04/Sep/2025
O Brasil alimenta cerca de 1 bilhão de pessoas em todo o planeta, mas sua infraestrutura logística ainda caminha em ritmo desigual frente ao crescimento da produção agrícola. Em 2024, o País colheu perto de 330 milhões de toneladas de grãos, consolidando sua posição como potência mundial na produção, consumo interno e exportação de soja e derivados, milho, café, além de proteínas animais, citros, celulose, açúcar. No entanto, produzir mais não basta. Sem uma logística eficiente e moderna, a competitividade do agro brasileiro corre risco de desacelerar. Hoje, a capacidade de armazenagem cobre apenas 70% da safra, e menos de 15% dos silos estão localizados dentro das fazendas.
Isso obriga produtores a venderem no pico da colheita, pressionando preços e margens. Para comparar, nos Estados Unidos esse índice supera 50%, e no Canadá chega a 80%. O resultado é direto: os custos logísticos no Brasil podem chegar a 12% do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto em países desenvolvidos não ultrapassam 8%. Além disso, a dependência do modal rodoviário continua como um dos maiores gargalos. A produção brasileira circula majoritariamente por estradas em más condições e caras, ficando sujeita a atrasos que são repassados passo a passo aos integrantes das cadeias e influenciando inclusive nos prêmios para o mercado brasileiro.
Ferrovias e hidrovias, capazes de reduzir sensivelmente os fretes avançam lentamente, deflagrando a vulnerabilidade do setor que preza pelo desempenho nos centavos. Projetos estratégicos, como a Ferrovia Norte-Sul e a integração portuária do Arco Norte, são promissores, mas precisam de fato sair do papel em escala e velocidade compatíveis com a produção que cresce ano após ano. A logística será o freio do agro brasileiro? Com a produção agrícola batendo recordes, será que a logística pode se tornar o gargalo capaz de limitar o potencial do agro nacional? Este questionamento foi seguidamente verbalizado durante recente evento sobre logística brasileira do qual fui palestrante.
Os números não deixam dúvidas:
A produção nacional depende de rodovias caras e congestionadas;
A capacidade de armazenagem cobre apenas 70% da safra;
O custo logístico pode chegar a 40% ou até 45% do preço final dos produtos.
A resposta para o questionamento, no entanto, não é definitiva. Se não houver investimentos coordenados em infraestrutura, tecnologia e integração entre governo e iniciativa privada, o risco de freio logístico é real. E, com ele, vêm margens menores, perda de competitividade e oportunidades desperdiçadas em mercados globais cada vez mais disputados. Em contrapartida, há uma agenda positiva em construção. O uso de tecnologia de rastreabilidade, sensores inteligentes, sistemas de gestão de estoques e plataformas digitais de leilão de fretes já começa a mudar a lógica logística. A digitalização traz eficiência, reduz perdas e conecta produtores a tradings, indústrias e exportadores de forma mais inteligente e previsível. Para acelerar essa transformação, alguns passos são fundamentais:
- Investimento coordenado em infraestrutura multimodal com planejamento integrado e marcos regulatórios claros, incluindo ferrovias, hidrovias, cabotagem e rodovias modernizadas. Há muito defendo amplamente sobre tornar viáveis investimentos para cabotagem como alternativa para desafogar rodovias hoje sucateadas no País. Inclusive durante o evento citado defendi este ponto em minhas considerações finais;
- Armazenagem pulverizada aproximando silos às áreas produtivas para minimizar o déficit atual e permitir uma melhor gestão comercias das famílias produtoras rurais, canais de distribuições e cooperativas colaborando com isso no equilíbrio da oferta, demanda e formação de preços;
- Digitalização da cadeia logística, com dados em tempo real, automação e inteligência artificial para prever gargalos e otimizar custos. Como exemplo dos entraves temos a desburocratização na contratação de frete por meio da implementação do documento eletrônico de frete que consolida todas as obrigações regulatórias na contratação de frete em um único documento;
- Credibilidade entre investidores internacionais a fim de garantir fluxo de crédito constante e mais acessível ao mercado.
Entre tantos desafios, o agronegócio brasileiro demonstra uma força produtiva admirável. Agora, a eficiência logística será a chave para ampliar margens, garantir sustentabilidade e consolidar o País não apenas como gigante na produção, mas também como referência mundial na entrega estratégica de alimentos, fibras e energia para um planeta que demanda cada vez mais segurança alimentar e soluções inteligentes. Fonte: Andrea Cordeiro. Broadcast Agro.