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19/Set/2019

Boi: estudo relaciona carne com o desmatamento

A demanda nacional e mundial por carne brasileira levou ao desmatamento de até 5.800 Km² (cerca de 3,8 cidades de São Paulo) por ano, entre 2015 e 2017, na Amazônia. E cerca de 13% a 14% disso foi ligado às exportações para locais como Hong Kong, China e Rússia. É o que mostra uma análise do risco de desmatamento provocado pela exportação de carne conduzido com base no mapeamento da cadeia de suprimento. O trabalho, feito pela plataforma Trase - um projeto dos institutos de pesquisa Global Canopy e Stockholm Environment, considera o caminho desde que o bovino é criado até o alimento chegar ao consumidor final. O Stockholm Environment Institute faz estudos sobre mudanças climáticas e uso da terra com objetivo de ajudar em políticas públicas. O Global Canopy é mais focado em florestas tropicais e nas cadeias de suprimentos dos alimentos que acabam sendo produzidos após o desmatamento.

A ideia é analisar quem está na ponta, consumindo os produtos gerados com a perda de vegetação. A Trase é uma ferramenta de transparência focada em avaliar o risco para a floresta das cadeias de suprimento. Essa mesma análise já tinha sido feita no ano passado para a soja. O trabalho fez a ligação entre os cerca de 3 mil municípios onde o gado é criado no Brasil e por onde as pastagens estão se expandindo com mais de 200 empresas que exportam carne, gado vivo e miúdos (como fígado). Do outro lado, estão cerca de 3 mil companhias que importam esses produtos para 150 países. Segundo a Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, fazendo o link entre onde o gado é criado com onde é comprado, foram identificados entre 650 Km² e 750 Km² de risco de desmatamento por ano. Isso somente para a exportação, não para o mercado doméstico. O Brasil exporta cerca de 19% a 20% de sua carne, e isso está ligado a cerca de 13% a 14% de todo o desmatamento relacionado à produção de gado. A maior parte é ligada ao consumo local.

O mercado doméstico compra cerca de 80% da carne produzida no País e está ligado a algo entre 85% e 86% do desmatamento associado à produção de gado. Hong Kong é o maior importador (23%), seguido pela China continental (15%). O Egito responde por 10,6% do mercado externo de carne brasileira, a Rússia por 10,1% e o Irã por 9,1%. O trabalho revela que as vendas para Hong Kong estiveram ligadas a 27% do risco de desmatamento associado às exportações, com sua cadeia de suprimentos associada a cerca de 180 Km² de floresta desmatada. O risco de desmatamento para Hong Kong foi maior que para a China continental, porque Hong Kong obtém mais carne bovina da Região Amazônica, de acordo com a análise. A China compra mais de fornecedores de estados como São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. A Rússia, que foi o quarto maior importador de carne brasileira em 2017, ficou com o terceiro maior risco de desmatamento, associado a uma perda de cerca de 100 Km² de floresta.

Atualmente, a União Europeia compra gado de várias regiões, com maiores quantidades provenientes dos Pampas, na Região Sul do País, do sul do Cerrado e ao redor da zona de transição Amazônia-Cerrado. Entre 2015 e 2017, as importações de carne bovina da União Europeia foram vinculadas a um de risco de desmatamento por ano de algo entre 29 e 36 Km². A ideia do estudo foi mapear de onde vem a carne que esses países estão comprando (de quais biomas e Estados), mas também quem está vendendo o produto. A análise mostra que cerca de 2/3 das exportações são feitas por três companhias: JBS, Marfrig e Minerva. Considerando suas companhias subsidiárias, elas podem responder por quase 80% das exportações de carne do Brasil. Maior empresa de frigoríficos do mundo, a JBS, responsável por exportar 29% da carne que vai para o exterior, segundo o estudo esteve ligada a 36% de toda a perda florestal ligada às exportações de carne bovina entre 2015 e 2017 (240 Km²).

