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18/Jul/2023

Armazenagem: déficit segue se ampliando no Brasil

Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em dados divulgados no dia 13 de julho, o Brasil deve produzir 128 milhões de toneladas de milho, somando as três safras do ciclo 2022/2023, crescimento de 13% em relação ao ciclo anterior, que já havia sido recorde. A safra gigante tem ajudado a reduzir a inflação no País ao baratear a ração animal e o custo de produção das carnes, que já acumulam queda de preços de quase 6% no ano, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A safra também tem contribuído para um PIB (Produto Interno Bruto) maior do que o esperado este ano e para superávits recordes na balança comercial brasileira, com o País a caminho de desbancar os Estados Unidos como maior exportador de milho do mundo. Mas, a safra recorde de milho, logo após uma safra também recorde de soja, além dos preços em baixa de ambos os grãos, resultaram em armazéns lotados e toneladas de milho armazenadas ao ar livre, expostas a temperaturas elevadas, à possibilidade de chuvas e a ataques de insetos e roedores.

O problema já aconteceu em anos anteriores, está mais grave em 2023. Segundo a Câmara Setorial de Armazenagem de Grãos da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (CSEAG-Abimaq), o déficit de armazenagem de grãos no Brasil cresceu de 83 milhões de toneladas em 2022 para 118 milhões de toneladas este ano, também um recorde. A Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho) explica que o déficit de armazenagem é um problema crônico do agronegócio brasileiro, mas que vem piorando ano após ano. Isso porque a produção de grãos brasileira tem crescido a uma média 9,4 milhões de toneladas por ano, enquanto a capacidade de armazenagem cresce praticamente a metade disso: a um ritmo de 4,8 milhões de toneladas por ano, segundo dados da Conab e da Abimaq. Assim, com dois anos seguidos de safra recorde, a armazenagem de milho a céu aberto na 2ª safra de 2023 acontece em volume sem precedentes.

É bem mais do que em anos anteriores e o problema da falta de espaço para armazenagem aconteceu no Paraná já na safra de verão (1ª safra 2022/2023), pela primeira vez na história. A título de comparação, enquanto a safra de verão (1ª safra 2022/2023), colhida entre janeiro e fevereiro, somou 27 milhões de toneladas, a 2ª safra de 2020, em fase de colheita, deve chegar a 98 milhões de toneladas, com um crescimento em volume de 14% em relação à 2ª safra de 2022. Antes chamada de "safrinha", a 2ª safra de milho brasileira supera a safra de verão (1ª safra) desde o ciclo de 2011/2012, chegando ao dobro de volume no período 2017/2018 e a mais do que o triplo no ciclo 2022/2023. Agora, está entrando a 2ª safra de 2023, com volume bastante grande de produção, e ela encontrou os armazéns ainda repletos de soja. Então é um problema crônico, mas que esse ano se agravou substancialmente. Quem mais sofre é o milho, porque ele tem um valor agregado menor do que a soja: uma saca de 60 Kg milho vale menos do que a metade que a de soja.

O milho produz duas vezes e meia a mais por hectare, então ocupa duas vezes e meia mais espaço do que a soja ocuparia e gasta duas vezes mais tempo para secar. Então, a situação do milho é mais grave, num cenário onde o Brasil não tem capacidade para processar sua produção inteira. Além da safra recorde, a queda de preços dos grãos também explica o grande volume de milho armazenado a céu aberto este ano, diz o Sindicato Rural de Sorriso (MT). Como não só o preço do milho caiu, mas o preço da soja caiu, muitos produtores não fizeram negociação de soja ainda, estão mantendo a soja armazenada, à espera de preços mais altos. Então, ela está tirando o espaço que seria ocupado pelo milho nesse período. Não há armazéns suficientes na região para armazenar as duas safras, então muitos armazéns estão colocando milho a céu aberto, do lado de fora. Isso é possível em Mato Grosso porque as chuvas são raras na região nessa época do ano. Mas, a partir de setembro, quando voltam as águas, será necessário colocar todo esse milho em algum.

