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21/May/2024

Combustíveis: cargas roubadas em rios da Amazônia

Enquanto moradores da Ilha de Santana (AP) se recolhem para dormir, um grupo de dez criminosos parte de lá em pequenos barcos rumo ao Pará. O alvo são grandes embarcações que passam carregadas de combustível pelo Rio Amazonas. Com a tripulação rendida sob armas e ameaças, a ação dos “piratas dos rios” costuma ser rápida. Logo eles fogem, com os barris roubados, pelo emaranhado hídrico da região. No estado do Amazonas, só em ataques contra embarcações de transportadores, mais de 7,7 milhões de litros de combustível foram levados do fim de 2020 a 2023, segundo levantamento do sindicato local das Empresas de Navegação Fluvial (Sindarma). O combustível é o maior foco desses tipos de criminosos pela facilidade de se desfazerem dele e comercializá-lo de forma ilegal. Por mais que eletroeletrônicos e outros tipos de carga possam ter maior valor agregado, costuma ser mais trabalhoso vendê-los a terceiros do que o diesel, por exemplo. Além disso, é mais fácil identificá-los quando são roubados.

Os piratas, também chamados de “ratos d’água”, não necessariamente têm elo com facções. Mas o avanço na região de organizações como Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da Capital (PCC) atrai outros tipos de crime, como roubo de armas e combustíveis. Em meio à rotina de medo e instabilidade, empresas contratam até escolta armada para proteger cargas maiores. Para incrementar a segurança, recorrem a botões de emergência, câmeras de monitoramento e até ao Starlink, serviço de internet da SpaceX. Em geral, os piratas chegam em lanchas ou barcos pequenos, o que facilita fugas após os roubos e a distribuição das mercadorias para outros barcos envolvidos. Os alvos mais comuns são barcos cargueiros mais lentos, com menor poder de reação. Estimativa da Polícia Federal indica que só a atuação do grupo descrito no começo da reportagem causava prejuízo mensal de R$ 150 mil a uma das empresas afetadas.

No fim do ano passado, a PF cumpriu 12 mandados de busca e apreensão em endereços de supostos membros da quadrilha. As embarcações apreendidas na ação totalizam mais de R$ 1 milhão. A Ilha de Santana, de onde partiam os principais suspeitos de integrar o grupo, tem forte atuação da facção local Amigos Para Sempre (APS), mas também tem crescido a presença do CV, considerado dominante na Região Norte. As facções costumam cobrar um “pedágio” de grupos menores que entram com produtos roubados na ilha. Em alguns casos, os piratas chegam a mirar até cargas de cocaína e skunk, importadas pelas facções de países vizinhos, como Peru, Colômbia e Bolívia. Depois, revendem a grupos rivais o que roubam. Os roubos ocorrem mesmo em rios pequenos, que são centrais para a vida dos moradores, mas não tão policiados como as cidades. Um exemplo é o Estreito de Breves, ao sul da Ilha de Marajó. Em 2022, ele recebeu a primeira base fluvial lançada pelo governo do Pará, na altura do município de Antônio Lemos, para combater a alta de roubos de carga.

O foco nesse ponto considerado estratégico, que liga o Rio Amazonas à região metropolitana de Belém, foi importante para ajudar a diminuir as ocorrências envolvendo embarcações nos anos seguintes, diz a gestão estadual. Mesmo com a desaceleração, esse tipo de roubo ainda preocupa, diante das dificuldades de fiscalização no território amplo e complexo. A disputa pelo controle dos rios se dá de forma extremamente violenta, com embates entre grupos criminosos fortemente armados, no meio de intensa troca de tiros, afirma Igor o Ministério Público do Amazonas. É uma constante guerra entre criminosos para a tomada dos pontos de controle dos rivais. Levantamento do Instituto Combustível Legal (ICL) aponta que a atuação dos piratas causa prejuízo anual de cerca de R$ 100 milhões nas atividades de transporte de cargas pelo Rio Amazonas. Esse número leva em conta gastos adicionais, com empresas tendo de contratar escolta armada, outros investimentos em segurança e o próprio roubo.

