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31/Out/2022

Desmate: Brasil é responsável por medidas da UE

Segundo a Cargill, a demora brasileira em implementar o Código Florestal e coibir o desmatamento alimentou a decisão do Parlamento Europeu de aprovar a lei coibindo a importação de produtos brasileiros associados à conversão de áreas naturais (biomas) para a atividade agropecuária. Apesar de inicialmente "ruim", a medida pode beneficiar produtores do País que conseguirem atestar a origem do seu produto e favorecer o mercado de farelo de soja. Não seria exatamente uma proibição, mas uma coibição, por meio de uma estrutura tarifária diferente aplicada quando não se conseguir comprovar que aquele produto vem de uma cadeia de suprimentos livre de desmatamento. A princípio é ruim para o Brasil? É, porque a imagem do País no exterior é ruim, por acontecerem coisas que não são controladas. O fato é que existe um Código Florestal aprovado há mais de dez anos que não foi implementado, que o próprio governo brasileiro assumiu o compromisso de acabar com o desmatamento ilegal só em 2030 e será preciso de mais oito anos para implementar uma lei que já tem dez anos.

O País está dando motivo para que essas sociedades, que têm ânsia de que isso se resolva com mais rapidez, tomem outras medidas. Há lógica na decisão considerando que a União Europeia vem investindo massivamente para reduzir suas emissões. A mudança nas regras pode ser positiva para o Brasil por estimular o pagamento de um diferencial pelos produtos comprovadamente dissociados do desmatamento. A comunidade europeia está disposta a pagar para ter o produto como eles querem, o que é positivo para o agro brasileiro, porque vai criar essa possibilidade de diferenciação. A grande luta para o Brasil será conseguir negociar que os produtos sejam diferenciados por fluxos de exportação. A preocupação é que os compradores europeus compreendam e aceitem diferenciar, por exemplo, a soja produzida em regiões onde a conversão do bioma local já ocorreu há muitas décadas, como o Rio Grande do Sul, e aquela oriunda de regiões onde a abertura de áreas é mais recente e ainda ocorre, como os estados do MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e de parte de Mato Grosso.

Isso é algo que o governo brasileiro terá de propor. Será preciso mostrar que o Brasil é um País continental e que nem toda soja brasileira é igual, que a produção brasileira tem riscos diferentes em relação a desmatamento (dependendo da origem). É preciso mostrar que mesmo nas regiões expostas à conversão (de biomas, ou seja, ao desmatamento), há produtores que não estão mais abrindo áreas, para que tenham condições favorecidas de acesso a mercado. As novas regras de importações europeias devem exercer, ao menos em um primeiro momento, maior influência sobre o mercado de farelo de soja brasileiro, já que o bloco é o destino de aproximadamente 35% de todo o farelo exportado pelo País. Da soja em grão, somente algo em torno de 10% vai para o mercado europeu. A adaptação às novas demandas é mais fácil e menos custosa para a cadeia exportadora de farelo do que a da oleaginosa, porque processadoras já fazem segregação de farelo para alguns mercados, atestando a origem do grão e que não foi cultivado em área natural recentemente convertida em lavoura.

Já as mudanças para separar a soja em grão serão mais custosas, daí a boa receptividade à intenção dos europeus de pagar um diferencial pelo produto. Sendo a soja uma commodity, a cadeia logística brasileira (caminhões, trens, navios) não foi organizada para diferenciar ou separar a carga por origem. Para exportar uma soja comprovadamente oriunda de uma área não desmatada, será necessário não misturar estas cargas com outras sem comprovação, ou seja, em caminhões, vagões, espaços em navios separados dos demais usados para outras cargas de soja. Os principais Estados produtores de soja que deverão ter de comprovar que sua soja não foi cultivada em área desmatada serão aqueles do MATOPIBA, além da porção mais ao norte de Mato Grosso, justamente as regiões que, em razão de dificuldades e custos logísticos, começaram a se desenvolver mais tardiamente. Outro fator que deve impulsionar mudanças no processo produtivo da soja brasileira é o fato de a Ásia ser importante exportador de carne de aves para a Europa, e o farelo, inclusive o produzido no Brasil, ser a base da alimentação dos animais.

O cliente asiático que exporta para a Europa terá de provar que a soja usada para produzir aquele farelo não veio de uma área de conversão de bioma. Não há um risco iminente de exportadores brasileiros de farelo perderem mercado por conta dessa nova legislação. Para outros Estados da Amazônia, as novas regras estabelecidas pela comunidade europeia pouco mudam a realidade atual, já que as maiores tradings exportadoras atuantes no Brasil, vinculadas à Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e à Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), seguem há 14 anos a Moratória da Soja. A iniciativa busca assegurar que a soja produzida no bioma Amazônia e comercializada pelos seus signatários esteja livre de desflorestamentos ocorridos após 22 de julho de 2008. No caso das exportações brasileiras de milho, cultivado, majoritariamente, como 2ª safra do ano logo após a colheita da soja, a pressão europeia pouco efeito terá.

Grande parte do cereal nacional é vendida para empresas brasileiras, que utilizam o grão como alimento de aves e suínos, cuja carne também comercializada localmente. Quanto maior a demanda doméstica, mais difícil não adquirir milho de áreas desmatadas, ainda que legalmente, porque os consumidores brasileiros ainda não exigem isso. É muito complicado fazer isso sem um diferencial de prêmio para o produtor. A descarbonização da economia é uma tendência sem volta. O agro brasileiro precisa ter consciência que o mundo está indo para a descarbonização. Quanto mais cedo o setor aceitar isso, menos vai doer no futuro. Entretanto, o desmatamento no Brasil por produtores rurais é bem pequeno, mas o setor paga, principalmente, pela grilagem de terras. Fonte: Broadcast Agro.