07/Aug/2024
A primeira audiência de conciliação do Supremo Tribunal Federal, que busca um acordo sobre o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, foi marcada pelo contraste entre o tom neutro do ministro decano do STF, Gilmar Mendes, e a insatisfação declarada dos povos indígenas com o colegiado. Já no primeiro encontro, a tentativa de conciliação esbarrou em um impasse: a própria participação dos representantes indígenas no colegiado está em xeque. Gilmar Mendes adotou um discurso em tom conciliatório. O ministro pesou os argumentos e problemáticas de cada lado envolvido no debate, sejam os povos indígenas ou sejam os possuidores das terras eventualmente a serem demarcadas. Essa dinâmica perdurou durante toda a sua participação na audiência.
Antes de se retirar para outro compromisso, o ministro explicou o funcionamento aos presentes e a divisão do colegiado em etapas, sendo a última destinada à apresentação de propostas para o tema, o que desagradou de antemão aos povos indígenas. A comissão especial de conciliação foi proposta por Gilmar Mendes, relator de cinco ações que tratam da constitucionalidade da Lei do Marco Temporal para Demarcação de Terras Indígenas (Lei 14.701/2023). A lei aprovada no ano passado prevê que serão passíveis de demarcação apenas áreas em que estiverem ocupadas pelos povos indígenas na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Ele fixou o dia 18 de dezembro como prazo final para a tentativa de acordo.
A comissão criada para discutir o tema será composta por seis membros indicados pelo Congresso e seis indicados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), além de representantes dos autores das ações, da União, dos Estados, municípios e de entidades do agronegócio. Com exceção dos indígenas, representantes do governo federal, dos partidos autores das ações sobre a constitucionalidade da lei do marco temporal e senadores foram uníssonos em reiterar que a iniciativa é "inédita" e uma "oportunidade ímpar" para tratar do tema. Acordo, conciliação, consenso, pacificação e preservação de direitos foram as palavras mais proferidas durante as seis horas do primeiro encontro.
Ficou claro que nada será feito à revelia de quaisquer atores presentes, afirmou representante de um dos partidos que questionam a constitucionalidade da lei do marco temporal. O juiz auxiliar do gabinete do ministro Gilmar Mendes, Diego Viegas Véras, destacou que o processo é o mais importante do gabinete de Mendes. É uma janela de oportunidades para a conciliação. Ninguém busca conflito. A garantia dos direitos fundamentais dos povos indígenas e o respeito à Constituição é um ponto comum, ponderou um advogado fundiário que acompanhou a audiência. Para lideranças do agronegócio presentes na audiência, o primeiro encontro mostrou que o caminho para a busca de um acordo comum será tortuoso.
Foram mais de seis horas apenas para definir o calendário das próximas reuniões e com clima de tensão já nas primeiras horas. O primeiro encontro avançou pouco em termos de conciliação e esbarrou em um impasse estrutural. Representantes de povos indígenas questionam a metodologia, os critérios e até mesmo a existência de um grupo conciliatório para tratar dos seus direitos fundamentais. Durante a audiência, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) ameaçou abandonar a discussão por não concordar com a continuidade do colegiado sem a suspensão cautelar da lei.
A condicionante não foi atendida pela Corte, tornando incerta a participação dos representantes dos povos indígenas justamente na comissão para tratar da demarcação de suas terras. Representantes indígenas classificaram o rito da primeira audiência como "atropelo" e relataram sentir maior insegurança quanto aos seus direitos sob o resguardo da Suprema Corte. Ao mesmo tempo em que houve apelo unânime de todos os presentes para a permanência da entidade no colegiado, a audiência foi encerrada sem encontrar uma solução conjunta para assegurar a presença da Apib na comissão. A Apib deve se manifestar em até 48 horas sobre a continuidade ou não no grupo. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.