16/Jan/2025
O benefício a uma única empresa da Região Norte, inserido na regulamentação da reforma tributária, criou uma armadilha para o governo, que agora debate internamente a possibilidade de vetá-lo. Nos bastidores, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmam ser contra o incentivo, mas discordam sobre qual saída dar ao problema, cuja solução tem de ser dada até esta quinta-feira (16/01), quando termina o prazo para a sanção presidencial. A empresa beneficiada é a Refinaria de Manaus, da distribuidora Atem, que desde 2017 vende combustível importado sem recolher tributos federais graças a liminares obtidas na Justiça. Neste período, a fatia de mercado da Atem mais do que dobrou no País e, no Amazonas, ultrapassou 50%. A vantagem incomoda concorrentes (Raízen, Vibra e Ipiranga), que veem dano crescente à competição caso a empresa consiga ampliar ainda mais os seus benefícios após a reforma tributária.
O Conselho dos Secretários Estaduais de Fazenda (Comsefaz) estimou que a medida pode gerar uma renúncia em impostos de R$ 3,5 bilhões anuais. A Atem, por sua vez, alega que, sem o benefício, o combustível pode ficar mais caro na Região Norte e que deve ter direito aos benefícios tributários da Zona Franca de Manaus, uma vez que a refinaria está instalada na região. A empresa questiona ainda os valores da renúncia projetada e apresenta cálculos bem menores, de R$ 298 milhões por ano. Seis ministérios discutem o impasse, uma vez que há diferenças sobre a tática jurídica a se adotar e os riscos políticos envolvidos. Advocacia-Geral da União, Casa Civil, Planejamento e Indústria consideram seguro brecar o incentivo tributário para a Refinaria de Manaus. O Ministério de Minas e Energia não formalizou opinião, e a Fazenda vê riscos no veto.
O setor privado promete recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso o presidente Lula dê aval ao benefício para a refinaria do Amazonas. Na fase final da regulamentação da reforma tributária, durante a tramitação no Senado, o relator Eduardo Braga (MDB), que é do Amazonas, inseriu o setor de refino entre os atendidos pelos incentivos tributários da Zona Franca de Manaus. Com isso, além da isenção nos tributos federais, a Atem terá acesso a desconto também no IBS (imposto de Estados e municípios, junção dos atuais ICMS e ISS, que serão extintos). O benefício chegou a mobilizar deputados de outros Estados para votar contra a medida na Câmara, mas o presidente Arthur Lira (PP-AL) desencorajou a iniciativa, em razão de um acordo político firmado com Braga nos bastidores. A armadilha para o veto de Lula se dá por dois motivos.
O primeiro é o potencial de abrir conflito com o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga, que patrocinou o benefício, e com o PSD, do senador Omar Aziz (PSD-AM), que sugeriu formalmente a medida no texto. Os dois partidos compõem a base de apoio ao governo no Congresso. O segundo é jurídico, uma vez que o veto poderia alargar a brecha para mais incentivos tributários, na visão de parte do governo, notadamente o Ministério da Fazenda. Como foi redigido, o artigo 441 do projeto de lei lista quais são os produtos e atividades que não podem usufruir dos benefícios da Zona Franca de Manaus, reproduzindo as regras vigentes desde 1967. O quinto item listado é petróleo, combustíveis e lubrificantes. Braga inseriu uma vírgula e um texto adicional. O trecho afirma que há uma exceção: para refinarias instaladas na região e que usem a vantagem tributária em vendas locais, o que se encaixa à realidade da Atem e de sua refinaria.
Pela legislação, o presidente não pode vetar apenas um trecho da lei. Ou veta todo o item (alínea, segundo o jargão técnico) ou todo o artigo. O dilema de parte do governo é como fazer isso sem ampliar o risco de mais empresas acessarem o benefício da Zona Franca de Manaus. Para a diretora o Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), o governo deve vetar todo o artigo, sob o argumento de que o decreto-lei que instituiu a Zona Franca de Manaus, em 1967, já lista as atividades e produtos vedados, entre eles os combustíveis. Não há sentido econômico em haver um incentivo para que empresas instalem refinarias de combustível fóssil no coração da Amazônia no momento em que todos os países discutem como reduzir as emissões de gases de efeito estufa. O que acontecerá imediatamente, com esse benefício, é que esse agente econômico se livrará da concorrência, porque o produto dele vai estar incentivado e o dos outros, na mesma região, não vai estar incentivado.
Se o governo vai dar um benefício, que seja para o consumidor, não pode ser para uma única empresa. Tem a refinaria no Amazonas, mas tem também os importadores, os distribuidores. O benefício é só para a refinaria? Por que emprega? O importador e o distribuidor também empregam, esse argumento não é válido. A Refina Brasil, entidade que reúne seis grupos de refino privados, entre os quais a refinaria do Amazonas, sustenta que a venda de combustíveis com incentivo tributário da Zona Franca de Manaus é proibida, mas o refino para posterior venda poderia ser autorizado, uma vez que se trata de uma atividade industrial como qualquer outra instalada na região. A mera distribuição de combustível não gera desenvolvimento econômico, mas uma atividade industrial como o refino gera. Apesar dos argumentos contra e a favor, uma parte do governo diz preferir entregar a polêmica para o STF, evitando assim uma nova frente de conflitos.
A decisão será anunciada nesta quinta-feira (16/01), com a sanção de Lula ao projeto de lei, com ou sem o veto. Um ponto, no entanto, levantou preocupações nos últimos dias. Nos argumentos enviados ao governo, representantes do setor privado argumentaram que a vantagem concedida à refinaria da Atem pode estimular uma corrida por mais benefícios tributários por produtores de etanol e de biocombustíveis, ampliando a renúncia em impostos do governo em um momento em que o Ministério da Fazenda tenta reduzir esses incentivos. O alerta foi levantado em carta enviada pelo Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes (Sindicom) para o Ministério da Fazenda, em que menciona que o diferencial tributário a menor para o etanol está inscrito na Constituição. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.