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25/Abr/2019

Plano Safra: entrevista com o Secretário do MAPA

O Secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Eduardo Sampaio, adiantou, em entrevista, o que está em discussão para o próximo Plano Safra. Há sinais de que os juros vão subir e o volume de recursos pode ficar estável ou levemente mais alto que o atual. Ele também disse que não será feito aporte de dinheiro para o Moderfrota neste momento, mesmo havendo demanda do setor de máquinas por mais recursos às vésperas da Agrishow, maior feira agrícola da América Latina.

1. Vai aumentar a taxa de juros para o grande produtor?

Se eu tivesse que optar hoje entre uma taxa de juros um pouco maior, hoje o grande produtor paga 7% ao ano, para ter certeza que eu alavancaria um volume maior de recursos, eu optaria por isso. Falei no campo da hipótese, estamos fazendo simulações. Estamos tentando que não aumente, mas a prioridade minha e da ministra Tereza Cristina e do ministério da Economia é volume de recursos em detrimento da taxa de juros favorecida.

2. Você está indicando que há chance das taxas de juros do Plano Safra subirem mesmo com manutenção da taxa Selic?

Isso. Estamos estudando, não há certezas. As taxas de juros de alguns programas, não dos pequenos produtores, talvez o custeio do grande e alguns programas de investimento aumentar um pouco.

3. Por que adotar essa estratégia?

Nós temos que fazer uma balança. Temos recursos obrigatórios, que não tem custo para o Tesouro, que é o Banco Central que provê através dos depósitos à vista, e tem recurso que precisa de equalização, que é recurso do programa de investimento, e tem a poupança rural. Para alavancar esse recurso eu tenho que fazer a conta dos juros versus a disponibilidade. Então para poder garantir um volume de recursos bom, no mínimo igual ao ano passado ou um pouco mais, talvez precise mexer na taxa de juros.

4. O argumento do produtor é que existem recursos disponíveis, mas que o problema está na taxa de juros. Ou seja, o futuro Plano Safra não estaria lidando com um dos principais pontos apontados pelo setor?

É, eu entendo isso. Hoje o ‘pronafiano’ tem taxa de 4,5% ao ano, se for médio produtor 6% ao ano e se for grande 7% ao ano. Essa é a taxa nominal de juros do crédito rural oficial. Muitos produtores, a grande maioria deles, não tem acesso a esses recursos, porque os recursos são limitados e quem não tem acesso vai buscar taxa livre ou se financiar com multinacionais via troca de insumos, aí financia 15%, 18%, vai emitir uma CPR e empenhar sua produção para entregar para uma trading e vai ter juro embutido, que ele muitas vezes não faz a conta, de 15%. E pior do que isso, quando o produtor tem acesso ao crédito rural (além de ter juro mais baixo) ele pode escalonar a venda. Vamos supor que de 7% passasse para 8%, é um juro muito mais baixo e o produtor do que ele tem disponível fora do crédito rural oficial.

5. A economia brasileira não está se recuperando como o esperado e já há projeções de que a Selic pode chegar ao fim do ano abaixo de 6,5% ao ano. Ou seja, se houver alta de juros no Plano Safra terá acabado o subsídio?

Ainda fica, mas é uma conta complicada. Os bancos ainda cobram spreads elevados, outra coisa que não está na governança da Agricultura, mas estamos tentando negociar isso também. Não é subsídio nem equalização, tecnicamente falando. É um pagamento de um monte de coisas embutidas nisso, mas se o Tesouro não fizesse a equalização a taxa para o produtor rural seria mais alta. Por outro lado, se tivermos uma Selic mais baixa no fim do ano, nós teremos um sinal forte para baixar a taxa de juros fora do crédito rural oficial. A taxa de juros, alavancada pela LCA, que hoje roda de 9,5% a 11% ao ano, se eu baixar a Selic teremos sinal forte para baixar o custo desse recurso para o produtor.

6. O que você está sinalizando é que a taxa de juros para o médio produtor pode começar em 8,5% ao ano para o próximo Plano Safra?

Não, o médio produtor hoje paga 6% ao ano e estamos fazendo de tudo para manter a taxa para o médio e pequeno produtor.

7. Em quanto tempo deverá estar resolvida a taxa de juros do Plano Safra?

O Plano Safra será anunciado na primeira ou segunda semana de junho. Talvez 12 ou 13 de junho e isso tem que ser definido de três a quatro semanas antes. Nós estamos subindo o nível da discussão, não mais no campo das ideias, mas, mais concreta.

8. Semana que vem teremos a Agrishow, uma das maiores feiras agrícolas da América Latina e o recurso para Moderfrota acabou. Inclusive o setor de máquinas quer aporte adicional se não a falta de dinheiro pode travar negócios na feira, vai ter recursos adicionais?

