15/Jan/2025
Pequenas e médias distribuidoras de combustíveis, as chamadas "regionais", devem seguir no caminho de judicialização do Renovabio. Já as distribuidoras de grande porte recuaram da estratégia de levar o programa à Justiça, dando um voto de confiança à lei sancionada neste início de ano, na esperança de que o texto legal reduza alegadas assimetrias concorrenciais com empresas que não cumprem as determinações do programa e, por isso, teriam custos menores e preços mais competitivos. Segundo o Citi, Vibra e Ipiranga desembolsaram cerca de R$ 840 milhões e R$ 617 milhões, respectivamente, com a compra de CBios ao longo de 2024, implicando um custo de R$ 23,00/m3 e R$ 26,00/m3 para atingir sua meta. Estima-se que 12% (13% em 2023) da participação de mercado de diesel e 15% (17% em 2023) do mercado de gasolina, etanol e gás natural em 2024 (até novembro) vieram de players que não atingiram o mínimo de suas metas de conformidade com CBio (abaixo de 85% da meta).
Existem 41 processos judiciais em que distribuidoras regionais pediam ou ainda pedem a suspensão das obrigações de compra e aposentadoria de créditos de créditos de descarbonização, os CBios, mediante depósitos judiciais que equivaleriam às suas emissões de carbono definidas por certificadoras independentes. Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), resultam desses processos 21 decisões liminares favoráveis a essas empresas impedindo a aplicação de sanções por não cumprimento do Renovabio e 1 para não revogação da autorização de funcionamento. Esse número já foi maior, visto que algumas decisões foram revogadas em linha com a defesa do programa feita pela ANP na Justiça. Ao obterem as liminares, as regionais seguem operando normalmente, protegidas de penalidades da ANP.
Os depósitos judiciais são calculados pelos requerentes com base no faturamento da empresa ou no preço médio do CBio nos anos iniciais do Renovabio, o que não é permitido de acordo com a Lei 13.576/2017 (que estabelece o programa). Fato é que, por uma série de alegações acolhidas pela Justiça, que vão desde o teor especulativo dos créditos comercializados na B3 até a sustentabilidade financeira das empresas, as distribuidoras regionais passaram a ganhar na Justiça o direito de medir de forma independente sua pegada de carbono e fazer pagamentos equivalentes. Pioneiro nesse tipo de processo, o escritório Montenegro Filho Advogados diz ter hoje 13 liminares ativas a favor de distribuidoras clientes, sendo quatro na segunda instância e nove na primeira instância. Entre essas empresas, estariam Ciapetro e TDC, citadas em relatórios de bancos por não aposentarem nenhum CBio em 2024. Apenas três liminares obtidas pelo escritório teriam sido revertidas.
A maior vitória do escritório até aqui veio no fim de outubro/2024, em favor da Biopetro, distribuidora de Ribeirão Preto (SP). Em votação colegiada unânime, os três magistrados da 6ª Turma do TRF-1 aceitaram em parte o pedido para que os depósitos judiciais da empresa fossem reconhecidos nas contas de suas metas de descarbonização de 2022, quando a empresa havia cumprido apenas 30,7% da meta de CBios, e de 2023, quando não comprou nenhum crédito. O depósito de R$ 700 mil foi usado para compra de quantos CBios fossem possíveis na B3, o que não perfaz a meta imposta pela ANP, mas resolve a questão judicialmente. Segundo a defesa, se não tivesse ido à Justiça, a Biopetro teria de gastar cerca de R$ 4 milhões para estar quite com o Renovabio. Em 2022, o preço do CBio oscilou entre R$ 31,99 e R$ 209,50. Em 2023, a faixa de variação foi entre R$ 84,45 e R$ 163,50. Na decisão, o colegiado aponta a "excessiva volatilidade" dos preços.
As distribuidoras de combustíveis regionais planejam alegar na Justiça que a nova lei criada para endurecer penalidades a inadimplentes dentro do programa Renovabio (15.082/2024) é inconstitucional. A nova lei não mexe em aspectos estruturais do programa, como a obrigação unilateral de compra dos CBios (a oferta dos créditos não é compulsória) e sua volatilidade de preços. Mas é encarada pelas grandes empresas do setor (Vibra, Ipiranga e Raízen) como um passo de consolidação do Renovabio capaz de impedir desvios das concorrentes regionais. Fontes dessas empresas, no entanto, definem a nova lei como "intimidatória" e "legalmente frágil". Para um executivo do setor, a nova lei é inconstitucional. Não se pode transformar em crime ambiental o não pagamento de um imposto controverso, que nem é imposto, é uma transferência de renda privada para produtores de biocombustíveis.
A ANP disse ver "de maneira muito positiva" a alteração da legislação, e lembrou que vem priorizando processos sancionadores contra empresas que não cumprem metas do programa, que podem ir além de multas, chegando à cassação da autorização e funcionamento. Há, segundo a ANP, quatro empresas nesse estágio extremo por não pagarem multas. A Lei 15.082/2024 traz, expressamente, diversas punições aos distribuidores que não cumprirem suas metas, tais como a tipificação de crime ambiental e a proibição a outros elos da cadeia de venderem combustíveis para os distribuidores inadimplentes. Para reduzir a inadimplência do Renovabio, que ficou em 37,4% em 2024, a nova lei também aumenta o teto da multa de R$ 50 milhões para R$ 500 milhões e transfere a meta não cumprida para eventuais CNPJs novos, abertos pelo grupo econômico inadimplente com o programa.
O escritório Montenegro Filho explica que a nova lei não alcança empresas protegidas por decisões liminares que suspendam suas obrigações relativas ao programa. Havendo depósito judicial, não pode haver penalidade. Essas empresas ficam imunes do efeito da nova lei, por determinação judicial. Quando o juiz diz que está suspensa a exigibilidade do crédito e aplicação de penalidades, essas elas não podem ser consideradas inadimplentes em hipótese alguma. A Federação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis, Gás Natural e Biocombustíveis (Brasilcom), que representa as distribuidoras regionais, afirmou apoiar o programa, mas considera "urgente" uma revisão. O atual formato do Renovabio não atende aos objetivos originais da lei, além de o CBio não se qualificar como um crédito de carbono fungível. Também é preciso corrigir imperfeições que geram graves assimetrias concorrenciais, prejudicando financeiramente as distribuidoras menores.
Segundo estudos da PUC-Rio patrocinados pela Brasilcom, os custos com o programa levam as distribuidoras a aumentarem seus preços finais em até R$ 0,12 por litro. Entre outras medidas, a Brasilcom defende que outros tipos de crédito de carbono sirvam ao cumprimento das metas; que haja obrigação e oferta de CBios para produtores de biocombustíveis; e que outros elos da cadeia, como o de refino, tenham obrigações de descarbonização. Um relatório do Citi afirma que, durante 2024, 61 distribuidoras de combustíveis não cumpriram as metas de descarbonização do RenovaBio e estão sujeitas a novas punições aprovadas em nova lei. Assim, uma maior fiscalização com o Programa RenovaBio é positiva para o setor de distribuição de combustíveis, pois o não cumprimento da meta por alguns players gera concorrência desleal no setor e garante uma margem maior a esses players, uma vez que o custo de aquisição de CBios é repassado ao preço do combustível fóssil e suportando um aumento de market share desses players, argumenta o Citi. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.