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25/Aug/2023

Entrevista: Letícia Gonçalves - presidente da ADM

Com 121 anos de atuação como uma trading de commodities agrícolas e processadora de alimentos, a ADM (Archer Daniels Midland) faturou US$ 101 bilhões em 2022. Nas últimas duas décadas, a executiva brasileira Letícia Gonçalves, presidente global de alimentos da empresa, acompanhou essa história de perto, atuando na sede da empresa nos Estados Unidos. A tradição da ADM deve ser colocada à prova nos próximos anos, quando o mundo enfrentará o desafio de alimentar mais pessoas com mais proteína, sem, no entanto, exaurir os recursos naturais.

Letícia acredita que as pessoas estão mais dispostas a consumir proteínas alternativas, e a ADM já se prepara para isso. Pesquisas da empresa concluíram que 87% dos consumidores globais têm interesse em experimentar produtos à base de plantas. Além disso, 74% querem experimentar produtos feitos com fontes híbridas de proteína, caso de alimentos que contenham proteína animal, vegetal e até de carne criada em laboratório. Um desafio, no entanto, está em tornar esses alimentos mais acessíveis para os países em desenvolvimento.

“O foco será resolver o problema de acesso a esses alimentos, com uma abordagem customizada. Existem muitas nuances regionais para a necessidade dos consumidores”, afirma a executiva. Segundo a pesquisa da ADM, 40% dos consumidores globais de plantas dizem que consumiriam mais proteínas de origem vegetal se os preços fossem semelhantes aos de origem animal. Esse número sobe para 51% no Brasil. A tendência vai permitir desenvolver um mercado global de proteínas alternativas de US$ 100 bilhões até 2030. Segue a entrevista:

Como uma empresa criada em 1902 se prepara para o futuro da alimentação?

Letícia Gonçalves: É um momento fascinante do setor de alimentos. A ADM começou com grãos, trading e merchandising dentro do agribusiness, mas evoluiu muito nos últimos dez anos, desde a aquisição da Wild Flavors (empresa de ingredientes naturais, em 2014). Agora, está focada nas necessidades para garantir a segurança alimentar no planeta. Será importante trazer comida para uma população crescente, mais preocupada com saúde e bem-estar, além da sustentabilidade. Não podemos só pensar no que é o melhor para a população em termos de alimentos, mas precisamos fazer isso de forma sustentável para o meio ambiente.

Os consumidores já entendem isso?

Letícia Gonçalves: Uma área de forte crescimento dentro da minha divisão na ADM é a de proteínas alternativas. Isso porque mais da metade do público hoje se considera “flexitariana”. As pessoas estão de olho em diversificar as fontes de proteínas que consomem. Continuam comendo carne animal, mas estão buscando outras coisas, à base de legumes e plantas, e outras culturas e tecnologias que vão vir, como fermentação de precisão e a carne de laboratório. O mundo vai precisar de mais proteína. Não só por causa do crescimento da população, mas também pela quantidade de proteína na dieta das pessoas.

Como isso vai mexer com os negócios em alimentação?

Letícia Gonçalves: A gente acredita que esse mercado de proteína alternativa vai continuar crescendo e trazer uma oportunidade, até 2030, de US$ 100 bilhões anuais. Ainda seria uma pequena parte frente ao mercado global de proteína animal, de US$ 1,5 trilhão.

Esse mercado será importante para o Brasil?

Letícia Gonçalves: Os brasileiros também estão preocupados em mudar a dieta. Nossas pesquisas apontam que 82% dos brasileiros buscam melhorar a quantidade de proteína na alimentação e 87% deles querem experimentar proteína feita à base de plantas. A gente está acompanhando isso, e mostrando como podemos atender a essa necessidade, e trazendo produtos com o conceito de proteína híbrida, que mistura carne animal, vegetal e criada em laboratório. Sabemos que 74% dos consumidores estariam interessados em comer proteínas híbridas.

Os preços mais altos dessas proteínas alternativas não são uma dificuldade?

Letícia Gonçalves: O foco será resolver o problema de acesso a esses alimentos, e com uma abordagem customizada. Existem muitas nuances regionais para a necessidade dos consumidores. Há aqueles que querem pagar por um produto melhor, e existem os que não querem, principalmente, nos países emergentes. Precisamos de produtos com preço viável. Inclusive, temos as nossas fábricas de produção de ingredientes bem regionalizadas. No Brasil mesmo, há uma em Campo Grande (MS), onde produzimos proteína. Temos também um centro de inovação em Hortolândia (SP), onde fazemos o desenvolvimento de produtos. Trabalhamos de forma muito regionalizada, para resolver os problemas locais.

A carne de laboratório vai ser uma realidade?

Letícia Gonçalves: Essas tecnologias novas começam numa escala pequena, mas trazem um potencial alto de chegar numa economia de escala. Trazemos justamente o know how de tecnologia para dar escala de produção, porque a gente tem experiência em manufatura. Ajudamos as empresas a entenderem como fazer um produto sair da fase de testes em laboratório, para virar um produto-piloto, para então chegar à escala comercial e atingir a massa crítica de mercado. É uma evolução natural. Os consumidores vão começar a testar. Nem todo mundo vai querer testar de cara, e depois o consumo vai aumentando.

Há evolução prevista para outros alimentos?

Letícia Gonçalves: Em lácteos, já existe muito leite com base vegetal, de soja, de coco, de amêndoas. Mas agora a tendência está chegando a queijos, iogurtes e cream cheese. Os laticínios alternativos também crescem muito. Outro mercado que está se ampliando bastante é o que chamamos de nutrição especializada, para o qual vamos ter produtos de base vegetal para controlar peso e para nutrição esportiva. Estamos trabalhando em todos eles.

Fonte: Broadcast Agro.