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24/Jul/2023

Vale quer descarbonizar frota com biocombustíveis

A Vale está mudando a estratégia para o futuro dos caminhões e trens que levam seu minério. A tão propalada eletrificação do transporte de carga vai ficar em segundo plano nos próximos anos, dando lugar a veículos movidos a combustíveis renováveis, como etanol, diesel verde (HVO) e amônia verde. Apesar da mudança, a meta de redução das emissões de carbono está mantida. Nos escopos 1 e 2, que incluem respectivamente transporte e energia da operação, o corte planejado nas emissões é de 33% até 2030 e net zero até 2050. Trata-se, portanto, de uma mudança de rota tecnológica, caminho dessa descarbonização para tornar o processo mais viável estruturalmente e financeiramente. A eletrificação não será deixada de lado, mas tende a assumir papel auxiliar ou ficar restrita ao transporte de algumas minas no Brasil e no mundo, em caminhões com cargas menores. Por trás da mudança estão as limitações tecnológicas da eletrificação e a falta de infraestrutura associada no interior do País.

Os combustíveis renováveis, além de maior eficiência energética, alcançam mais facilmente os rincões onde a Vale atua. O último anúncio da companhia vai nessa linha. A Vale encomendou mais três locomotivas elétricas da Wabtec Corporation para uso na Estrada de Ferro Carajás (EFC), onde trafega o maior trem de minério de ferro do mundo, com 330 vagões e 45 mil toneladas do produto. As locomotivas elétricas não vão substituir as atuais, movidas a diesel, mas sim os chamados "helper dinâmicos", equipamentos que também consomem diesel para auxiliar em trechos de aclive. Nesse caso, a recarga advém também do próprio processo de freio da composição. Ao combinar diesel e eletricidade, os trens assumem um funcionamento híbrido, que deve anteceder o emprego de motores a amônia. A empresa trabalha com diversas soluções ao mesmo tempo, mas a amônia é a maior aposta para as locomotivas. O desenvolvimento do motor a amônia é, inclusive, tema das conversas da Vale com empresas como a própria Wabtec, que vai começar estudos em laboratório.

Se há uma certeza na Vale hoje, é que a solução baseada em eletrificação em baterias não vai passar do payload de caminhões de 100 toneladas. É muito improvável que vá alcançar caminhões com 320, 400 toneladas de payload. A Vale criou o programa de eletrificação PowerShift há cinco anos, mas só começou a introduzir veículos elétricos em sua frota no ano passado, com caminhões de 72 toneladas adaptados em operações no Brasil e na Indonésia. O mesmo aconteceu com duas locomotivas de pátio de manobra 100% elétricas, que operam na ferrovia Vitória-Minas, na Unidade de Tubarão, e em São Luís (MA). No entanto, as baterias darão voos mais altos no transporte pesado da Vale. No início, a ideia era que a eletrificação resolveria o problema de mobilidade em caminhões de mineração e ferrovias. Tudo que foi tentado nessa direção deu errado. O futuro do transporte da Vale é o etanol para caminhões e amônia verde para os trens.

O emprego desses insumos exige adaptações nos motores, mas contam com facilidades como oferta e logística que se aproximam daquela dos combustíveis fósseis, indesejados. Sobre as dificuldades do processo de eletrificação, a Vale citou desde aspectos básicos, como aplicação das baterias de veículos leves para pesados e eficiência, até logísticos. Nesse último ponto, seria preciso adaptar a lógica operacional para recarregar baterias diariamente. E a isso se soma a falta de infraestrutura. As minas, assim como as ferrovias da Vale, estão posicionadas e muito mal supridas de energia elétrica. Se colocar na conta os carregadores e tudo quanto seria necessário à substituição do diesel, chegou-se a números que não se sustentam. Há ainda a resistência dos fornecedores em aderirem à transição porque o negócio de modelos a combustíveis fósseis tem forte receita pós-venda, ligada à manutenção. Romper com isso (motor a combustão) para uma plataforma padrão elétrica, onde o número de partes rotativas cai muito e o 'aftersale' vai minguar, traz uma reação de fornecedores.

Para a McKinsey, é difícil viabilizar a eletrificação de caminhões acima de 22 toneladas de carga sobre cavalo, o que pode chegar a 40 toneladas no total. Trata-se de peso bem inferior ao dos veículos mais leves da Vale. A quantidade de baterias é proporcional ao peso da carga, o que eleva o custo do veículo em si e da operação, já que exige maior tempo de carregamento. Uma bateria de um carro elétrico pesa 500 quilos, o que sobe para 2 toneladas em um caminhão médio. Em um caminhão pesado, a depender da distância e do peso de carga, as baterias podem chegar a 5 toneladas. Por mais que se use carregamento rápido, um caminhão elétrico desse porte requer de seis a oito horas de recarga, o que dificulta operações contínuas (24h/7 dias), caso das minas da Vale. Uma alternativa é fazer o 'battery swapping' (troca da bateria para recarga), mas fazer a substituição de uma bateria dessas (grande) também não é tão simples.

O Instituto de Economia da UFRJ (Gesel/UFRJ) afirma que a correlação da quantidade de baterias com o peso do veículo inviabiliza as antigas aspirações da Vale. A falta de infraestrutura é um limitador fatal, sobretudo no caso das ferrovias, que teriam de ser amplamente eletrificadas a alto custo de investimento. Uma das rotas de descarbonização do transporte mais promissora é a do hidrogênio verde. Há um cenário de transição que é testar óleo diesel com uma percentagem de hidrogênio, entre 5% e 15%, o que reduz significativamente as emissões de carbono. Nessa linha, a amônia, que pode ser considerada um derivado do hidrogênio, vai bem também, porque é mais fácil para transportar e armazenar. Sobre o etanol para caminhões pesados, é uma opção viável, mas que depende de adaptações no motor. É viável, mas é uma alteração de projeto original, o que implica em alguma perda de eficiência. Segundo a Mckinsey, a grande vantagem fica por conta da infraestrutura de distribuição já existente.

Há pelo menos três tecnologias para transitar do diesel ao etanol: uma em que o diesel se mantém com um determinado percentual da mistura (pilotagem); outro em que o diesel é 100% substituído pelo etanol (combustão quente); e uma última em que diesel e etanol entram no mesmo motor, mas de forma apartada, a depender da escolha do motorista. Essa última opção é a mais cotada hoje na Vale, porque abre espaço para o uso de diesel verde (HVO). A flexibilidade do ponto de vista do insumo é sempre mais desejável. Uma alternativa factível, diz a Mckinsey, seria o biogás, o que exigiria a substituição da frota atual por veículos próprios para gás. Mas, a possibilidade foi afastada porque o emprego do biogás resultaria necessariamente na emissão de metano para a atmosfera, gás de efeito estufa considerado 86 vezes mais nocivo que o gás carbônico. Entre 2% e 5% do metano do gás utilizado na combustão no motor sai pelo cano de descarga dos veículos, e isso é um invalida o biogás como opção ambientalmente correta para a Vale. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.