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11/Mai/2022

Fertilizantes: Brasil segue importando da Rússia

Quando os primeiros mísseis russos atingiram a Ucrânia, as reverberações foram sentidas a 10.000 quilômetros de distância, nas vastas fazendas brasileiras que cultivam grande parte da soja do mundo. A Rússia fornece um quarto dos fertilizantes do Brasil, e as sanções destinadas a punir Moscou por sua invasão ameaçavam impedir a exportação da commodity crucial. Isso representava um perigo não apenas para a economia brasileira, mas também para a capacidade mundial de se alimentar. Em poucos dias, as autoridades brasileiras alertaram os agricultores a reduzir um fertilizante crítico, e especialistas preveem que o país – um dos maiores exportadores de milho, soja, açúcar e café – tinha apenas três meses antes de acabar. Agora, dois meses depois, o Brasil está reabastecendo seus estoques de fertilizantes – com a ajuda da Rússia. Assim como o gás russo que flui através de gasodutos para a Europa, centenas de milhares de toneladas de fertilizante russo chegaram ao Brasil desde a invasão. E mais está a caminho. O Brasil correu para comprar fertilizante russo logo antes da invasão para manter os embarques no início da guerra.

E embora a compra de fertilizantes russos em si não tenha sido proibida, os compradores brasileiros tiveram que enfrentar sanções aos bancos russos e obstáculos logísticos que os especialistas temiam que ainda cortassem o comércio. Mas os compradores conseguiram encontrar maneiras de contornar esses obstáculos, incluindo o uso de um banco russo excluído das sanções e a ajuda do Citigroup em Nova York. As remessas são boas notícias para os preços e suprimentos globais de alimentos, mas são más notícias para a estratégia do Ocidente de isolar a Rússia economicamente em uma tentativa de enfraquecer a determinação do presidente Vladimir V. Putin na Ucrânia. As sanções ocidentais congelaram grande parte dos ativos financeiros da Rússia. O que eles não congelaram são os fluxos para a economia, principalmente por meio da venda de commodities. Até que essa lacuna seja fechada, ela alonga a pista de Putin. A invasão da Ucrânia pela Rússia criou um dilema para nações e corporações que opõe os valores à economia.

Grande parte do mundo concorda que a Rússia deve ser punida por sua invasão da Ucrânia, mas funcionários do governo e líderes empresariais estão lutando com as realidades econômicas de fazê-lo. O maior exemplo é o petróleo e o gás russos, uma salvação econômica muito maior para Putin do que o fertilizante. Países de todo o mundo continuam comprando combustível da Rússia, enquanto tentam cortar Moscou de outras maneiras. O fertilizante russo apresenta um dilema semelhante. A Ucrânia e a Rússia estão entre os maiores exportadores mundiais de trigo, milho e cevada, e a guerra manteve grande parte dessas colheitas engarrafadas, aumentando os preços e exacerbando a escassez global de alimentos. A Rússia também responde por 15% das exportações mundiais de fertilizantes. Bloquear essas exportações privaria Putin de outro fluxo de receita que pode alimentar a guerra da Rússia contra a Ucrânia. Mas funcionários das Nações Unidas e outros especialistas alertaram que as restrições aos fertilizantes russos aumentariam ainda mais os preços e esgotariam os suprimentos de alimentos. Diante da perspectiva de tal crise, os Estados Unidos criaram uma redução em suas sanções no final de março para permitir explicitamente a compra de alimentos e fertilizantes russos.

Embora as sanções financeiras ainda compliquem as transações, autoridades americanas têm trabalhado para tranquilizar outros governos e líderes empresariais – incluindo reuniões com autoridades governamentais e da indústria no Brasil – que a compra de fertilizantes russos não é proibida. A Europa estabeleceu um teto de um ano para as importações de certos fertilizantes russos, permitindo apenas 2,6 milhões de toneladas no continente em um ano – menos da metade do que a Europa importou em 2021. Com parte desse fertilizante agora chegando aos agricultores no Brasil, os economistas preveem uma desaceleração nos recentes aumentos de preços e melhores colheitas, aumentando as chances de que os agricultores possam compensar parte da escassez de alimentos infligida pela invasão da Rússia. Isso mantém os preços sob controle, e é realmente importante, considerando o impacto do conflito sobre os alimentos para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. Se o Brasil recuasse no ano que vem por causa da falta de fertilizantes, certamente seria uma má notícia para uma crise global de alimentos.

