07/Oct/2025
No domingo de 10 de agosto, Dia dos Pais, o Brasil enfrentou uma situação crítica. Enquanto a produção de energia aumentava, o consumo despencava por causa do feriado e da temperatura baixa. Para evitar que o sistema entrasse em colapso e provocasse um apagão, cerca de 90% da geração precisou ser cortada e várias usinas, desligadas. A crise já é comparada ao racionamento de 2001, com restrições técnicas e financeiras. Mas, desta vez, o problema é o oposto. Naquela época, o Brasil adotou um programa de redução do consumo de energia para se adequar à oferta, baixa em razão do nível dos reservatórios, com a escassez de chuva. Agora, a geração está maior do que a demanda. Isso ocorre sobretudo por causa da escalada da geração distribuída, aquela produzida pelos próprios consumidores com painéis solares instalados no telhado das residências e estabelecimentos comerciais. O sistema no País é interligado e coordenado pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), responsável por decidir quais usinas devem gerar energia e quais precisam reduzir a produção, de acordo com a oferta e a demanda.
O desafio é que o ONS vem perdendo parte desse controle devido ao avanço da geração distribuída, que injeta energia diretamente na rede de distribuição. Como não consegue regular esse tipo de produção conforme a necessidade, o operador é obrigado a cortar a geração das grandes usinas, especialmente eólicas e solares. A dinâmica, conhecida no setor como curtailment, gera impactos financeiros significativos. O aumento da micro e minigeração distribuída traz desafios adicionais para a operação do sistema, pois, com o crescimento da geração distribuída e de usinas conectadas à rede das distribuidoras, a projeção é de que, em 2029, apenas 45% da capacidade instalada estará sob a coordenação do ONS. Especialistas ressaltam que 55% do sistema estaria sem gerenciamento. A geração distribuída tem de ser marginal, e não determinante. Caso contrário, coloca o sistema em risco e põe em xeque todo o modelo do setor, diz a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica). Entre outubro de 2021 e agosto de 2025, a energia solar e eólica cortada somou 39 terawatt-hora, o equivalente a todo o consumo da Região Nordeste em 2024.
Os cortes resultam em perda bilionária para o setor, trazem insegurança jurídica e inibem novos investimentos. Entre outubro de 2021 e agosto de 2025, o prejuízo foi de R$ 6 bilhões, metade só neste ano, até agosto. Para consultoria PSR, a operação do sistema elétrico brasileiro ficou muito mais complexa nos últimos anos. A experiência do passado já não serve para o futuro. É preciso modernizar as ferramentas computacionais usadas na gestão do sistema. Os desafios da operação precisam ser mais escutados pelo planejamento para que o Brasil tenha uma matriz de recursos com características e atributos necessários que permitam ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) fazer seu trabalho e equilibrar oferta e demanda. A escalada da energia solar foi uma saída que consumidores encontraram para ficar menos vulneráveis ao encarecimento da energia elétrica. Embora seja uma fonte renovável essencial à transição energética e para a redução de custos, seu crescimento precisa ser acompanhado de planejamento cuidadoso e políticas que garantam sua expansão de forma equilibrada e sustentável.
O descontrole gera riscos de colapsos, cortes indesejados em energia limpa e gastos com fontes poluentes. Um dos desafios é que, entre as 10h e as 16h, as usinas e os painéis solares geram muita energia num horário em que o consumo é baixo. No fim da tarde e no início da noite, quando essas unidades já não geram mais energia pela falta do sol, a demanda começa a crescer e exige que usinas térmicas, algumas poluentes, entrem em operação. Normalmente, o ONS e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) planejam o crescimento das linhas de transmissão vinculado ao da demanda, e não ao da oferta. O problema é que o avanço da geração distribuída se deu de tal forma que as previsões não capturaram o movimento. Hoje, o volume de geração distribuída já atingiu o previsto para 2030. O que está ocorrendo é algo absolutamente crítico. Em só uma década, a capacidade instalada de energia solar no Brasil deu um salto impressionante: passou de modestos 132 MW para cerca de 60 mil MW. Dois terços vêm da geração distribuída (a fornecida pelos próprios consumidores), modalidade que já envolve 20 milhões de brasileiros.
O ONS e o Ministério de Minas e Energia buscam soluções. O ONS afirmou que uma das propostas para aliviar o sistema sem medidas emergenciais é a implementação de Operadores do Sistema de Distribuição (DSO - Distribution System Operators), que permitiria coordenar os recursos conectados diretamente às redes das distribuidoras. Seria como se as distribuidoras atuassem como um operador do sistema. Em março, o Ministério de Minas e Energia (MME) criou o Grupo de Trabalho do Curtailment, com o objetivo de seguir atuando de forma estruturada para garantir a segurança e estabilidade do sistema elétrico brasileiro. O MME afirma que, entre as medidas já encaminhadas, estão a elaboração de diagnósticos técnicos sobre a natureza e a magnitude dos cortes, a proposição de soluções regulatórias e operacionais, além da priorização de obras de transmissão e da instalação de equipamentos que aumentem a confiabilidade da rede.
A Casa dos Ventos sugeriu que uma das soluções possíveis para os cortes de geração renovável (curtailment) é a exportação da eletricidade que está sendo cortada. O Brasil já tem a Exportação de Vertimento Turbinável (EVT), que nada mais é do que exportar o curtailment das hidrelétricas. No dia 5 de outubro, o Brasil chegou a cortar 18 mil megawatts (MW) de potência, o equivalente ao consumo da Argentina. Também seria interessante uma atuação para atração de demanda para o País. Como exemplo, pode-se citar o Paraguai, que também tem abundância de energia, e, em um ano atraiu 1 gigawatt (GW) de carga por meio de agentes de mineração de criptomoedas. Neste cenário, as empresas de energia deverão estar cada vez mais próximas de seus parceiros para viabilizar soluções que permitam atrair demanda de forma inteligente para integrar e gerar riqueza já que o desafio brasileiro não é de geração, pois o Mwh (megawatt-hora) eólico e solar é o mais competitivo do mundo. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.