13/Abr/2023
As importações de diesel russo dispararam no Brasil em 2023. Levantamento da consultoria de preços Argus aponta que mais de um quarto, 25,6%, dos cerca de 1,5 milhão de metros cúbicos de diesel trazidos em março para o País tinham origem russa. E a previsão de analistas e agentes de mercado é que esse fluxo se intensifique nos próximos meses devido aos descontos praticados pelos fornecedores russos. Esses descontos têm chegado a US$ 0,20 por galão em cima do diferencial praticado pelo mercado, que tem como base os preços dos contratos futuros negociados na Bolsa de Nova York. A Rússia tenta ganhar novos mercados em função das sanções de seu cliente mais tradicional, a União Europeia, no contexto da guerra na Ucrânia. O redirecionamento das cargas do combustível fabricadas na Rússia para outras partes do mundo já acontecia desde meados de 2022. Mas se intensificou a partir de fevereiro, quando o embargo aos derivados de petróleo da Rússia teve início oficialmente.
O diesel russo, que no passado servia quase totalmente à Europa, passou a atender à Turquia e países da Ásia, África e América Latina, entre os quais o Brasil. Mais conservadores, os dados oficiais do Ministério da Indústria e Comércio (MDIC) para março apontam 18,53% de diesel da Rússia no total das importações brasileiras do produto. Em fevereiro, essa parcela foi de 13,9%. Seja como for, tanto os porcentuais do governo quanto da Argus dão conta de uma explosão na importação do combustível russo para o Brasil. Isso porque, até pouco tempo atrás, esse fluxo era irrelevante ou mesmo inexistente. A diferença entre os dados da consultoria e os do governo se deve aos transbordos de volumes durante o trajeto. Parte do combustível refinado na Rússia acaba internalizada por outros países que não têm parque de refino, o que muda sua origem oficial no caminho até a costa brasileira. Alguns desses países intermediários estão na costa atlântica da África, no Golfo da Guiné, como Togo e Benin.
Para monitorar o mercado, a Argus usa a plataforma britânica Vortexa, que acompanha em tempo real os navios de carga de commodities energéticas pelo mundo. A maior parte do diesel russo tem entrado no Brasil pelo Porto de Paranaguá, no Paraná, em função de um déficit temporário de produto nacional relacionado à uma parada para manutenção na refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), da Petrobras. Localizada em Araucária, também no Paraná, a unidade é responsável por 12% da produção nacional de combustíveis, e atende os mercados do Paraná, Santa Catarina, além do sul de São Paulo e do Mato Grosso do Sul. É justamente nessas regiões que mais tem sido consumido o diesel russo importado. Mas, as cargas daquele País já estão ganhando todo o território e, em março, chegaram ao porto de Suape, em Pernambuco, para atender também as Regiões Norte e Nordeste do País. Historicamente, o Brasil importa até 30% de todo o diesel que consome. Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), em 2022, essa parcela importada foi de 27,86% do total consumido ou 15,8 milhões de metros cúbicos de diesel.
A maior parte dessa importação relativa a 2022, 57,5% ou 9,1 milhões m³, veio dos Estados Unidos, em geral de produtores instalados no Golfo do México. No mesmo período, somente 0,7% (121 mil m³) veio da Rússia, participação que deve saltar esse ano. Para efeito de comparação, em março, segundo o MDIC, a parcela do diesel trazido ao País de origem russa (18,5%) ainda ficou atrás, mas já se aproximou do volume embarcado dos Estados Unidos e da Índia, que responderam por 28% e 27% respectivamente das compras nacionais do combustível. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Brasil (ANP) ainda não divulgou dados de importação de combustíveis relativos a 2023. Mas, dados do MDIC dão uma dimensão do impacto do diesel russo nas importações do País: a categoria "óleos combustíveis de petróleo ou minerais betuminosos exceto óleos brutos", na qual se insere o diesel, já ocupa 34% da pauta de produtos importados da Rússia pelo Brasil esse ano, ante 14% em todo 2022.
