11/Fev/2020
Os argentinos, que por muito tempo estiveram entre os consumidores de carne mais vorazes do mundo, não podem mais se dar ao luxo de comer o próprio produto. O consumo de carne bovina no país caiu para o menor nível em um século. Entre os culpados estão a inflação nas alturas, o apetite insaciável por carne bovina em outras partes do mundo, o que pressiona os preços no mercado doméstico e, em menor grau, uma tendência ainda relutante em direção a proteínas mais saudáveis e baratas. É um soco no estômago para um país que tradicionalmente disputa com o vizinho Uruguai o título de maior carnívoro do mundo em uma base per capita. O novo presidente da Argentina, Alberto Fernández – que já tem muito trabalho com a reestruturação da dívida e uma economia que precisa decolar -, conhece os riscos políticos.
Fernández quer aumentar o controle de preços nos supermercados para tornar a carne acessível novamente. Se a história servir de guia, as medidas de intervenção também podem corroer os lucros da pecuária com o sexto maior rebanho do mundo, levando agricultores a reduzirem e limitarem a oferta da famosa alcatra e cortes de costela da Argentina enquanto a demanda global atinge níveis recordes. O controle de preços faz parte do manual do partido peronista de Fernández. A carne bovina se tornou um elemento polêmico de uma estratégia econômica focada no consumidor quando Fernández era chefe de gabinete do falecido ex-presidente Néstor Kirchner. Em 2006, Kirchner suspendeu temporariamente todas as exportações de carne bovina para manter os preços domésticos sob controle.
Nos 12 anos em que Kirchner e sua viúva, Cristina Kirchner, estavam no poder, o consumo doméstico de carne bovina foi alimentado por vetos periódicos de exportação e controle de preços. Mas essas medidas foram contraproducentes quando pecuaristas dos Pampas deixaram o negócio. O rebanho bovino diminuiu, assim como a oferta. A desregulamentação sob o antecessor de Fernández, Mauricio Macri, ajudou a indústria a aumentar os embarques e os rebanhos se recuperaram. Embora o novo presidente não tenha abordado especificamente medidas relacionadas à carne bovina, Fernández recentemente aumentou as tarifas de exportação de todas as commodities argentinas. Em janeiro, o presidente argentino relançou um programa de congelamento de preços de 310 itens básicos, incluindo alguns produtos de carne bovina.
Agora, o governo discute a possibilidade aumentar o controle sobre a carne bovina com a inclusão de mais cortes com limite de preços nos supermercados. Os controles de preços fazem parte de uma estratégia para garantir o fornecimento a todos os setores da população. No ano passado, os argentinos consumiram, em média, 51 Kg de carne bovina, o nível mais baixo desde 1920, segundo dados da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes e Derivados da República Argentina (CICCRA). A preocupação com a saúde é apenas uma das razões do declínio. Restaurantes vegetarianos surgiram em bairros chiques de Buenos Aires e até a famosa churrascaria Don Julio agora oferece opções sem carne. Mas, para muitos, é mais uma questão de poder de compra. Não se trata de comer menos carne vermelha. É um problema de perda de poder aquisitivo. Fonte: Exame. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.