26/Feb/2024
A mais recente edição do Observatório do Consumidor mergulha no fenômeno crescente conhecido como "Milk Shaming" (vergonha do leite, em tradução livre), uma expressão que capturou a atenção da mídia norte-americana e se refere à tendência de criticar ou envergonhar aqueles que optam por consumir leite tradicional ao invés de suas alternativas à base de plantas. Esta onda de críticas gerou uma resposta criativa através de uma campanha publicitária, que com um toque de humor, busca destacar o quão infundado é julgar as preferências alimentares alheias. O objetivo é promover um ambiente de aceitação e desestigmatizar o consumo de leite convencional, incentivando uma coexistência harmoniosa entre os diferentes consumidores de leite. A despeito da abordagem lúdica da campanha, não se pode ignorar os relatos concretos de bullying enfrentados por consumidores de leite, particularmente entre os mais jovens.
Diante desse cenário, foi analisada a percepção do leite e seus derivados no Brasil, com base em postagens realizadas no X (antigo Twitter), de maio de 2020 a agosto de 2023. Buscando responder: qual derivado lácteo é mais estigmatizado no Brasil? A maior parte do conteúdo veiculado sobre leite e seus derivados tende a ser positivo. Apenas 14% das publicações carregam uma conotação negativa. No entanto, ao examinar os produtos individualmente, descobriu-se que iogurte, leite condensado e leite lideram como os mais criticados no período considerado, com 20%, 20% e 19% das postagens negativas, respectivamente. A presença do leite condensado nessa lista deve-se a um episódio específico de controvérsia em torno de compras governamentais em larga escala do produto em 2020, enquanto iogurte e leite enfrentam um escrutínio mais constante.
A análise temporal permite observar um crescimento significativo no número de postagens de conteúdo negativo sobre leite, especialmente entre o quarto trimestre de 2021 e o terceiro trimestre de 2022. Na sequência, o volume de postagens negativas cai, mas permanece em um patamar superior ao do início da série. A análise aprofundada do discurso negativo sobre o leite na plataforma social X revelou um panorama complexo, onde expressões alusivas à contaminação, tais como "esporos", "campylobacter", "salmonelose", "micróbio", "germe" e "contaminação", emergem com frequência. Tal vocabulário aponta para uma preocupação perceptível com a segurança alimentar, refletindo possíveis temores sobre a qualidade e a integridade do leite e seus derivados.
Ademais, termos pejorativos como "porcaria", "lixo", "fezes" e "chiqueiro" também marcam presença, sugerindo traços de uma mentalidade de "milk shaming", embora essas expressões possam também indicar insatisfação geral com o produto, além da crítica à escolha de consumo. Intrigantemente, a discussão se estende para além da qualidade do produto, abrangendo aspectos como ingredientes e embalagens, com menções a "copo", "caixinha", "lata", "saquinho", "acidulante", "espessante" e "aditivos químicos", além da "tabela nutricional". Esse espectro de comentários reflete uma gama de preocupações que vão desde a composição do produto até o impacto ambiental de suas embalagens. Contudo, a natureza das críticas se deriva de problemas no manuseio, armazenamento e transporte por parte do consumidor, ou se são inerentes às qualidades do produto, permanece ambígua sem uma investigação detalhada de cada postagem.
Dessa forma, com base nas evidências disponíveis, a afirmação de que o "milk shaming" é uma prática prevalente no Brasil encontra-se, pelo menos por ora, sem fundamento sólido. Concluindo, o Observatório do Consumidor lança luz sobre um tema de relevância crescente, não apenas revelando a complexidade das opiniões sobre o leite e seus derivados no Brasil, mas também destacando a necessidade de uma compreensão mais aprofundada das motivações por trás das críticas. Ao fazer isso, estimula uma reflexão crítica sobre os padrões de consumo, a segurança alimentar e a tolerância nas escolhas alimentares. Nesse sentido, esse debate contribuirá para uma sociedade mais informada, tolerante e consciente, onde as escolhas alimentares são respeitadas e baseadas em informações confiáveis e considerações éticas, em vez de serem motivadas por desinformação ou estigma. Fonte: Observatório do Consumidor. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.