O Brasil importou 750.000 toneladas de fertilizante russo em março, grande parte potássio, segundo estatísticas do governo, um recorde para março e um aumento de 14% em relação ao mesmo mês do ano passado. O maior comprador de fertilizantes russos é o Brasil, que importa cerca de um quarto de todos os seus fertilizantes da Rússia. No início deste ano, com tropas russas reunidas na fronteira ucraniana, o presidente Jair Bolsonaro do Brasil posou para fotos com Putin no Kremlin. Na reunião, uma semana antes da invasão, Bolsonaro disse que o Brasil estava “solidário com a Rússia”. Na mesma viagem, ele disse que o Brasil dobrará suas compras de fertilizantes russos. Após o início da invasão, Bolsonaro disse que o Brasil permaneceria neutro e deixou claro o porquê. “O que acontece a 10 mil quilômetros de distância na Ucrânia tem repercussões no Brasil”, disse. “Temos negócios especiais com a Rússia.” “Para nós”, acrescentou, “a questão dos fertilizantes é sagrada”. Se esse suprimento de fertilizantes poderia chegar ao Brasil, no entanto, parecia questionável.

As sanções aos bancos russos rapidamente dificultaram a realização de transações financeiras, as empresas que ajudam a facilitar os negócios estavam interrompendo os negócios por medo de repercussões e muitos remetentes estavam se afastando por causa dos altos prêmios de seguro e preocupações de segurança. O Ocidente também emitiu sanções contra os oligarcas que possuíam dois dos maiores produtores de fertilizantes da Rússia. Para agravar a questão, Belarus, o aliado mais próximo da Rússia e um grande produtor de potássio, foi atingida por suas próprias sanções em fevereiro por forçar um avião comercial a pousar para prender um dissidente. O potássio, muitas vezes extraída do fundo do mar evaporado, é crucial para o cultivo de soja, que o Brasil produz mais do que qualquer outro país. Desde o início da invasão da Rússia, os preços do potássio subiram 50%. Antes da guerra, os compradores brasileiros compraram mais potássio russo do que o normal, resultando na importação de 750.000 toneladas de fertilizante em março, grande parte dele potássio. Foi um recorde para março e um aumento de 14% em relação ao mesmo mês do ano passado. No entanto, novas compras continuaram difíceis.

Assim, o Brasil e outros países encontraram outras formas de comprar da Rússia. Os compradores brasileiros passaram a usar o Gazprombank, um grande banco russo poupado de sanções porque lida com muitas transações de energia para países que continuaram a comprar gás russo. Os importadores brasileiros também têm usado o Citigroup como intermediário para muitas transações, em parte porque acreditam que isso poderia ajudar a evitar possíveis armadilhas com o Departamento do Tesouro dos EUA, de acordo com dois funcionários do banco próximos às transações que falaram sob condição de anonimato porque eles não foram autorizados a discutir o negócio. Bancos maiores como o Citigroup geralmente ajudam a facilitar essas transações internacionais. Uma vez que os Estados Unidos deixaram claro que o fertilizante russo não estava sujeito a sanções, também ficou mais fácil encontrar carregadores dispostos a transportar a commodity. Nas últimas semanas, uma grande empresa russa de fertilizantes vendeu mais de 165 mil toneladas de potássio para compradores brasileiros, com os embarques previstos para junho. Isso já era metade do potássio russo que chegou ao Brasil em junho de 2021.

A Rússia também conseguiu encontrar outros compradores dispostos para seu potássio na China e no Sudeste Asiático. A Rússia está liberando seu potássio. Não é uma situação tão apertada quanto se imaginava. No mês passado, Bolsonaro se reuniu com o chefe da Organização Mundial do Comércio e pediu a ajuda da agência para isolar a indústria de fertilizantes de novas sanções caso os Estados Unidos e outros países ocidentais apertem suas políticas à medida que a guerra se arrasta. Ainda assim, o governo brasileiro diz que o novo fluxo de embarques russos fornece a seus agricultores fertilizante suficiente para as principais culturas do Brasil nos próximos meses. Mas as preocupações com o acesso ao mercado russo levaram a um novo esforço para tornar o Brasil mais autossuficiente. Bolsonaro e seus aliados pressionaram para abrir a floresta amazônica para a mineração de sal de potássio para produzir potássio. Um projeto de lei foi suspenso apenas após grandes protestos na capital do Brasil. Para o potássio, não há alternativas hoje para o Brasil. O Brasil é dependente de Belarus e da Rússia. Fonte: The New York Times. Traduzido e adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.