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17/Aug/2023

PL do Marco Temporal incentiva grilagem de terras

O projeto de lei do marco temporal avança no Senado com dispositivos que incentivam a invasão de terras indígenas e prevê indenizações a grileiros. O tema central do texto é transformar em lei um entendimento de que só podem ser demarcadas as terras ocupadas até a promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Um estudo da consultoria legislativa do Senado, contudo, mostra que o PL vai além. Um dos trechos determina que, até ser concluído o processo demarcatório, não haverá qualquer limitação de uso e gozo aos não indígenas que exerçam posse sobre a área, garantida a sua permanência na área objeto de demarcação. Na prática, alertam os técnicos, a lei significaria uma carta branca a invasores e grileiros. O artigo 9 da proposta é reconhecido como o mais problemático.

Essa disposição, além de obviamente estimular a invasão de terras indígenas ainda não demarcadas, vai em sentido contrário a toda a doutrina e jurisprudência, ao próprio texto da Constituição Federal e aos precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos. A demarcação de uma terra indígena leva anos, com vaivém no Executivo e no Judiciário. Há 114 terras indígenas com processos de homologação em fases adiantadas (“delimitadas” ou “declaradas”). A aprovação do projeto pode inviabilizá-las porque determina a revisão dos processos em curso à luz da nova lei. O artigo 11 prevê a indenização de qualquer proprietário ou possuidor em terra indígena nos casos de “justo título”. O texto não exige a demonstração de “boa fé” da propriedade a ser indenizada, o que contraria expressamente o disposto no parágrafo 6º do artigo 231 da Constituição.

O texto constitucional estabeleceu que são nulos e não produzem efeitos jurídicos os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras indígenas, exceto quando as benfeitorias são derivadas da ocupação de boa fé. O artigo 11 contraria esse dispositivo constitucional, prevendo justamente a indenização que a Constituição nega poder existir, frisa a consultoria do Senado. Ademais, no julgamento do caso Raposa Serra do Sol pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009, que trouxe à tona a tese do marco temporal, ficou decidido que as ocupações e domínios anteriores à demarcação não prevalecem sobre o direito do índio à demarcação de suas terras. A proposta de indenização no projeto do Congresso é um dos pontos já considerados passíveis de judicialização por grupos contrários à proposta.

A grilagem ficou digital e um instrumento do próprio governo acabou sendo usado para roubo de terras. O Cadastro Ambiental Rural (CAR), embora sem valor fundiário, passou a ser usado para que posseiros se vinculassem formalmente, com um documento oficial, a uma determinada área que não poderia ser privada. O registro, embora autodeclaratório, é aceito até para obtenção de financiamentos. O conjunto da proposta tem o poder de inviabilizar os mais de 100 processos de demarcação de terras indígenas em fases finais. Isso porque o artigo 33 prevê a vigência imediata e o artigo 14 estabelece que os processos ainda não concluídos serão adequados ao disposto nesta lei. O projeto foi aprovado na Câmara em maio e tramita no Senado. Relatora da proposta na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) apresentou parecer ao colegiado no dia 8 de agosto e manteve integralmente a versão aprovada pelos deputados.

A aprovação corresponderá, por uma parte, à solução mais adequada para viabilizar a resolução das questões legais e constitucionais envolvendo demarcação de terras indígenas no Brasil, e, por outra, à melhor forma para garantir previsibilidade, segurança jurídica e desenvolvimento ao País, destacou a relatora. Procurada na semana passada para comentar os novos trechos do projeto, por meio da assessoria de imprensa, a senadora não se manifestou. A proposta ainda precisa ser debatida e votada na Comissão de Agricultura, antes de ir à Comissão de Constituição e Justiça. Só depois irá para votação no plenário do Senado, o que não tem data para ocorrer. Na Câmara, o texto tramitou sob o número 490/2007. No Senado, é o 2903/2023.

A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado adiou a cotação do projeto de lei 2.903/2023, que estabelece o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, prevista para esta quarta-feira (16/08). A senadora Soraya Thronicke (Podemos-RS) leu o seu relatório sobre o projeto de lei do marco temporal de terras indígenas e o texto deve ser votado na próxima semana pelo colegiado. Se for aprovada, segue para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A comissão concedeu vista coletiva (ou seja, mais tempo para os parlamentares analisarem o conteúdo do parecer). A previsão, pelo acordo firmado entre os senadores da comissão, é votar o projeto de lei na semana que vem. Também está prevista para a semana que vem uma audiência pública sobre o assunto, antes da votação da proposta. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.