13/Mar/2025
O Grupo Montesanto Tavares (GMT), responsável por cerca de 8% das exportações brasileiras de café arábica, espera avançar nas negociações com credores depois de formalizado o pedido de recuperação judicial, segundo o advogado Daniel Vilas Boas, representante da empresa no processo. "A sensação que havia é de que, enquanto estávamos na cautelar, as conversas não tracionaram o suficiente. No cenário de recuperação, os credores entendem que isso já é uma realidade", afirmou. O grupo protocolou o pedido de recuperação judicial em 25 de fevereiro, buscando renegociar dívidas de R$ 2,13 bilhões. Entre os principais credores estão o Banco do Brasil, com cerca de R$ 742 milhões a receber, o Banco Pine (R$ 154 milhões) e o Santander (R$ 159 milhões). A lista inclui ainda Bradesco, BTG Pactual, Itaú Unibanco e Banco do Nordeste, além de empresas como a Cargill, que teria aproximadamente R$ 104 milhões em créditos a receber.
A solicitação está em análise pelo juiz Murilo Silvio de Abreu, da 2ª Vara Empresarial de Belo Horizonte. O plano de recuperação deverá ser apresentado em até 60 dias após a aceitação definitiva do pedido. Segundo o advogado, a empresa já iniciou tratativas com seus principais credores, entre bancos e outras empresas, com o apoio de duas consultorias financeiras. Atualmente, o processo aguarda o laudo de um perito judicial nomeado pela Justiça, que já visitou unidades do grupo em Belo Horizonte, Varginha e Patrocínio para confirmar se as operações continuam ativas. "Eu não tenho dúvida nenhuma de que o relatório vai dizer que o Montesanto é absolutamente operacional, que as empresas estão de pé, não é à toa que nós temos 10% do mercado", afirmou Vilas Boas. Um dos pontos centrais da estratégia jurídica do GMT é a inclusão dos Adiantamentos sobre Contrato de Câmbio (ACCs) no processo de recuperação. Os ACCs são instrumentos financeiros em que exportadores recebem antecipadamente o valor de vendas futuras ao exterior, geralmente em dólar.
Pela legislação brasileira, esses contratos tradicionalmente não são abrangidos por pedidos de recuperação judicial, pois são considerados financiamentos ligados à exportação. O grupo, no entanto, argumenta que suas operações foram utilizadas como empréstimos comuns para rolagem de dívidas, sem ligação direta com exportações específicas. "Na verdade, os ACCs no Grupo Montesanto não são verdadeiros ACCs, não são verdadeiros adiantamentos. São empréstimos comuns. Quando você vai olhar as operações, fica claro: não tem exportador, não tem cliente indicado, não tem importador, não tem lugar de pagamento. Não tem nada nelas porque não há operação de exportação vinculada", explicou o advogado. Segundo documentos apresentados no processo, até maio de 2021, antes da crise, a média semanal de captação com ACCs foi de US$ 1,4 milhão, enquanto entre junho de 2021 e julho de 2024, esse valor saltou para US$ 5,7 milhões semanais.
O GMT alega que os bancos teriam concedido crédito sabendo que o objetivo não era para operações de exportação. A estratégia do grupo recebeu respaldo judicial. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) concedeu uma liminar protegendo tanto os ACCs quanto bens dados em garantia fiduciária, como sacas de café e reservas financeiras, classificadas como "essenciais" para a continuidade da empresa. A disputa entre GMT e credores se intensificou desde o agravamento da crise financeira do grupo, que enfrenta dificuldades desde a safra de 2021/2022. Naquele período, a quebra na produção de café no sul de Minas Gerais, causada por eventos climáticos adversos que destruíram cerca de 24 milhões de sacas de 60 Kg de café (queda de 53% em relação à média dos cinco anos anteriores), levou produtores a descumprirem contratos de entrega, forçando o GMT a comprar café a preços elevados para honrar compromissos de exportação.
Mais recentemente, a alta histórica nas cotações do café, superior a 120% nos últimos 12 meses, combinada com a desvalorização do Real frente ao dólar, gerou novas pressões financeiras, com chamadas de margem sobre as operações de hedge do grupo. Essas chamadas de margem são exigências de depósitos adicionais feitas por corretoras e bancos para cobrir oscilações de preços quando o mercado se move desfavoravelmente às posições da empresa. Segundo informações do processo, o valor comprometido com derivativos pelo grupo aumentou de R$ 50 milhões em maio de 2024 para cerca de R$ 470 milhões em novembro, representando 158% do saldo de recebíveis. "O grupo Montesanto tem plena capacidade de superar essa situação. Precisamos renegociar essas dívidas dos ACCs e resolver como vamos lidar com as operações de hedge. São nossos dois desafios", enfatizou Vilas Boas. Diferente de outros processos de recuperação judicial que envolvem débitos trabalhistas ou fiscais, Vilas Boas afirmou que o GMT não tem dívidas relevantes com funcionários, governo ou fornecedores.
"O que nós temos é ACC e hedge, e nós vamos ter que reestruturar essas operações pra gente poder sair dessa crise", disse. O advogado estima que o processo de recuperação judicial deve durar entre um e dois anos, com base em casos similares julgados em Minas Gerais. "Nós temos uma questão de credibilidade comercial no Grupo Montesanto. Essa exposição naturalmente não é desejada", concluiu. Em dezembro de 2024, antes do pedido formal de recuperação, o GMT havia conseguido proteção temporária contra execuções de credores por 60 dias, prorrogados posteriormente por mais 30 dias, para tentar um acordo extrajudicial que não avançou o suficiente. O grupo é composto pelas empresas Atlântica Exportação e Importação, fundada em 2000, e Cafebras Comércio de Cafés do Brasil, criada em 2013, além de unidades operacionais em quatro cidades mineiras: Cargatinha, Caparaó, Patrocínio e Manhuaçu. Fonte: Broadcast Agro.