Isso equivale, no primeiro trimestre, a US$ 600 milhões em importações, montante 2.876% superior ao registrado no mesmo período do ano passado (US$ 20,2 milhões). A importação crescente de diesel russo para o Brasil tem sido capitaneada por empresas de pequeno e médio porte. Até o momento, nenhuma das três grandes distribuidoras de combustíveis do País (Vibra, Raízen e Ipiranga), que também dominam as importações, trouxeram diesel da Rússia. O movimento foi confirmado pela Associação Brasileira de Importadores de Combustível (Abicom), que reúne 10 empresas de pequeno e médio porte. Segundo a associação, pelo menos duas dessas empresas têm trazido cargas da Rússia. Não associada à Abicom, a importadora Nimofast é a que tem trazido os maiores volumes de diesel russo para o Brasil. A empresa afirma que tem respeitado as regras de compliance do mercado brasileiro e europeu, que criou um teto aos preços russos para evitar que o país tire proveito de altas nas cotações.
A Nimofast tem operações nos portos de Paranaguá (PR), Santos (SP), Itaqui (MA) e Suape (PE) e planeja manter as importações diretas da Rússia pelo menos enquanto houver prêmio no preço do diesel importado ante os preços domésticos praticados pela Petrobrás. O governo brasileiro nunca restringiu as importações da Rússia, sobretudo no mercado de óleo e gás, que ficou mais apertado desde o início da guerra, quando os países europeus passaram a buscar óleo bruto e derivados de outras origens. Isso aumentou a competição por fornecedores que atendiam países como o Brasil e levou a uma alta generalizada nos preços do setor. De sua parte, a consultoria de preços Argus não revela os agentes por trás do fenômeno, mas detalha que essas empresas têm aproveitado os preços mais baixos do produto russo, negociado com diferencial de preço até US$ 0,20 por galão abaixo do restante do mercado, que parte do preço base de contratos futuros da Bolsa de Nova York.
Segundo a Abicom, a diferença de preço é extremamente convidativa. Isso dá quase R$ 25,00 por m³ ou R$ 0,25 por litro. Em um mercado com margens tão apertadas, é muito expressivo e explica o porquê desse produto entrar tão rápido no País. A StoneX faz diagnóstico parecido e diz haver uma "chuva de diesel russo" no Brasil, o que tem garantido até um certo conforto ao mercado doméstico, dominado pela produção da Petrobras. Em situações normais, a distância da Rússia para a costa brasileira ou de outros países, o que envolve alcançar o Atlântico pelo norte ou uma incursão pelo Mar Negro, encarecem sobremaneira o frete, deixando os preços menos atrativos. Mas, ante às sanções de guerra, essas rotas têm sido executadas e o preço final do produto bastante aliviado para desbancar as ofertas de outras praças, como os próprios Estados Unidos, maior fornecedor de diesel para o Brasil. A Vibra confirmou não comprar de fornecedores russos.
As outras duas empresas com as maiores fatias no mercado brasileiro, Raízen e Ipiranga, assim como o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), que as representa, optaram por não se manifestar. A Argus lembra que não há nenhuma irregularidade na importação de cargas russas por empresas brasileiras, mas diz que, em todo o mundo, grandes empresas têm tido pouco espaço para fazê-lo. Isso porque mantêm relações com bancos e seguradoras norte-americanos ou europeias que vedam operações dessa natureza em função do embargo a produtos russos ligado à guerra na Ucrânia. Fontes graduadas do setor também disseram que as três grandes distribuidoras têm relações sólidas com fornecedores tradicionais, sobretudo norte-americanos, e que uma mudança pontual de estratégia, para aproveitar vantagem momentânea de preços, poderia comprometer a contratação de cargas no futuro em um mercado ainda marcado pela instabilidade. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.