18/Jan/2022
Do que o Brasil consome de ingredientes ativos ou produtos formulados na agricultura para defesa vegetal, 76% são importados e 32% vêm da China, que está passando por uma escassez de energia. Essa restrição reduziu a oferta e se juntou ao problema de transporte marítimo. Na pandemia, foram reduzidas as linhas de frete no mundo inteiro. Da Ásia para a América do Sul ainda mais, porque é um mercado que vai cheio e vem menos cheio, então não interessa tanto para o negócio. Esse cenário formou a tempestade perfeita, visto que o glifosato – herbicida mais usado no Brasil e essencial para a dessecação da área pré-semeadura – é proveniente do fósforo amarelo, insumo que exige muita energia e água para sua sintetização e, portanto, não foi eleito como segmento prioritário na volta das atividades após a diminuição dos casos de Covid-19 na China. A questão do glifosato, aliada à crise no fornecimento de fertilizantes provocada por problemas geopolíticos em Belarus, um dos principais produtores de potássio do mundo, fez o preço dos insumos agrícolas disparar e tem deixado os produtores brasileiros assustados. O Brasil tem estoques suficientes para o manejo da safra de verão, que foi plantada em setembro/outubro e será colhida a partir de janeiro. Não deverá faltar produto.
Se houver problemas, serão situações pontuais de empresas que fecharam os contratos em cima da hora e que não serão cumpridos, porque os chineses não entregarão. O agravante é que não há substitutos para o glifosato. Há apenas paliativos, como os produtos pré-emergentes, aplicados no solo para controlar as ervas daninhas antes da semente brotar. E os pós-emergentes, como o próprio nome já diz, aplicados para o mesmo fim após a emergência. Nesta conjuntura de falta de insumos para a produção de defensivos convencionais, os produtos biológicos ganham um protagonismo ainda maior. No Brasil, o segmento registrou uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 42% de 2017 a 2020. Um dos motivos é o fato de muitos insumos biológicos não serem dolarizados. Há muitas matérias-primas nacionais, portanto, não sofrem o impacto direto do câmbio, o que traz uma certa vantagem. Quanto à demanda, a procura tem crescido não só pela escassez de insumos químicos, mas pelo momento atual, de transição para uma agricultura de baixo carbono, tema enfatizado na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 26. Mas a participação do mercado brasileiro de biodefensivos no valor global em 2020 foi de 5%.
O segmento cresce por diversas razões: a pressão cada vez maior de empresas e consumidores para a redução de resíduos de agroquímicos nos alimentos; a atitude de muitos países de proibir defensivos convencionais habitualmente utilizados; a busca pelo equilíbrio do ecossistema, que faz o produtor priorizar os insumos biológicos; e o aumento dos investimentos privados. Ao contrário de Europa e EUA, onde os produtos biológicos são mais focados nos hortifrútis, no Brasil, a soja, o algodão e a cana-de-açúcar lideram a adoção dos biopesticidas. A soja é o maior mercado e dobrou de tamanho em relação à safra 2017/2018. Hoje, 15% da soja é tratada com biodefensivos. Muitos desses biodefensivos são fabricados dentro da própria fazenda, por causa da chancela dada pela Lei de Produção Orgânica (Lei 10.831/03) e pelos decretos 4.074/02 e 6.913/09, que instituem que produtos fitossanitários aprovados para a produção de orgânicos e destinados ao uso próprio não precisam ter registro. No ano passado, a prática ganhou reforço pelo Decreto 10.375/20, que instituiu o Programa Nacional de Bioinsumos (PNB) – e agora o tema voltou à tona devido ao Projeto de Lei 658/21, que tramita no Congresso Nacional e dispõe sobre a classificação, o tratamento e a produção de bioinsumos por meio de manejo biológico on farm.
Os produtores rurais comemoram a nova legislação, mas o tema é visto com ressalvas pela indústria de biodefensivos, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela academia. O setor industrial encomendou uma pesquisa da IHS Markit sobre o assunto e o primeiro aspecto levantado é que a orientação legal se aplicaria às práticas tradicionais da agricultura orgânica, não justificando a multiplicação em larga escala desses produtos. A Anvisa, afirmou, durante audiência pública, que a agência não se coloca em oposição ao produtor produzir seus próprios insumos, como os microrganismos biológicos de controle. O tema deve ser melhor discutido e a produção, nesse caso, precisa ser controlada, regularizada, fiscalizada, a fim de garantir a segurança. Por parte da indústria, o temor é que a multiplicação de microrganismos on farm, sem o investimento e o rigor necessários, produza biológicos de baixa qualidade, o que poderia depor contra o setor e ainda causar riscos ao meio ambiente e à saúde humana. Enfim, além da falta de insumos para a produção agrícola, a regulamentação da produção on farm é um capítulo que deve render muita discussão em 2022. Fonte: Globo Rural. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.