No caso de máquinas agrícolas, o Moderfrota tem juros de 7,5% – o juro mais caro que tem no nosso programa de investimento – mesmo assim, é um juro muito bom. Se no ano passado tivessem concordado em colocar essa taxa em 8,5% eu teria hoje R$ 2,5 bilhões a mais para emprestar. Pensa bem: de 7,5% para 8,5% tem uma diferença, iria afetar um pouco as vendas, mas R$ 2,5 bilhões que teria a mais de dinheiro. De fato, os recursos acabaram e eles acabaram por um bom motivo, porque foram tomados. Não só do Moderfrota, o Banco do Brasil disse que acabou o recurso do Pronaf Investimento. Assim, de novo, se eu tivesse que escolher aqui hoje e aparecesse o ministro Paulo Guedes na minha frente provavelmente eu iria priorizar: 1) Pronaf Investimentos 2) Pronamp 3) Programas de Armazenagem e Inovagro e depois o 4) o Moderfrota. Eu entendo o pessoal de máquinas agrícolas estarem preocupados, mas eu ouço os produtores e entidades e as prioridades são esses os programas que eu falei. O pessoal quer modernizar os aviários, construir armazéns. Máquina é prioridade também, mas não é nem o primeiro lugar nem o segundo.

9. Então o governo já decidiu que vai ter juros mais altos com volume de recursos maiores?

Não, não está decidido. Estamos fazendo exercícios, é uma equação de diferentes variáveis. Isso que falei é se eu tivesse que tomar uma opção eu optaria por juros mais altos e mais dinheiro. Mas, a equação não está fechada ainda não.

10. Se a decisão ainda não está fechada é por que há divergências importantes nesse ponto?

Os cálculos estão sendo feitos nesse momento, mas nenhuma divergência muito aguda aflorou até agora. Óbvio que o pessoal do Tesouro sempre está mais cioso da despesa pública, o do Banco Central está preocupado com a condução da política monetária do Brasil e nós da Agricultura com o financiamento da safra. Então, são três visões diferentes. Não tem um atrito grande a ponto de dizer que o subsídio vá cair de 20% a 30%, não chegamos nesse finalmente ainda não.

11. Vai ter recurso para a Agrishow? Como vai ficar a feira?

Não estamos prevendo recurso adicional para o Moderfrota, mas já tenho notícias de que os bancos lançaram linhas bastante competitivas com juros ao menos de 10% ao ano para aquisição de máquinas.

12. Quem estava pagando 7,5% ao ano no Moderfrota não quer pagar 10% ao ano, não é?

Eu sei disso. 7,5% ao ano é um juro bastante favorecido e produtor Pronaf pagava 4,5% ao ano, extremamente favorecido. O recurso acabou e estava tão bom que foi muito tomado. Se tivessem optado por juros de 8,5% ao ano lá atrás, agora teríamos R$ 2,5 bilhões a mais.

13. O setor agro tem respondido bem aos recursos investidos nele. Aumentar a taxa de juros para o setor agropecuário não seria dar um tiro no pé enquanto a própria economia não consegue dar sinais claros de recuperação?

Você está dando como verdade que vai aumentar os juros. Então, vamos supor que vai. Se aumentar um pouco a taxa de juros para algumas linhas e conseguir manter o volume de recursos, ainda vai ser um sinal muito positivo para o setor. Tenho certeza que não vai ser isso que vai fazer a diferença. A gente está trabalhando para manter para a grande maioria dos produtores a taxa de juros que já vinha sendo praticada, pequenos e médio. Hoje em torno de 860 mil contratos de custeio, 400 mil contratos pegam até R$ 20 mil. Apenas 1.800 produtores pegam acima de R$ 2 milhões. Eu estou falando desse público, de um público muito menor que tem e terá acesso a taxa de juros bastante competitivas também.

14. O grande produtor poderá pagar juros mais altos, então, pois o governo entende que ele tem outras formas de se financiar?

É esse o ponto. Não é decisão tomada, mas uma das opções avaliadas é mexer na taxa de juros de custeio do grande produtor para poder alavancar os recursos para os pequenos produtores e médios.

15. E para as linhas de investimentos os juros também tendem a aumentar?

Investimentos é mais complexo, pois são vários programas. Aí teria segmentação, alguns programas prioritários aumentar menos ou não aumentar.

16. Em quanto você estima que vai aumentar o volume de recursos? Será para investimento e custeio?

Há uns 4 ou 5 anos que houve um descasamento muito grande entre o que foi anunciado e o que foi praticado. O ano passado, ainda não temos números fechados, até o mês de março tinham sido aplicados R$ 130 bilhões e haviam sido anunciados R$ 220 bilhões no começo do Plano Safra passado que não se concretizou. Havia uma superestimativa desses recursos. Então, eu estou trabalhando com o recurso que foi efetivamente aplicado. Sobre essa base que a gente pretende aumentar e essa base está na casa dos R$ 170 bilhões, eu pretendo ampliar essa base aí. Repito: prioridade custeio de pequenos, custeio e investimento de médios, custeio e investimentos de grandes e dentro de investimentos alguma separação entre programas mais prioritários do que outros.

17. A ministra da Agricultura recentemente disse que o Plano Safra poderá não atender todas as demandas, mas que não irá piorar. Não vai piorar mesmo?

