06/Nov/2024
O setor leiteiro está constantemente se moldando conforme a realidade da produção. Com o recente lançamento da pesquisa Quem Produz o Leite Brasileiro, uma iniciativa da MilkPoint Ventures para acompanhar de perto esses movimentos, os dados atualizados revelam novos insights. A pesquisa foi ampliada em 2024, com a inclusão de 29 novas empresas, além das 36 que já haviam participado no ano anterior. A comparação entre os grupos destaca um contraste na escala média dos produtores: as empresas que participaram anteriormente mantêm uma média de produção de 428 litros/dia por produtor, enquanto as novas empresas apresentam um valor de 325 litros/dia. Essa diferença na escala média de produção sugere que as novas empresas possuem, em média, produtores de menor porte. Com o novo perfil de participantes, a pesquisa deste ano ampliou a base de dados e trouxe uma visão mais precisa e realista da cadeia produtiva.
Ao incorporar uma quantidade maior de pequenos produtores, reflete-se uma parcela importante do setor, composta por produtores com desafios e realidades distintas daqueles que produzem um volume maior. A pesquisa também expandiu sua cobertura regional, captando com maior precisão variações locais. Na Região Sul, a amostra aumentou 131%, enquanto na Região Sudeste houve um salto de 362% em relação a 2023. Essa expansão geográfica permite detectar as particularidades regionais e compreender como fatores como clima e sistemas de produção afetam cada contexto de maneira distinta. Outro destaque da pesquisa é o aumento no uso de sistemas estabulados, como Compost Barn, Free Stall e Confinamento Total, que em 2024 representam 42% do leite produzido (dados de 22 empresas que fornecem essas informações desde 2022) e aproximadamente 8% dos produtores. Esses sistemas trouxeram vantagens claras para a produção leiteira em 2024, como a redução da sazonalidade, permitindo que os produtores mantenham uma produção mais constante e independente das condições climáticas.
Apesar do alto investimento inicial, esses sistemas proporcionam um controle preciso da nutrição e da saúde dos animais, que podem ser monitorados de perto, melhorando a produtividade e a qualidade do leite. Com isso, ao aumentar também o volume produzido, os confinamentos permitem aos produtores acessarem bonificações por volume, o que atrai mais investimentos, especialmente em um setor cada vez mais competitivo. No entanto, esses sistemas demandam maiores custos operacionais e cuidados específicos com nutrição e problemas de saúde animal, como mastite e claudicação. Mesmo com esses desafios, a adesão crescente a esses modelos destaca seu potencial de melhorar a eficiência produtiva e a qualidade do leite no Brasil. A pesquisa deste ano traz outros indicadores inéditos para os resultados de 2024. Contando com 56.628 produtores e uma média de 413 litros/dia, as empresas amostradas captam 23,4 milhões de litros/dia.
Apesar da média de 2023 ser maior (437 litros/dia), há uma explicação para esta queda: com mais laticínios e cooperativas regionais, a amostra de pequenos produtores também cresceu, o que certamente impacta o volume por produtor, que fica menor. Com estes resultados, a pesquisa Quem Produz o Leite Brasileiro, fica em linha com o Ranking Abraleite de 2023, responsável por mapear os 14 maiores laticínios. Se comparar com as empresas que participaram das três pesquisas (15), há um crescimento de 9% entre 2023 e 2024 no tamanho médio do produtor (1.012 para 1.104 litros/produtor/dia). Em relação à pesquisa de 2013, a alta é de 89%, o que mostra que o setor segue com um crescimento em comparação aos anos anteriores. 58,9% dos produtores se encontram no estrato de 0-200 litros/dia, ainda assim, esta parcela é responsável por apenas 12,3% do volume de leite entregue. Em contrapartida, o estrato superior a 5.000 litros/dia representa 1% do total de produtores e entrega 26,2% do volume de leite da amostra.
Essa distinção vem se tornando mais evidente com o passar dos anos: cresce o volume entregue pelos grandes produtores e cai a participação dos menores. Embora os dois extremos apresentem números impactantes, mais de 60% do volume é atribuído aos 40,3% de produtores que produzem de 200 a 5.000 litros/dia. Ou seja, a maior parte da produção provém dos estratos intermediários, os produtores médios. Para analisar a evolução da estratificação, foram utilizados os dados das mesmas empresas em 2023 e 2024, garantindo que não houvesse influência de novos participantes. O único estrato que ganhou relevância foi o de 201-1.000 litros/dia, sugerindo que parte dos produtores intermediários está ganhando espaço. Ao olhar para a evolução de volume, observa-se que o único estrato que ganhou relevância foi o estrato maior (>5.000 L/dia), mantendo o mesmo share em relação ao número de produtores (1%). Ou seja, estes produtores seguem crescendo seu volume de produção.