Os anos de 2021 e 2022 foram de preços altos para os grãos. Isso por conta de uma combinação de safras prejudicadas por questões climáticas no Brasil e no mundo; efeitos inflacionários da pandemia de Covid-19; desvalorização cambial no País; e a guerra entre Rússia e Ucrânia, a partir de fevereiro de 2022, que afetou o embarque de grãos ucranianos e o preço de insumos agrícolas, como os fertilizantes. Em 2023, no entanto, os preços apresentam tendência de queda acentuada, devido à expectativa de forte produção no Brasil, elevada oferta também nos Estados Unidos e, mais recentemente, pela valorização do Real, que torna as exportações brasileiras menos atrativas. Assim, a soja, que chegou a ser negociada no Porto de Paranaguá (PR) acima de R$ 200,00 por saca de 60 Kg em março de 2022, é cotada atualmente a R$ 145,00 por saca de 60 Kg, desvalorização de 30% em relação ao pico, segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Universidade de São Paulo (Cepea/USP).

Já o milho chegou a R$ 104,00 por saca de 60 Kg em março do ano passado, sendo negociada atualmente a R$ 55,00 por saca de 60 Kg, com desvalorização de 47% em relação ao pico, conforme o índice Esalq/BM&F. E a falta de espaço para armazenagem pressiona ainda mais os preços, diz a Abramilho. Quando as cooperativas ficam sem espaço para receber a produção dos seus cooperados, o agricultor que ainda não comercializou a produção que está prestes a colher força o mercado, porque precisa se ver livre da produção que ninguém quer receber, fazendo os preços desabarem. O prejuízo aos produtores devido à falta de estrutura para processamento e armazenagem dos grãos é estimado em R$ 30,5 bilhões na safra 2022/2023, segundo cálculo de Carlos Cogo, da consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio, citado pelo diretor da Abramilho. Na região dos Campos Gerais no Paraná, a safra passada do milho veio a R$ 100,00 por saca de 60 Kg e hoje está em torno de R$ 40,00 por saca de 60 Kg.

Esse valor não remunera os custos de produção e a atividade passa a operar no vermelho. É um prejuízo ao agricultor e um desestímulo para a próxima safra, quando provavelmente haverá uma redução de área de plantio. Segundo estimativa da Abimaq, seriam necessários R$ 15 bilhões em investimentos por ano para frear o aumento do déficit em armazenagem. O que falta ao Brasil é recurso para financiamento compatível com o tipo de investimento necessário. É necessário que haja mais recursos para o PCA do BNDES (Programa para Construção e Ampliação de Armazéns do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e de que o financiamento para investimento em armazenagem chegue na ponta, aos agricultores. Em 2022, apenas 15% da capacidade de armazenagem de grãos no Brasil estava nas fazendas, enquanto 85% estavam em áreas urbanas e industriais, administradas em sua maioria por cooperativas e traders (grandes empresas dedicadas à negociação global de commodities).

Nos Estados Unidos, em comparação, mais de 60% da capacidade de armazenagem está nas fazendas. O país tem capacidade de armazenar o equivalente a uma safra e meia, cita a Abramilho, com base nos dados da Abimaq. O Ministério da Agricultura e Pecuária informou que, para a safra 2023/2024, foram destinados R$ 6,65 bilhões ao PCA. São R$ 2,85 bilhões para financiar armazéns com capacidade de até 6 mil toneladas, o que corresponde a 80,9% a mais de recursos comparativamente à safra 2022/2023, e R$ 3,80 bilhões para financiar armazéns com capacidade acima de 6 mil toneladas, ou 60,8% acima do que foi programado na safra passada. Além disso, existem outras medidas para ajudar o produtor a enfrentar a defasagem, como a linha dolarizada do BNDES que oferece recursos sem limite de volume e tamanho de armazenagem para que o produtor não tenha que vender uma safra a preços baixos para colocar outra no armazém.

O BNDES afirmou que, atento ao comportamento da demanda e às necessidades do setor, mantém aberto permanentemente o produto BNDES Crédito Rural. Vale destacar também que para atender aos projetos de armazenagem do segmento, além dos recursos do PCA, o BNDES também realiza operações na modalidade direta, onde o banco assume o risco de crédito, citando as linhas BNDES Finem e Finame Direto. Para o Sindicato Rural de Sorriso, apenas ampliar o volume de financiamento não basta. Uma política governamental a respeito de armazenagem tem que ser implantada de forma urgente no País. É preciso também uma política de Estado para a questão logística, com a melhora das condições de transporte, principalmente através de ferrovias, e o aumento da capacidade dos portos brasileiros. Além disso, existe a necessidade da desburocratização para que a iniciativa privada possa fazer isso acontecer. Fonte: BBC. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.