08/Jan/2025
Após a gripe aviária atingir as fazendas de laticínios dos Estados Unidos, ela vem se espalhando em alta velocidade. Desde março, o vírus infectou mais de 850 rebanhos em 16 Estados. Também infectou pelo menos 60 pessoas, quase todas elas trabalhadores rurais. Nos últimos meses, os casos em vacas e humanos aumentaram especialmente rápido na Califórnia, agora o epicentro do surto. Inicialmente, os especialistas temiam que o vírus pudesse estar se espalhando através de pequenas gotículas no ar que as vacas exalavam. Mas, os dados sugerem fortemente que o vírus, conhecido como H5N1, se espalhou principalmente através do leite. Ele se replica rapidamente nas tetas das vacas infectadas, que produzem leite com níveis altíssimos do patógeno. Gotículas de leite podem espirrar nos rostos dos trabalhadores de laticínios, enquanto equipamentos e veículos salpicados de leite podem transportar o vírus de uma vaca para outra. Embora a pasteurização inative efetivamente o vírus, o patógeno foi recentemente detectado em amostras de leite cru no varejo na Califórnia.
O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) anunciou este mês que começaria a testar o suprimento de leite do país para ajudar a conter o surto. Os especialistas estão preocupados com a crescente ameaça à saúde pública e a potencial ascensão de Robert F. Kennedy Jr. para liderar o Departamento de Saúde e Serviços Humanos. Kennedy é um defensor vocal e autoproclamado consumidor de leite cru e diz que quer que os pesquisadores federais façam uma "pausa" no estudo de doenças infecciosas. Em teoria, um vírus que se espalha através do leite deveria ser mais fácil de controlar do que um que flutua invisivelmente no ar. Mas, um olhar dentro da indústria moderna de laticínios revela que a transmissão pelo leite é profundamente preocupante. Os Estados Unidos têm mais de 9 milhões de vacas leiteiras, que produzem cerca de 600 milhões de libras de leite por dia. Nas últimas décadas, a consolidação transformou a indústria; o número de fazendas de laticínios despencou, mas seu tamanho aumentou.
Em 1997, menos de 18% das vacas leiteiras do país viviam em fazendas com 1.000 ou mais animais; em 2022, 65% delas viviam. Essas vastas operações de ordenha são projetadas para extrair o máximo de leite de cada vaca duas ou três vezes por dia. Um vírus que entra no leite de uma única vaca pode rapidamente encontrar seu caminho para muitas outras, ou para a força de trabalho da indústria de laticínios, em grande parte composta por imigrantes. À medida que os riscos se acumulam, há um olhar sobre como a ordenha é feita em uma grande fazenda de laticínios. A fazenda não teve nenhum caso conhecido de gripe aviária, mas o processo revela por que um vírus que se espalha através do leite é tão difícil de parar. O governador da Califórnia declarou estado de emergência para lidar com a gripe aviária no gado leiteiro, intensificando o monitoramento, os esforços de quarentena e a distribuição de recursos. Autoridades estaduais de saúde relataram que casos de H5N1 foram encontrados em 641 fazendas leiteiras. O primeiro caso confirmado no estado ocorreu no início de agosto, mas aproximadamente metade das fazendas foram identificadas no último mês.
Até o momento, nenhuma transmissão de H5N1 de pessoa para pessoa foi relatada na Califórnia, e quase todos os indivíduos infectados tiveram exposição direta ao gado infectado. A fazenda Heeg Brothers Dairy, em Colby, Wisconsin, abriga cerca de 1.730 vacas. A sala de ordenha principal tem 28 baias em duas filas paralelas. Ela atende 1.050 vacas, cada uma das quais é ordenhada três vezes ao dia. Os funcionários começam extraindo manualmente uma pequena quantidade de leite de cada teta. Esse passo estimula o fluxo de leite, ajuda a eliminar bactérias e permite que os trabalhadores examinem o leite em busca de quaisquer anormalidades potenciais, como grumos. Em seguida, mergulham cada teta em um desinfetante. Esta precaução precede há muito tempo a chegada da gripe aviária; ela ajuda a prevenir que quaisquer bactérias que possam estar no úbere de uma vaca se espalhem para o suprimento de leite ou para outras vacas que serão ordenhadas pela mesma máquina. Depois, os trabalhadores secam as tetas e conectam um conjunto de quatro copos de teteiras revestidos de borracha e aço inoxidável, que extraem o leite.