A Minerva, responsável por 15,8% das exportações esteve associada com 15,5% do desmatamento (102 Km²). A Marfrig, que viu sua fatia das exportações crescer de 12% para 15% entre 2015 e 2017, também teve um aumento de associação ao risco de desmatamento de 10% a 15%. O dado contrasta com o fato de que as três empresas assinaram um acordo em 2009, que envolveu também o Ministério Público Federal e produtores de gado da Amazônia, por um compromisso com o desmatamento zero. A ideia era mapear os fornecedores para que os frigoríficos não comprassem carne proveniente de gado criado em área desmatada. A Marfrig afirmou que é um equívoco concluir, a partir dos dados da Trase, que há vínculo entre o gado comprado pela Marfrig e o desmatamento na Região Amazônica. A empresa informou que desenvolveu e implementou uma plataforma de geomonitoramento que é auditada pela companhia norueguesa DNV.GL e que, com ela, mitiga substancialmente o risco de aquisição de bovinos provenientes de desmatamentos, usando, desde 2009, o critério de desmatamento zero para o bioma Amazônia.

Além disso, a companhia assegura que não havia situação de desmatamento nas fazendas fornecedoras de gado, nas respectivas datas de compra. A Minerva informou que um relatório divulgado em julho pela auditoria externa Grant Thornton atestou que a empresa cumpre 100% o Compromisso Público de Pecuária Sustentável, firmado em 2009, para garantir as práticas aplicadas no combate ao desmatamento da Floresta Amazônica, ao uso de mão de obra análoga à escrava, como também respeito às terras indígenas e áreas de conservação na região da Amazônia. Afirmou ainda que o estudo da Trase não afirma que a Minerva Foods adquire suprimentos produzidos nessas áreas de risco. A JBS afirmou mantém compromisso de combater, desencorajar e eliminar o desmatamento na Amazônia e que tem uma política de desmatamento zero na região. É proibida a entrada de gado de fazendas com desmatamento na cadeia de fornecimento da empresa.

A JBS destacou que seu sistema de monitoramento no bioma Amazônia abrange mais de 450 mil Km², praticamente a área do território da Alemanha. O sistema e toda a compra de gado da JBS na Região Amazônica são auditados de forma independente pela DNV GL, empresa global de auditoria e certificação de socioambiental com sede na Noruega. A auditoria mais recente, em 2018, confirmou que 100% das compras de gado da JBS estavam em conformidade com as políticas de compra responsável da empresa. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) afirmou que repudia qualquer prática que possa incorrer no desmatamento ilegal ou em queimadas no território nacional e, em especial, na Amazônia. Práticas contrárias à legislação ou que infringem o compromisso do setor em promover a pecuária sustentável não refletem o modelo de produção preconizado pela entidade, que congrega 31 empresas responsáveis por 92% das exportações brasileiras de carne bovina.

Historicamente, a abertura de novas áreas para a colocação de pasto foi e ainda é o principal motor do desmatamento da Amazônia e o acordo de 2009 foi uma política importante para ajudar a conter isso. O estudo da Trase aponta, porém, que há brechas nesse processo. Em geral, apontam os pesquisadores, as empresas conseguem controlar seus fornecedores diretos, aqueles que vendem para elas a carne, mas a cadeia é bem mais complexa. Há fazendas onde os bovinos nascem, outras onde eles engordam, para só depois serem vendidas para o abate. É nesse caminho que pode estar o problema. Sendo assim, o acordo foi implementado parcialmente. As companhias só monitoram seus fornecedores diretos, os fazendeiros que venderam para elas o gado, mas não de quem esse fazendeiro comprou os bovinos. Monitorar o fornecedor direto é apenas uma pequena parte do problema.

Desse modo, o sistema completo de monitoramento acaba não sendo implementado. Isso acaba gerando um “ponto cego”. O trabalho considerou o risco de desmatamento duas maneiras: foram analisados os dados de movimentação animal, incluindo os fornecedores indiretos; e foram mapeados os municípios de onde as empresas compram e quanto. Isso permite medir o desmatamento acontecendo nos locais de onde as empresas estão comprando, em vez de só avaliar a pessoa de quem elas compram diretamente. Isso acaba incluindo o desmatamento que ocorre no entorno de suas plantas, nos locais onde compram gado e onde todos os fornecedores indiretos estão. Fonte: Agência Estado. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.