01/Jul/2024
A fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em defesa da isenção de impostos para o frango aumentou a pressão do setor produtivo e de parlamentares pela ampliação da cesta básica com imposto zero, criada pela reforma tributária. A inclusão das carnes, no entanto, elevaria a alíquota de referência do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA). A inserção das proteínas animais na lista com tributação zero é uma demanda do setor de alimentos e supermercados que foi acolhida pela bancada ruralista no Congresso. Os deputados que lideram a regulamentação da reforma tributária tendem a acrescentar não apenas o frango, mas todos os tipos de carnes, como bovina e pescados. O projeto de lei complementar enviado pela equipe econômica ao Congresso não prevê nenhuma proteína animal na cesta básica com alíquota zero.
As carnes ficaram na tributação 60% inferior à alíquota padrão, com exceção de itens considerados de luxo, como foie gras, salmão, ovas e bacalhau. Esses produtos estão no IVA cheio, estimado em 26,5%. Se as carnes de frango fossem incluídas na cesta básica zero, a alíquota média do novo IVA subiria de 26,5% para 26,7%. É o que aponta a ferramenta do Banco Mundial que calcula os impactos da ampliação dos produtos com taxação zerada ou reduzida nos demais itens e serviços consumidos pela população. Trata-se de um aumento menor do que o provocado por uma eventual inserção das carnes bovinas, as quais, sozinhas, elevariam o IVA médio para 26,9%. No caso de todas as carnes incluídas na alíquota reduzida ou cheia serem transferidas para a cesta básica, isso levaria o IVA a 27,1%, segundo a plataforma, batizada de SimVat.
A fala do presidente Lula serviu de combustível para os discursos usados pela indústria para a inclusão desses itens na cesta básica zerada. Um vídeo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na campanha ao governo de São Paulo, em 2022, também tem circulado entre políticos e representantes do setor. Nele, Haddad promete zerar o ICMS do Estado sobre as carnes. Na Câmara, deputados do grupo de trabalho criado para elaborar o primeiro relatório de regulamentação da reforma tributária afirmam que, politicamente, será difícil para o governo barrar as proteínas animais na cesta básica. Eles usam como exemplo a promessa do presidente, feita ainda na campanha eleitoral, sobre a volta da picanha ao cardápio do brasileiro. O Banco Mundial também avalia os impactos distributivos de eventuais mudanças na regulamentação da reforma tributária.
Nesse sentido, as aves e suas miudezas figuram como as proteínas mais consumidas pela população pobre do País. Segundo a ferramenta, os 40% mais pobres concentram mais de um terço do consumo das aves (em Reais gastos), enquanto os 10% mais ricos consomem 13,9%. Os peixes (exceto salmonídeos, atuns, bacalhaus, hadoque, saithe, ovas e outros subprodutos) aparecem na sequência, com 32,3% do gasto concentrado nos mais carentes, e 17,5% nos mais ricos. No caso dos bovinos, a calculadora aponta que o desembolso não está tão concentrado nos mais vulneráveis: os 40% mais carentes do País consomem quase o mesmo percentual (23,9%) que os 10% mais ricos (18,9%). A previsão é de que o relatório seja apresentado nesta semana e votado, no plenário da Câmara, antes do recesso parlamentar, em 17 de julho.
Há uma série de pleitos para a inclusão de itens na cesta básica, para além de frango, peixe e carne bovina. Há pedidos, por exemplo, para a inserção de bacon, salsicha, sal e bolachas. Todas as demandas serão analisadas nos próximos dias, juntamente com os técnicos do Congresso, bem como os efeitos na alíquota padrão da nova tributação. A intenção é que a alíquota não saia de 26,5% (média atual). Se não tiver repercussão na alíquota ou for possível compensar em outro lugar, o pleito das proteínas será atendido. Não há decisão tomada. Os deputados afirmam que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), concedeu autonomia ao grupo de trabalho da reforma tributária, mas pediu para que não houvesse alteração na alíquota de referência. Além de defender a isenção do frango, o presidente Lula afirmou que é preciso fazer uma “mediação” e diferenciar a tributação de carnes consumidas por mais ricos dos cortes consumidos pelos mais pobres.
Os representantes do setor de alimentos, que trabalham em conjunto na Câmara na defesa da ampliação da cesta básica, alegam, porém, que não é possível separar as proteínas animais, até por uma realidade de mercado. Isso porque as grandes empresas do setor têm operações em mais de um ramo de atuação. É o caso da JBS, do Frigorífico Agra e do Zanchetta. A Copacol, que opera no ramo de aves e de tilápia, por exemplo, é sócia da Frimesa, que produz suínos. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) afirma que o peso das carnes está superestimado nos cálculos e que o impacto na alíquota de referência é menor. Além disso, afirma que, com a taxação da alíquota reduzida em 60%, as carnes terão um aumento da carga tributária, o que vai dificultar ainda mais o acesso da população ao alimento. Os compradores da carne brasileira no exterior pagarão menos imposto para comer a carne do que os brasileiros, uma vez que a norma prevê que as exportações serão isentas de tributação.
O texto da emenda constitucional da reforma tributária, promulgada no ano passado, estabelece que os alimentos de consumo humano terão alíquotas mais baixas. A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) defende que todas as carnes tenham o mesmo tratamento e todas têm que estar na cesta básica. Nesse cenário de preocupação com a alíquota padrão do IVA, o Imposto Seletivo, chamado de “imposto do pecado”, figura como possível via de compensação a eventuais flexibilizações na cesta básica. Ainda assim, não se trata de solução simples, tendo em vista o grande número de setores mobilizados em torno do tema, que é igualmente polêmico. Nesse grupo, estão as indústrias de bebidas alcoólicas e açucaradas, os fabricantes de cigarros, carros, barcos e aeronaves e as empresas de petróleo e minério, todos engajados em fugir ou amenizar essa sobretaxa. Deputados alegam, porém, que há “gordura” nos cálculos do Ministério da Fazenda e que, mesmo com a inclusão das carnes, é possível que a alíquota de referência não suba. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.