Medidores de leite monitoram o fluxo do leite, que viaja através de mangueiras e tubulações até o tanque de leite, onde o líquido é rapidamente resfriado e bombeado diretamente para caminhões de entrega. Quando o fluxo de leite diminui, a teteira se desliga automaticamente, e os copos balançam pelo ar, às vezes pulverizando gotículas de leite. Em uma fazenda com vacas infectadas, a equipe, que geralmente está posicionada abaixo das vacas, podem ser infectados se o leite contaminado pelo vírus entrar em seus olhos ou mucosas. O vírus também poderia se espalhar, para humanos ou outras vacas, através de pequenas gotículas de leite no ar. As teteiras não são limpas entre as vacas, e gotículas de leite remanescentes podem permanecer nos copos quando são conectados às vacas seguintes na fila. Se houver algum vírus no leite, ele pode permanecer infeccioso dentro do revestimento de borracha por várias horas. Isso significa que, quando a máquina de ordenha é conectada à próxima vaca na fila, o vírus pode viajar para as tetas dessa vaca.
Durante a ordenha, a extremidade da teta está aberta, potencialmente até relaxada, segundo a Universidade de Vermont. Leva sete horas para a fazenda ordenhar todas as 1.050 vacas. Depois, os trabalhadores passam 1 hora limpando, o que inclui lavar o equipamento de ordenha com detergente e água quente. Após isso, o próximo turno de 8 horas começa, e todas as vacas são ordenhadas novamente. Alguns tipos de salas de ordenha podem reduzir os riscos. Isso inclui salas robóticas, onde as vacas foram treinadas para se aproximar das máquinas de ordenha automatizadas por conta própria. A tecnologia tem sido lenta para decolar nos Estados Unidos, mas está se tornando cada vez mais popular. Em dezembro/2024, a Heeg Brothers Dairy abriu seu próprio barracão de ordenha robótica, que abriga cerca de 450 vacas e 8 robôs. Para alcançar sua alimentação, as vacas passam por um "portão de triagem" automatizado, que escaneia uma etiqueta de identificação por radiofrequência, ou RFID, implantada na orelha de cada vaca.
Se uma vaca foi ordenhada recentemente, o portão se abre para a área de alimentação. Mas se ela está na hora de ser ordenhada, o portão desvia a vaca para o que é conhecido como curral de compromisso. O barracão tem dois desses currais, cada um equipado com quatro estações de ordenha robótica. As vacas podem permanecer no curral o tempo que quiserem, mas quando se aproximam de uma estação, um grande braço robótico, equipado com uma câmera e sensores, realiza as mesmas tarefas que os funcionários fariam manualmente: extrair um pouco de leite de cada teta, desinfetar as tetas e conectar a ordenhadeira. Quando a ordenha é concluída, as teteiras se soltam e a vaca segue seu caminho. Para os produtores, a grande vantagem dos sistemas robóticos é econômica, reduzindo a necessidade de mão-de-obra. Heeg afirma que também foi atraído pela abordagem robótica porque parecia menos estressante para as vacas, que são ordenhadas mais em seus próprios ritmos. As salas robóticas também significam que os funcionários não precisam ficar ao lado dos úberes das vacas o dia todo, reduzindo as oportunidades de transmissão da gripe aviária de vaca para humano.
Além disso, esses robôs são programados para se enxaguarem com uma solução suave de iodo entre cada vaca, o que deve reduzir a propagação de patógenos. Algumas, mas não todas, salas de ordenha convencionais têm esse mesmo tipo de sistema de "retrofluxo". E como diferentes grupos de vacas têm seus próprios robôs dedicados, há também menos vacas compartilhando o mesmo equipamento de ordenha. As salas robóticas não estão isentas de riscos. Sistemas automatizados podem quebrar e ainda são necessárias pessoas para uma variedade de tarefas de limpeza e cuidado. E em ambos os tipos de salas, o leite pode encontrar seu caminho para o ar e o ambiente. Até agora, o vírus não foi confirmado em nenhuma fazenda de laticínios em Wisconsin, e os fazendeiros enfrentam muitos outros estressores, incluindo clima extremo e preços imprevisíveis. Para muitos produtores de leite, a gripe aviária é apenas mais um item na longa lista de coisas que poderiam dificultar ganhar a vida. Mas, a percepção é que esse problema está por vir. Fonte: Folha de São Paulo e Dairy Herd Manager. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.