ANÁLISES

AGRO


SOJA


MILHO


ARROZ


ALGODÃO


TRIGO


FEIJÃO


CANA


CAFÉ


CARNES


FLV


INSUMOS

09/Nov/2020

Política externa do Brasil preocupa exportadores

Quem paga a conta de uma política externa equivocada? Todos, claro. Mas como para tudo existe uma ordem de importância, são as empresas, em especial as exportadoras, as primeiras na fila do caixa. Muitos empresários brasileiros têm atuado como malabaristas comerciais para manter de pé negócios e contratos, a despeito de mensagens do governo brasileiro que deixam de cabelo em pé clientes e investidores externos. A eleição norte-americana se aproxima do fim com uma cada vez mais provável (e apertada) vitória de Joe Biden sobre Donald Trump. O empresariado acompanha todo o processo com um silêncio prudente. Já o presidente Jair Bolsonaro, convencido tardiamente por assessores de que deve esperar o resultado sem se expor mais, coleciona declarações desnecessárias em que reafirma a torcida aguerrida por Trump. Como a da crença de que Biden pretende interferir na política brasileira para a Amazônia. O Brasil pode estar perdendo o timing. Não é hora de brincar de kamikaze.

"O empresário brasileiro tem medo do isolacionismo crescente em que nos metemos e das sanções que podem vir para os produtos brasileiros, não só nos Estados Unidos como em outros países, como os da União Europeia", disse à coluna Ricardo Knoepfelmacher, sócio diretor da RK Partnes, consultoria especializada em reorganizações empresariais complexas. Ricardo K, como é mais conhecido no mercado o advisor que esteve à frente de grandes processos de fusão e aquisição, além da reestruturação de empresas como Caloi, Brasil Telecom, Brasil Ferrovias e Odebrecht, lembra que a imagem institucional brasileira no exterior piorou muito com a forma com que o País vem enfrentando ("Ou decidiu não enfrentar") a crise trazida pela pandemia de Covid-19. Uma atitude que espelhou a adotada pelo governo Trump nos Estados Unidos. "Isso nos colocou como párias internacionais.

Mas, esta imagem distorcida pode ser corrigida se o governo mostrar agora pragmatismo, mantendo uma boa relação com o novo governo dos Estados Unidos e com os outros parceiros comerciais, sem uma subserviência automática, e indicando bom senso e serenidade na sua política externa e comercial", avalia Knoepfelmacher. Os Estados Unidos são o segundo parceiro comercial do Brasil. A China, cuja importância em nossas relações comerciais cresceu continuamente ao longo dos últimos 20 anos, se solidificou ainda mais depois da guerra comercial com os Estados Unidos. De janeiro a setembro deste ano as transações correntes com o país asiático somaram US$ 78 bilhões, mais do que o dobro do que representaram os Estados Unidos (US$ 33 bilhões). "A China é o maior parceiro comercial do Brasil e onde temos um superávit na balança comercial muito representativo: até setembro, dos US$ 42 bilhões de superávit do Brasil, US$ 29 bilhões vieram da China, quase 70%. Com os Estados Unidos temos um déficit acumulado de US$ 3 bilhões.

Assim, o Brasil deveria ser pragmático e abandonar a fidelidade ideológica a um governante e buscar seus interesses", lembrou. Grandes grupos empresariais geralmente não endossam alinhamento a governantes, mas sim aos países, às nações. As transações comerciais eficientes não ocorrem de forma personificada. O Brasil tem grandes empresas exportadoras com negócios em países com os mais diferentes governos, na Ásia, no Oriente Médio, Europa e América Latina. É o caso de BRF, Marfrig e tantas outras. A China é um grande comprador de petróleo brasileiro, açúcar, carne, minério de ferro. A Vale há muito tempo deslocou seu foco principal para o mercado chinês. Mas nada disso impediu o imbróglio totalmente fora de propósito do governo brasileiro com a China. O alinhamento ideológico com o governo Trump não trouxe resultados concretos sólidos, a não ser alguns poucos acordos periféricos.

Nenhum acordo mais amplo de livre comércio foi firmado, apesar da fidelidade irrestrita de Bolsonaro a Trump. Agora, com a possibilidade de mudança de presidente, os Estados Unidos tendem a retomar a busca por uma política comercial multilateral, como defendeu Biden durante toda a campanha. É certo que também falou sobre a Amazônia. Manifestou, inclusive, a intenção buscar apoio internacional para garantir que o Brasil adote medidas necessárias de proteção ao ecossistema. "O embate em relação a preservação da Amazônia afastou e irritou países europeus que ameaçam discriminar produtos brasileiros, em especial os provenientes do agronegócio. A Amazônia é nossa, sem dúvida. Mas hoje é um dos itens da pauta de discussão entre as nações", diz Ricardo K. As queimadas na Amazônia e no Pantanal deixaram o mundo em alerta. E o desmatamento, por mais que se assemelhe de alguma forma a um processo consciente - se é que isso é possível - não vai beneficiar o setor do agronegócio se barreiras não sanitárias impedirem a entrada de seus produtos no mercado.

Num momento em que é cobrado das empresas cada vez mais o compromisso de adoção de políticas sustentáveis em relação ao meio ambiente e ao clima, as sanções comerciais são uma forma de obrigá-las a se engajar no movimento. Assim, mesmo empresas que adotem critérios de sustentabilidade podem ser penalizadas com taxas adicionais apenas devido à origem brasileira de seus produtos. É assim que o isolacionismo prejudica o multilateralismo. "Um dos efeitos nocivos da pandemia de Covid-19 na economia, além da recessão, é que está destruindo 30 anos de globalização crescente no mundo. Está havendo um fenômeno de desglobalização. Quando os Estados Unidos se deram conta de que 93% dos equipamentos de proteção individual (contra o vírus) vinham da China ou da Índia, ficaram apavorados. Atitudes protecionistas aumentaram muito e devem aumentar mais. E, quando o empresário olha para esta situação, é com preocupação", diz Ricardo K. Fonte: Irany Tereza. Agência Estado.