços atuais, houve redução de R$ 2,00 por litro, quase 30% de redução. As razões ligadas a impactos de preços ao consumidor que justificavam um menor teor de biodiesel foram desaparecendo no decorrer de 2022. Assim, não havendo impacto relevante em preços, as diversas externalidades do biodiesel deveriam recuperar seu valor, justificando recuperação do teor de acordo com o calendário fixado em legislação. São várias externalidades. A primeira externalidade positiva do biodiesel é aumentar a segurança energética. Aumentar o teor de biodiesel permite a substituição de diesel A importado, reduzindo a dependência externa. O termo "dependência externa" é utilizado pela própria ANP. Depender de diesel importado é menos seguro do que depender de biodiesel nacional porque o biodiesel é "prata da casa" - 100% da matéria-prima utilizada para produção de biodiesel é "prata da casa" e porque o diesel importado tem, frequentemente, preço superior ao diesel nacional.

Mostrei no início do artigo que o preço do diesel A nacional está inferior ao do importado. Assim, mesmo que as refinarias brasileiras precifiquem o diesel nacional pela paridade de importação, os preços internacionais são mais voláteis do que os nacionais, gerando frequentes defasagens. O argumento da volatilidade poderia ser feito ao contrário, ou seja, afirmando que as matérias-primas para produção de biodiesel, sobretudo o óleo de soja, tem seus preços formados no mercado internacional e, portanto, sujeitos a volatilidade. De fato, o preço do óleo de soja é formado no mercado internacional, mas, sendo o Brasil um grande exportador do produto, o óleo de soja é precificado, diferentemente do diesel, por paridade de exportação. Em segundo lugar, tendo em vista que as usinas que produzem biodiesel possuem enorme capacidade ociosa, atualmente em 50%, e que para comercializar biodiesel precisam atender as exigências da ANP de apresentar contratos com distribuidores, há grande competição por preço entre as usinas.

Isso explica por que, comparando preço com preço, é comum o preço do biodiesel ser igual ou inferior ao preço do óleo de soja. A segunda externalidade que os produtores de biodiesel esperam ter seu valor recuperado é a redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE). Evidentemente, essa externalidade não foi ignorada no período de demanda reduzida, que foi o B10 em 2022, uma vez que o biodiesel continua sendo elegível para emitir CBios e o Renovabio é o grande programa brasileiro de valorização das externalidades positivas climáticas dos biocombustíveis. Embora seja importante mencionar que mesmo o Renovabio teve seu funcionamento distorcido por conta de questões de preços, quando o governo federal decidiu transportar parte da obrigação das metas de 2022 para 2023. Voltando ao biodiesel, o que os produtores esperam é que os formuladores de política, caso se vejam em situação de discutir o teor de mistura, levem em consideração que, ao reduzir a demanda, via política, do biodiesel, a mesma política promove aumento das emissões de GEE por conta do maior consumo de combustível fóssil.

É importante reconhecer que escolher uma política que promova aumento de emissões de GEE traz custos para a estratégia climática brasileira de manter nossa matriz energética a mais limpa possível e, adicionalmente, tira força do Brasil para cobrar dos grandes emissores e consumidores de energia fóssil uma transformação nos seus perfis. Os produtores de biodiesel esperam que tais custos sejam reconhecidos e computados. A terceira externalidade que cresce à medida que aumenta a demanda por biodiesel, sempre salvaguardando que essa demanda deve expandir sem gerar impactos de preços aos consumidores, é a geração de renda no interior do Brasil. Diesel importado gera renda e emprego fora do nosso País. Diesel nacional gera emprego e renda no Brasil, mas de forma localizada, dado que as refinarias são poucas e estão todas nas faixas litorâneas, ao passo que as usinas de biodiesel são muitas e estão localizadas nas regiões de produção agropecuária.

Além disso, devido ao Selo Biocombustível Social, a geração de renda tem grande impacto positivo para os agricultores familiares que fornecem produtos agropecuários para os produtores de biodiesel. A quarta e última externalidade que será aqui citada é a produção de alimentos. O processamento de soja resulta em farelo de soja, produto que é a fonte principal de proteína para a produção de proteína animal, e óleo vegetal, utilizado no cozimento de alimentos e produção de biodiesel. Mais demanda por biodiesel, maior o processamento de soja, maior a produção de farelo. Como consequência, maior a oferta de matéria-prima para produção de proteína animal. Tal interrelação positiva entre produção de biocombustível e alimentos não existe e nunca vai existir nos combustíveis líquidos de base fóssil. Fonte: André Nassar. Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Broadcast Agro.