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26/Out/2020

Lácteos: grandes desafios para o setor no futuro

O consumo de lácteos tem alta relação com a renda da população. Com efeito, houve forte expansão do mercado no Brasil entre 2001 e 2015, quando o consumo per capita passou de 120 Kg por habitante ao ano para 175 Kg por habitante ao ano, fruto do aumento da renda, principalmente nos estratos mais pobres. A Embrapa Gado de Leite mostrou a elasticidade-renda dos lácteos, isto é, o quanto aumenta o consumo de cada derivado, para cada 1% de aumento na renda. Ao comparar as Pesquisas de Orçamento Familiar (POF) de 2002/2003 e 2017/2018, há tendências interessantes. Nos estratos de renda mais baixos, além do efeito da renda resultar em maior aumento do consumo, nota-se que, de 2002/2003 para 2017/2018, esse efeito se intensificou, isto é, o aumento de 1% na renda gerou maior crescimento do consumo no período recente, do que no início do milênio.

No estrato superior, o aumento de 1% na renda gerou somente 0,16% de aumento no consumo dos lácteos, sendo este valor bem menor do que o valor verificado na POF 2002/2003, que era de 0,43%. Ou seja, o aumento da renda no estrato de renda mais alta praticamente não gera aumento do consumo da cesta de lácteos, caracterizando o grupo como bastante inelástico. E esse fenômeno se intensificou muito de 2002/2003 para 2017/2018. O estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) não avalia as causas, mas é possível inferir que esse estrato de renda mais alta tem acesso a mais substitutos, tem mais interesse e abertura em experimentar o novo e pode ser mais influenciado por questões cada vez mais centrais à produção animal, como a sustentabilidade e o bem-estar animal.

Também, pode ser mais suscetível a informações (equivocadas ou simplificadas demais) de que os lácteos não fazem bem à saúde. É importante lembrar que, hoje, o consumidor tem à sua disposição uma infinidade de novos produtos, de forma que os concorrentes do leite não são mais somente os refrigerantes, os sucos e os chás. A POF mostra que o grupo de alimentos denominado “Outros” (que não são lácteos, carnes, frutas e verduras, cereais, leguminosas e oleaginosas, bebidas e infusões, farinhas, féculas e massas, açúcares, aves e ovos, alimentos preparados, panificados e óleos e gorduras), foi o que mais cresceu, passando de 8,3% dos gastos para 13,7%. A área de novos alimentos recebe maciços investimentos de capital por parte de fundos e de corporações, ávidos por participar ativamente da revolução da alimentação, financiando startups que prometem reinventar os alimentos.

De fato, três categorias captaram metade do investimento em Agtechs em 2019: proteínas vegetais/substitutos de proteínas animais, cadeia de suprimentos e fazendas urbanas/verticais, nessa ordem. Existem muitas startups (ou que já passaram dessa fase) que desenvolvem substitutos dos lácteos. Isso não quer dizer que o leite e seus derivados têm necessariamente um futuro nebuloso, apesar de algumas previsões, mas sim que será o futuro em que a ampla possibilidade de escolha será a grande vencedora. Para continuar desenvolvendo o mercado lácteo à medida que a renda cresce, ao mesmo tempo em que o consumidor busca novas experiências e tem essas escolhas à sua disposição, é preciso que o setor evolua em diversas frentes, tendo uma postura bem mais proativa e focada no mercado. Isso envolve:

1) Na Produção: acessibilidade (custo competitivo), saúde humana (menor risco de resíduos de antibióticos, leite a2a2, ingredientes naturais), sustentabilidade (carbono neutro, agricultura regenerativa, gestão da água e resíduos), bem-estar animal (conforto, medição de parâmetros biológicos, pecuária 4.0, importância social (empregos, fomento à comunidade local, geração de renda na região) e comunicação (narrativa que consiga conectar consumo e produção).

2) Na Indústria: inovação em produto (novos ingredientes naturais, novas combinações de produtos, inovação aberta para acelerar a inovação); eficiência industrial e otimização de custos (indústria 4.0); novos canais (e-commerce, por exemplo); propósito e reconexão com o consumidor.

Não há dúvida que o leite e os derivados representam uma categoria com amplo potencial de reinvenção. Também é inegável que uma parcela significativa da população mundial vai continuar ascendendo economicamente e buscando proteínas animais (ao menos nos próximos anos). Mas, o cenário competitivo induz a refletir que muitas outras propostas de alimentos buscarão essa renda extra. Nesse cenário, é válida a reflexão de que aquilo que trouxe o setor até aqui, não o levará necessariamente adiante, até porque as curvas exponenciais sugerem que o que parece inacessível hoje, por ser muito caro, vai certamente ter seu custo muito reduzido no futuro. Isto é, achar que competição baseada somente em preços não é um bom pensamento em um mundo em que a tecnologia traz avanços enormes a cada dia. Fonte: MilkPoint. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.