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22/Nov/2023

Distribuidoras regionais na justiça contra RenovaBio

As distribuidoras regionais de combustíveis promovem uma enxurrada de ações judiciais contra a sistemática atual do programa RenovaBio e têm obtido liminares para evitar punições administrativas ao descumprimento das metas compulsórias do programa. Pelo menos 18 dessas empresas já entraram na Justiça Federal e outras 8 se preparam para fazê-lo. Destas, ao menos 13 já obtiveram decisões liminares favoráveis à suspensão de suas obrigações nos termos impostos pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), sempre mediante a depósitos judiciais. Na listagem da ANP que aponta o cumprimento ou não das metas relativas à 2022, só quatro empresas aparecem com ação judicial em curso. O número está desatualizado. O movimento se intensificou pouco antes de setembro, quando venciam as metas de descarbonização dessas empresas relativas a 2022. Então, como de praxe, essas empresas eram obrigadas a tirar de circulação uma quantidade suficiente de Créditos de Carbono (CBios) adquiridos na B3. Cada CBio equivale a 1 tonelada de carbono.

Em vigor desde 2019, o RenovaBio busca descarbonizar o transporte pelo incentivo aos biocombustíveis via transferência de renda da cadeia fóssil, mais especificamente da etapa de distribuição, a seus produtores, em mais de 80% dos casos, usinas de etanol. Nenhum dos processos, que correm em sigilo, tem decisão sobre o mérito. Mas, a estratégia de obter liminar que suspende as obrigações definidas pela ANP tem se mostrado promissora. Ela permite a essas empresas driblar os altos preços dos Créditos de Descarbonização (CBios) e continuar operando, sem pagamento de multa ou suspensão de inscrição, as punições previstas para as empresas que descumprem o programa. O fenômeno denota a dificuldade das distribuidoras, sobretudo as pequenas e médias, de cumprirem o RenovaBio. De fato, segundo a ANP, 54 das 141 empresas desse mercado (38%) não atingiram integralmente as metas do RenovaBio, sendo que 43 delas (30%) não aposentaram um crédito de descarbonização (CBio) sequer.

Agora, em efeito dominó, elas vão à Justiça para preservar sua operação. Uma das mais recentes decisões liminares a favor de distribuidora em detrimento do RenovaBio foi obtida em segunda instância, no Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Em 31 de outubro, o TRF-1 acolheu a argumentação da Rumos Distribuidora e concedeu liminar que suspende temporariamente suas obrigações dentro do RenovaBio. Nela, foi reconhecida a importância do programa e sua validade para que o País alcance metas de descarbonização acordadas internacionalmente, mas assinala inconsistência há muito apontadas pelo setor, como a ameaça especulativa que eleva sobremaneira os preços dos CBios e os riscos da queda na oferta dos papéis e seu possível descolamento da demanda imposta pelo programa nos próximos anos. A decisão, que previu depósito judicial de R$ 2,2 milhões, impede que a ANP aplique multas à Rumos ou casse sua inscrição.

Segundo a ANP, a Rumos deveria compensar 97,42 mil toneladas de carbono por meio da aposentadoria de número análogo de CBios até setembro deste ano, mas só cumpriu 20% dessa meta e agora briga na Justiça para não ser penalizada. A decisão judicial destacou "perigo de dano" na negativa da primeira instância ligado a possibilidade de multa pela agência reguladora; risco de descontinuidade empresarial caso a empresa tivesse de arcar com o total exigido pelo RenovaBio ou com punições; e consequente alta de preço dos combustíveis para o consumidor final, caso ela deixasse de operar. A primeira empresa a conseguir uma liminar do tipo, ainda em setembro de 2022, foi a distribuidora de pequeno porte Mar Azul (ex-Petrozara). À época, devido à pressão política do setor em reação à disparada de preço dos CBios, o governo Jair Bolsonaro terminou por prorrogar a data limite da aposentadoria anual dos créditos para setembro de 2023. Esse ano, com a aproximação do novo prazo e mesmo depois, para evitar punições, as empresas passaram a replicar a estratégia da Mar Azul.

Entre as distribuidoras que já foram à Justiça com esse propósito estão Biopetro, Larco, FGC, Rumos, Petronac, FlexPetro e pelo menos mais uma dezena. Na ação pioneira, a Mar Azul questionou na Justiça a forma de cálculo das metas de descarbonização, sob o argumento de que a meta individual de cada empresa deveria ser calculada pela multiplicação do seu percentual de participação no mercado nacional pelo faturamento do ano anterior, o que criaria uma espécie de "teto financeiro" para cada empresa no programa, dando maior previsibilidade ao negócio. Pela regra do RenovaBio, no entanto, essas metas são calculadas pela multiplicação do 'market share' por uma meta anual de descarbonização dos transportes definida pelo Ministério de Minas e Energia (MME) a cada ano na forma de toneladas de carbono. Como cada CBio equivale a uma tonelada de carbono, o cálculo da meta individual aponta não um montante em dinheiro, mas sim a quantidade de CBios a ser aposentada pela empresa na data limite.

O problema, reclamam as distribuidoras, é que o preço dos créditos segue sendo variável fora de qualquer previsibilidade e, nos últimos anos, inflacionada. Quando começaram a ser comercializados, no fim de 2019, os CBios custavam cerca de R$ 15,00 por unidade, mas ultrapassaram R$ 200,00 pouco mais de dois anos depois. Hoje, os créditos estão na faixa dos R$ 120,00. O Ministério de Minas e Energia já admitiu, em auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), que o preço de equilíbrio ideal do certificado seria de R$ 40,00, bem abaixo do praticado atualmente. Essa volatilidade faz com que o montante final das metas impostas pela ANP fique muito acima do defendido como adequado pelos reclamantes. Uma solução temporária para o imbróglio, invocada pela defesa dessas empresas a fim de demonstrar sua boa-fé, tem sido a realização de depósitos judiciais no valor que estas entendem adequados à sua obrigação de descarbonização.

O escritório Montenegro Filho Advogados atua na maior parte dos casos e diz que a estratégia de atacar frontalmente o RenovaBio não tem funcionado na Justiça, ao contrário da proposição de correções, com apontamento de inconsistências, como a veia especulativa dos CBios. Ao longo dos processos, a definição do montante adequado a ser pago tem sido apontada por consultorias de inventário de carbono validadas pela própria ANP. A agência aprova os serviços dessas consultorias para o processo de cálculo de geração dos CBios por produtores de biocombustíveis, a outra face do programa. O escritório Montenegro Filho Advogados está à frente de 17 ações, das quais 12 resultaram na obtenção de liminares favoráveis às distribuidoras, sendo 10 na primeira instância (Justiça Federal do Rio de Janeiro e do Distrito Federal) e 2 na segunda instância, no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, após indeferimento no primeiro grau. A soma dos depósitos judiciais relacionados nesses casos perfaz R$ 15,8 milhões. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.