Os 7,7 milhões de litros de combustível roubados em ataques contra embarcações causaram prejuízos de R$ 48 milhões num intervalo de três anos (de outubro de 2020 a dezembro de 2023). Compostos por pelo menos quatro ladrões, os grupos agem fortemente armados, inclusive com fuzis, e às vezes chegam de forma silenciosa e com luzes apagadas. A violência é comum nas ações. Em um caso, um tripulante de um navio vindo do Chipre foi amarrado pelos pés e mãos. Celulares e outros itens dos marinheiros também são roubados. Diante dos roubos, os governos estaduais têm tentado aumentar a segurança na região. Hoje, o Pará tem a base fluvial de Antônio Lemos, no Estreito de Breves, e prevê instalar outras duas até o fim do ano: em Óbidos, às margens do Amazonas, e em Abaetetuba, próximo à Ilha do Capim. O Amazonas tem quatro bases, sendo duas móveis (a Tiradentes, no Alto Solimões, e a Paulo Pinto Nery, próxima da foz do Rio Madeira) e duas fixas (a Arpão 1, perto do município de Coari, no Rio Solimões, e a Arpão 2, no Rio Negro).

A última foi inaugurada no começo deste ano. Diante da recorrência de roubos a embarcações cometidos pelos “piratas dos rios” na Amazônia, empresas que atuam na região têm investido em escolta armada, câmeras de monitoramento e até em sistemas de segurança que se utilizam da Starlink, serviço de internet da SpaceX. A implementação de tecnologias pelas transportadoras tenta frear os criminosos. Com elas, pode-se ter um monitoramento em tempo real das embarcações, o que dá a possibilidade de ter um enfrentamento em água. Em paralelo a isso (mais tecnologia e agentes de segurança), criou-se também uma integração com as Secretarias de Segurança Pública do Amazonas e do Pará para se ter uma pronta resposta. Os órgãos geralmente são acionados por botões de emergência instalados na cabine dos navios. Segundo o governo do Pará, depois que a primeira base do Estado foi implementada em 2022, no Estreito de Breves, em Antônio Lemos, os roubos caíram de forma expressiva.

Foram 43 casos registrados no ano passado, ante 169 no ano de 2020, quando a modalidade atingiu o pico da série histórica de cinco anos. Segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), quase metade dos prejuízos causados pelos roubos de combustível a transportadoras amazonenses entre o final de 2020 e 2023 ocorreu nos arredores de Itacoatiara, no Rio Amazonas. Mas os Rios Madeira, Negro e Solimões também são considerados pontos de atenção. Com suas quatro bases, o estado do Amazonas informa que tem visto a quantidade de roubos praticados pelos piratas cair. Até agora, há zero ocorrência de roubos de combustíveis nos rios no começo deste ano. Ainda com a melhora no começo deste ano, segundo estudos internos do governo do Estado, o ideal seria adotar uma rede de nove bases fluviais e três bases terrestres para cobrir mais pontos considerados estratégicos.

No Pará, a implementação da base no Estreito de Breves teve como objetivo de evitar que o tráfico consiga escoar as drogas. Entre 2019 e 2021, foi apreendida meia tonelada de entorpecentes na malha fluvial, segundo a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup). No período de 2022 a 11 de abril de 2024, posterior à implantação da base fluvial, foram apreendidas mais de 7 toneladas de drogas na malha fluvial do Pará. A base paraense funciona 24 horas por dia, e conta inclusive com lanchas blindadas. No ano passado, 20% do que foi apreendido foi em Antônio Lemos, na base de Breves, e metade foi apreendida onde vai ser a base de Óbidos, detalhou o secretário de Segurança Pública do Estado. A região da Amazônia tem passado nos últimos anos por uma sobreposição entre crimes ambientais, como desmatamento e garimpo ilegal, com o narcotráfico. A nova dinâmica tonou mais complexo o combate à criminalidade. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.