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19/Ago/2022

Frango: questões trabalhistas e de sustentabilidade

O frango é um animal de origem asiática que chegou ao Brasil durante o período da colonização da América pelos europeus, e seu consumo ganhou força no Brasil nos últimos 50 anos. Além de estar presente em 94% dos lares brasileiros, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) estima que o consumo per capita do produto atingiu 45,56 quilos por habitante ao ano. Projeções feitas pela Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam que até 2030 a humanidade passará a consumir mais aves do que qualquer outra proteína animal. À medida que o frango ganha relevância nos hábitos alimentares da população, a ave também vem despertando o apetite de diversas autoridades antitruste ao redor do mundo, estando presente em discussões que envolvem a intersecção entre o direito concorrencial, a sustentabilidade e questões trabalhistas, as quais vêm chamando, cada vez mais, a atenção na Europa e nos Estados Unidos.

Questões de sustentabilidade e trabalhistas ganham protagonismo perante agências concorrenciais. Em 2015, a Autoridade Antitruste Holandesa (Authority for Consumers and Markets - ACM) rejeitou a iniciativa que ficou conhecida como “Chicken of Tomorrow” (Frango do Futuro), a qual consistia em acordos envolvendo toda a indústria de fornecedores e varejistas de frangos para melhorar o “padrão de vida” das aves vendidas em supermercados. A Autoridade Holandesa tentou qualificar os benefícios dessas melhorias por meio de uma pesquisa com os consumidores. O estudo realizado demonstrou que os consumidores estavam dispostos a pagar um adicional de 82 centavos de euro por quilo do frango, em razão dos diversos benefícios que a iniciativa traria, principalmente relacionadas ao bem-estar animal. Contudo, ao comparar a quantia disposta pelos consumidores e os custos adicionais que tais medidas acarretariam (1,64 centavos de euro por quilo de frango), a ACM concluiu que tal iniciativa não beneficiaria os consumidores, uma vez que os custos adicionais seriam repassados integralmente, aumentando significantemente o valor do alimento.

Além disso, a ACM não conseguiu mensurar como tal medida poderia, de fato, alcançar os benefícios sustentáveis desejados. Apesar de ter sido rejeitado pela autoridade antitruste holandesa, o caso dos frangos do futuro levou as autoridades europeias a voltarem suas atenções às questões ambientais, sendo conhecido hoje por ser um dos casos norteadores do debate de sustentabilidade e concorrência na Comunidade Europeia, o que impulsionou iniciativas de outras autoridades nos anos seguintes. Outro exemplo recente envolvendo cooperações empresariais e o tema sustentabilidade e produção de frangos foi o caso lnitiative Tierwohl, analisado pela autoridade antitruste alemã (Bundeskartellamt). Trata-se de um projeto iniciado em 2014, baseado em um acordo entre os setores agrícola, de produção de carne e de varejo alimentar, que premia os criadores de suínos e de frangos pela melhora das condições de criação dos animais.

A iniciativa é financiada principalmente pelos quatro maiores varejistas de alimentos da Alemanha: EDEKA, REWE, Aldi e Grupo Schwarz. O projeto foi levado ao exame do Bundeskartellamt neste ano porque havia intenção de expandi-lo para contemplar criações de bovinos. Um componente-chave da iniciativa é pagar aos produtores de animais um prêmio (referido como “pagamento de bem-estar animal”), por meio dos matadouros participantes do projeto. O Bundeskartellamt autorizou o projeto, mas não sem fazer ressalvas. A autoridade deixou claro que o acordo entre as empresas para pagamento de um prêmio-padrão vinha sendo tolerado até hoje porque se tratava de um período inicial transitório e em função do pioneirismo do projeto. No entanto, a autoridade alemã entende que elementos de concorrência precisam ser introduzidos gradualmente. Isso pode incluir, por exemplo, indenizar os produtores pelas despesas efetivamente incorridas com bem-estar animal, no lugar de pagar um valor universal a todos os produtores.

Fato esse que tenderia a recompensar mais aqueles produtores que promoverem o bem-estar animal de maneira mais eficiente, atraindo mais vendas e gerando maior concorrência entre os produtores. Nos Estados Unidos, três das maiores processadoras de frango do país, Cargill, Sanderson Farms e Wayne Farms, acabam de firmar um acordo milionário (U$$ 85 milhões), para encerrar uma investigação de antitruste envolvendo suposto compartilhamento de informações sobre os salários de trabalhadores de tal segmento. Segundo as acusações, as empresas teriam entrado em um esquema para trocar informações sobre salários e benefícios que prejudicou uma geração de trabalhadores das fábricas. Assim como as questões de sustentabilidade, as questões trabalhistas vêm ganhando protagonismo perante as agências concorrenciais do mundo, principalmente após as recentes tentativas da autoridade norte-americana em criminalizar a conduta nos Estados Unidos. Da mesma forma, a Europa também vem testemunhando uma onda nesse sentido.

Além das novas tendências do antitruste, o frango também está inserido nos temas tradicionais. Recentemente, a autoridade antitruste da Malásia propôs a condenação de cinco empresas (Dindings Poultry Development Centre, FFM, Gold Coin Feedmills, Leong Hup Feedmill Malaysia e PK Agro-Industrial Products) por suposta conduta de fixação de preços no mercado de ração para aves, que teria ocorrido entre os anos de 2020 e 2022. Por ser a ração responsável por 73% do total dos custos da avicultura, a autoridade concluiu que aumento de seu preço impacta diretamente o consumidor final. No Brasil, apesar da corrente interpretação de que os temas da intersecção das questões antitruste com a sustentabilidade e o mercado de trabalho sejam apenas um “voo de galinha”, considerando as intensas discussões sobre o tema em fóruns internacionais que participa, sendo o País o maior exportador mundial de carne de frango do mundo, não faltarão incentivos para observar atentamente os frangos nas novas frentes do antitruste. Fonte: Valor Online. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.