Outro impacto estrutural significativo na cadeia do leite é a redução contínua no número de produtores. Para entender melhor essa dinâmica, foi comparada a evolução do volume de captação e do número de produtores nas 36 empresas que participaram da pesquisa tanto em 2023 quanto em 2024. Os resultados mostraram um aumento de 1% na captação de leite dessas empresas, enquanto o número de produtores diminuiu em -1,2%. Vale destacar que, ao analisar os dados individualmente, algumas empresas em processo de expansão conseguiram aumentar sua base de captação de produtores. Ainda que esses produtores não sejam necessariamente “novos” e provavelmente já fornecessem leite para outros laticínios, essa expansão pode mascarar uma queda ainda mais acentuada no número total de produtores. Ao observar os dados das 15 empresas que participaram das três pesquisas, identifica-se uma queda mais acentuada no número de produtores, de -14% de 2023 para 2024.
Essas mesmas empresas também registraram uma diminuição na captação de leite, com queda de -7% no volume captado de 2023 para 2024. Obviamente, com um menor volume de captação, há a diminuição do número de produtores da base das empresas, o que não significa necessariamente que todos estes produtores saíram da atividade, muitos destes devem ter passado a fornecer para outros laticínios. É possível avaliar os diferentes sistemas de produção em que os produtores estão aderidos. Nos resultados de 2024, onde 29 novas empresas participaram do levantamento, observa-se um aumento no percentual de produtores e de volume em sistemas confinados, mesmo que a amostra atual tenha um perfil de empresas menor. Ou seja, mesmo agregando mais empresas, sendo estas com produtores de volume menor, os sistemas estabulados seguem crescendo. Desde 2019, é monitorada a atividade de 3 empresas e se observa o movimento de adesão aos sistemas estabulados em relação a captação total dessas empresas.
Em 2024, 10% dos produtores que fornecem leite para essas empresas adotam o sistema estabulado e são responsáveis por mais de 50% do leite captado. O crescimento do sistema estabulado ano a ano é impressionante, principalmente no volume, já que de 2023 para 2024 o número de produtores estabulados aumentou 25% (de 8% para 10% no share) e 26% no volume (de 42% para 53% no share)! Isto significa que, além dos produtores estarem migrando para estes sistemas, a produção dos que já estão também está crescendo. O aumento da produtividade e da produção pautado na facilidade de controle alimentar e monitoramento, controle sanitário mais eficiente, níveis mais altos de bem-estar animal são pontos excelentes que justificam estes crescimentos. Pensando em trazer uma amostra maior, desde 2022 quinze empresas mantiveram a constância no fornecimento de dados. O movimento observado é o mesmo: cresce a percentagem de produtores estabulados, assim como a percentagem de volume ligada a esses sistemas.
Nesta amostra, 8% dos produtores estão estabulados, com 42% da captação das empresas. Além disso, as empresas também aumentaram sua captação no período. A qualidade e composição do leite são essenciais para garantir a segurança alimentar e a competitividade do leite no mercado, tanto internacional quanto doméstico. Indicadores como contagem bacteriana total (CBT) e de células somáticas (CCS) refletem a eficiência de processos como a ordenha, o manejo, o armazenamento do leite e a saúde do rebanho. Além disso, os teores de sólidos, como gordura e proteína, são determinantes para o processamento industrial e agregam valor nutritivo ao leite. Em relação aos sólidos no leite, a média de gordura entre as empresas consultadas foi de 3,72%, e a de proteína, de 3,25%, uma variação praticamente nula em relação a 2023, mesmo agregando novas empresas. Comparando com países referência na produção de leite, como os Estados Unidos (4,12% de gordura e 3,26% de proteína em 2023) e a Nova Zelândia (4,90% de gordura e 3,94% de proteína), o Brasil ainda tem grande potencial de evolução.
Esses fatores são essenciais para a competitividade internacional e a qualidade dos derivados lácteos, que dependem dos teores de sólidos e da qualidade do leite. Melhorias em seleção genética, manejo, ordenha e instalações são fundamentais para alcançar padrões globais. A indústria também tem um papel importante, com políticas de bonificação por qualidade, maior rigor na captação e treinamentos para apoiar o aumento dos sólidos e a melhoria geral da qualidade, fortalecendo a competitividade do Brasil. A pesquisa de 2024 reforça a continuidade da transformação no setor leiteiro brasileiro, que reflete tanto mudanças recentes quanto um processo em curso ao longo das últimas décadas. As transformações conjunturais e estruturais, como a crescente tecnificação, maior uso de sistemas intensivos e o aumento das exigências de qualidade, seguem impactando o setor.
O cenário econômico mais volátil, com custos elevados e maior volume de importações, acelerou essas mudanças. A pesquisa aponta para uma polarização na produção, com grandes produtores expandindo sua participação e pequenos e médios enfrentando maiores desafios para manter sua competitividade. Ainda assim, a maior parte do volume de leite provém de produtores médios, o que indica uma diversidade produtiva que persiste apesar da concentração. As cooperativas mantêm um papel relevante, contribuindo para o desenvolvimento e a maior eficiência de seus associados, entretanto todas estas conclusões exigem estudos mais aprofundados. Em termos de políticas públicas, há uma clara necessidade de enfoques diferenciados: pequenos produtores precisam de maior apoio em crédito, assistência técnica e acesso ao mercado, enquanto os grandes podem se beneficiar de incentivos que estimulem a expansão eficiente e sustentável. Fonte: MilkPoint. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.