São poucos produtores que conseguem tomar recursos de 4,5% a 7,5% ao ano porque às vezes o banco cobra alguma coisa adicional, tem que contratar um Proagro junto. O fato é que são poucos produtores que conseguem pegar o crédito rural. O crédito rural foi importante, o Brasil é um dos únicos países do mundo que tem crédito rural, porque ficamos muitos anos com taxas de juros altas e a agricultura precisa de volume de recursos significativos por um tempo longo. Então, o Brasil desenvolveu uma maquinaria sofisticada para propiciar aos agricultores um financiamento compatível com sua atividade. Mas, se pegar as últimas 5 safras – sem a atual que está em aberto – nós tivemos uma queda só nos contratos de custeio de 280 mil contratos e esses foram pegar dinheiro na trading e no mercado informal. Pararam de pagar 7% ao ano e foram pagar 15% ao ano, por isso que estou insistindo, eu se tiver que advogar por aumentar o juro do crédito rural e tiver certeza de que terei mais recursos, eu opto por esse caminho. Porque mesmo com juros mais elevados no crédito oficial é um dinheiro muito melhor que ele vai ter acesso. É uma verdade que temos que lidar com ela.

18. Você várias vezes falou do spread bancário e dos “penduricalhos” e dificuldades do produtor em acessar o crédito rural oficial. Existe alguma ação do governo para reverter esse quadro?

São duas coisas, o spread, o Banco Central está preocupado com isso. E da outra coisa é delicada, que o agente financeiro exige contrapartida para a contratação do crédito rural, seja via seguro ou título de capitalização, o produtor sente medo de fazer queixa e sofrer represália, como o crédito rural é para poucos, o banco fica com o poder de barganha na mão. A chamada venda casada ou exigência de reciprocidade, está sendo desenvolvida uma sistemática para tratar disso para o produtor ter mais confiança para fazer as denúncias e atacar de forma sistemática isso já que impacta em até 2% no crédito contratado.

19. Quando esse serviço de denúncia entrará em vigor?

Faz duas semanas que começamos a mexer nisso. Estamos envolvendo a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) nisso e vamos envolver a Secretaria de Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça. Temos que envolver um conjunto maior de instituições que não é só o Banco Central. Essa exigência de reciprocidade sempre aparece entre as top 5 demandas do setor.

20. O ministro da Economia já indicou que é contra subsídios. Chegou o fim da era de subsídios?

Nós estamos discutindo o futuro da política agrícola. Óbvio que alguma coisa para o Plano Safra atual já está sendo colocado no balaio, por exemplo, juros versus recursos. Talvez lá na frente o subsídio fique só para pequenos produtores, por exemplo. Ou financiamentos de longo prazo ou programas tipo ABC, ou armazenagem, inovação. No longo prazo, contando com aprovação da Previdência, estabilidade macroeconômica do país e profissionalização da agricultura brasileira, contando com tudo isso, quem sabe no longo prazo o produtor brasileiro poderia chegar no banco sem nem lembrar que existe crédito rural. E ficar assim um programa favorecido para o muito pequenino, com subsídios sim. Nem ministro Paulo Guedes, nem o presidente do Banco Central ignoram essa necessidade.

21. O que nos preocupa é a questão conjuntural. No momento atual a taxa de juros está baixa, no entanto, não faz muito tempo que a taxa de juros do Brasil era 14% ao ano. Se mudar a conjuntura, vai ficar de “presente” o fim do crédito rural? Como faz?

Claro, nós estamos há apenas um ano com taxas de juros decentes. Então por isso que falei de longo prazo, não sei se 5 anos, 10 anos, por isso que falei isso. Ninguém está pensando em taxa de juros variáveis, pois o pessoal tem trauma disso. No último Plano Safra as taxas variáveis eram mais baratas do que a fixa, mas não foram tomadas. No começo do ano o pouco de recurso que tinha na taxa variável nós colocamos no investimento e deu certo fôlego para o Moderfrota e para outros programas. Taxa variável ainda é assunto tabu, talvez a gente continue insistindo e deixe um pouco de recursos lá. Então, por causa disso que você falou, não estamos pensando em taxa variável ainda, estamos pensando em melhorar o seguro, inserir mecanismo de garantia de renda. Ninguém fala de interromper o financiamento do setor do agronegócio nem no curto nem no médio prazo, afinal, mal ou bem, o setor está nos levando para frente. Estou preocupado com o Plano Safra desse ano e do ano que vem, ninguém está falando em acabar com o crédito rural. Está sendo discutido melhoria na LCA, no CPR, que são afetadas pela Selic. As demais coisas que falamos antes, como dinheiro do investimento, ele é do BNDES e não é remunerado pela Selic, mas pela taxa do FAT. O dinheiro da poupança e dos bancos cooperativos é pela poupança, então a Selic não impacta diretamente no custo do meu dinheiro do crédito rural, mas impacta na LCA. Quem sabe amanhã as cooperativas se animam a emitir mais títulos como a CDCA? Quem sabe com a manutenção da Selic em taxas baixas as cooperativas não se animam a emitir mais CDCA’s?

Fonte: UOL