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10/Set/2020

Leite: fim da desoneração da cesta básica preocupa

O fim da desoneração da cesta básica, previsto em uma das propostas da reforma tributária em debate no Congresso Nacional e em constante análise pelo governo federal, poderá sobrecarregar o setor produtivo e desencadear uma série de problemas econômicos e sociais no campo. Só na cadeia leiteira, a carga tributária deve aumentar em média 20% com a medida e imputar um custo extra de R$ 7,4 bilhões por ano no bolso de produtores e laticínios. É o que aponta estudo encomendado pela Associação Brasileira de Laticínios (Viva Lácteos) ao Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo (Cepea/Esalq/USP). Alguém vai ter que pagar pelo aumento dos impostos: a população ou o produtor. Uma elevação dessas é suficiente para quebrar qualquer empresa. Segundo o estudo, a cobrança dos tributos federais sobre leite e derivados vai elevar os preços nas gôndolas e tende a diminuir o consumo e o gasto das famílias brasileiras com os produtos, prejudicando os mais pobres.

Nos cálculos da Viva Lácteos, o imposto único de 25% previsto na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, em discussão na Câmara dos Deputados, vai elevar os preços do leite UHT em 16,9%, os do leite em pó em 17,5%, os do queijo muçarela em 22,5% e os dos iogurtes em 25%. Esses produtos representam 75% dos alimentos processados pela indústria de laticínios do Brasil, que teria que arcar, junto com os pecuaristas, com o aumento de R$ 7,4 bilhões por ano nos custos de produção. O impacto seria sentido diretamente pelo consumidor mais pobre, já que o gasto fixo com transporte e habitação das 50 milhões de famílias com renda per capita entre R$ 453,00 e R$ 1.200,00 é de cerca de 70%, despesa difícil de eliminar ou reduzir. Eles não vão ter capacidade de suportar o aumento da carga tributária sobre os alimentos. Com poder aquisitivo menor, o valor usado para a compra de leite UHT cairia 5%. Já o consumo de queijo muçarela, por exemplo, recuaria 11%.

O fim da desoneração foi retirado na última hora do projeto de lei governo que cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) de 12%, mas a medida ainda faz parte dos planos da equipe econômica. A proposta encaminhada recentemente ao Congresso mantém a isenção da cesta básica, mas prevê o estorno de créditos tributários, calculados em R$ 2,2 bilhões sobre leites e derivados, que teriam que ser absorvidos na cadeia produtiva, ainda nas contas da Viva Lácteos. A desoneração em vigor inclui produtos como arroz, feijão, leite, pão, legumes, carnes, café, açúcar, óleo de soja, entre outros, e custou ao governo R$ 18 bilhões em 2019, 5% de todos os subsídios tributários concedidos pela União. Um dos objetivos em estudo é usar parte do dinheiro que passará a ser arrecadado, caso o tema avance e seja sancionado, para aumentar o valor do benefício do Bolsa Família em R$ 25,00 ou para outra forma de restituição aos mais pobres.

O argumento é rebatido pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Estão misturando política tributária com social. É um caminho perigoso e uma porta que se abre para aumentar a tributação. O setor concorda com as diretrizes de simplificação da reforma tributária, mas teme que os produtores tenham que pagar a conta de medidas como essas. O possível incremento no Bolsa Família beneficiaria 14 milhões de famílias, contingente abrangido pelo programa atualmente, mas parcela significativa da população vulnerável teria aumento de custo com alimentação. A medida prejudica 53% das famílias de baixa renda, que pagarão muito mais pelos alimentos. Cerca de 10% do valor adicional dos R$ 25,00 no benefício social teria que ser gasto para bancar a elevação de preços apenas do leite e do queijo para a preservação do consumo atual. Não há simplificação em fazer a população mais carente pagar mais caro pelo alimento para depois receber o valor referente ao impacto gerado no preço do produto.

O setor também reclama que o fim da desoneração vai diminuir a competitividade dos produtos brasileiros frente aos importados e prejudicar a relação após a ratificação do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia. É um grande aumento de competitividade para os concorrentes do Brasil, para abastecer o mercado brasileiro de produto importado. A CNA espera que a desoneração seja mantida ou que as propostas sejam modificadas para estabelecer uma alíquota diferenciada que não prejudique os produtores e eleve o preço da comida. A Constituição prevê direito à alimentação e permite a tributação diferenciada e o tratamento adequado ao alimento justamente para garantir comida na mesa dos menos favorecidos. O relator da PEC 45, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), mostra alinhamento com o setor produtivo e procura o melhor formato para acomodar a demanda no texto, que pretende concluir até o fim do mês.

Ele não garantiu a desoneração completa, mas afirmou que é preciso corrigir algumas distorções. Uma delas é a presença de produtos mais “nobres” na cesta básica, como salmão, e a ausência de alimentos fundamentais, como o ovo. Talvez seja necessário tratar especificamente alguns produtos. A preocupação da política é fazer com que a desoneração chegue a quem precisa. A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) defendeu a desoneração completa da alimentação humana e animal e da folha de pagamento das empresas, medida vetada recentemente pelo governo. Do contrário, haverá impacto na mesa do consumidor e nas exportações. O setor quer um tributo neutro que não venha a fazer diferença e dê competitividade às empresas nacionais. Se não desonerar a cesta básica pode ter diminuição grande de consumo e se voltar a reonerar a folha, esse imposto estará no preço dos produtos de exportação. Fonte: Valor Econômico. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.