31/Mar/2020
O grau de isolamento da população e a velocidade do governo na adoção de medidas de combate à crise provocada pela pandemia do novo coronavírus esquentaram o debate nos últimos dias sobre a profundidade do impacto econômico e a capacidade de retomada do Brasil após o fim da emergência sanitária. Uma recessão em 2020 é dada como certa, mas o futuro ainda está cercado de incertezas. Enquanto o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizam a necessidade de retomar desde já a atividade produtiva, economistas têm engrossado os alertas de que uma desorganização na economia do País pode ocorrer a despeito de uma política de confinamento mais flexível, como prega o presidente, e que o foco agora deve estar na rede de proteção a famílias e empresas, além dos investimentos na saúde. O Banco Mundial já emitiu avisos de que as projeções não descartam várias ondas da pandemia, o que requer uma abordagem global para seu combate, incluindo a busca por uma vacina e preparo das economias.
Se essas ondas se confirmarem (como na gripe espanhola, que teve três grandes ondas), algum tipo de confinamento pode durar mais tempo, impondo severos impactos sobre a atividade e retardando a recuperação. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) calcula que cada mês de quarentena reduz em 2% o crescimento anual do Produto Interno Bruto (PIB) dos países. Por outro lado, estudos sugerem que um sacrifício maior agora pode compensar: o tombo mais profundo no curto prazo daria lugar a uma recuperação mais veloz à frente. Essa avaliação consta em um artigo de economistas do Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos) divulgado no dia 26 de março. Eles analisaram a estratégia de combate à pandemia da gripe espanhola em 1918, embora tenha ocorrido há um século, ela tem sido considerada como a única comparável ao momento atual. As cidades que intervieram mais cedo e de maneira mais agressiva não tiveram performance pior, pelo contrário, elas cresceram mais rapidamente após o fim da pandemia. Os achados indicam que intervenções não farmacêuticas não só reduzem a mortalidade, mas também mitigam as consequências adversas da pandemia sobre a economia. Foi analisado o desempenho de 43 cidades norte-americanas.
No Brasil, os economistas avaliam que o impacto econômico já está evidente, mas ainda é possível salvar vidas e amenizar as consequências para as famílias no futuro, o que seria crucial para amortecer o choque e acelerar a retomada. A principal ponderação é que, mesmo com a reabertura agora de comércio e serviços, as famílias simplesmente podem não consumir se acharem que suas vidas continuam correndo risco. Alguns setores como entretenimento e turismo podem até desaparecer momentaneamente enquanto esse comportamento durar. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), a crise já afetou a economia, mas ainda não foram colhidos os benefícios de frear os impactos na saúde. O efeito econômico já está 'contratado'. O de saúde ainda pode ser contido. A percepção é de que o governo demorou a emitir sinalizações cruciais aos empresários e trabalhadores de que daria o respaldo necessário para conter a crise. Com isso, algumas companhias começaram a demitir, o que contribui para tornar mais permanentes os efeitos do choque.
A recuperação agora tende a ser mais lenta e não será uma flexibilização na quarentena que impedirá isso. Não tem como escapar de um efeito devastador, de saúde ou de economia, as duas coisas estão juntas e vão ser ruins no Brasil. Dois terços das medidas anunciadas pelo governo para socorrer empresas e trabalhadores ainda não saíram do papel. O auxílio aos empregados formais que tiverem redução de jornada e salário sequer foi proposto pelo governo. Quando chegar o recurso do governo, pode ser um pouco tarde. E ainda tem o risco de ele não chegar onde mais precisa. Após uma crise econômica, o emprego costuma ser uma das últimas variáveis a se recuperar. A equipe econômica tem buscado traçar cenários para o pós-crise e ainda conta com uma melhora na atividade a partir do segundo semestre de 2020. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já manifestou publicamente a preocupação com a possibilidade de um isolamento prolongado desorganizar as cadeias produtivas e comprometer a saída da crise pelo Brasil. Ele tem defendido o retorno gradual e fez um alerta sobre o risco de desabastecimento, inclusive de produtos de saúde.
O ex-vice-presidente e ex-diretor executivo do Banco Mundial, Otaviano Canuto, se diz mais preocupado com a falta de renda das famílias para comprar comida do que com uma eventual crise de desabastecimento. A recessão virá, uma depressão longa. As não são suficientes para lidar com o impacto social que a crise vai trazer. O choque simultâneo de oferta e demanda tem um efeito primordialmente sobre certo conjunto de serviços, empresas e trabalhadores. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) alerta que, para evitar um quadro de depressão na economia, é preciso fazer com que os bancos alonguem os prazos das dívidas dos seus clientes. Em março, o endividamento dos brasileiros atingiu a máxima histórica, com 66,2% das famílias com a renda comprometida com dívidas de cartão de crédito, cheque especial, crédito pessoal, crédito consignado, carnês, financiamentos de carros, financiamentos de imóveis, entre outros.
O número dos endividados vai aumentar com a crise da pandemia da Covid-19 e os bancos continuam retraídos. Os bancos não querem dar dinheiro novo, nem querem alongar. Querem comprar só títulos públicos. O Banco Central tem que reduzir mais os juros para os bancos ganharem menos dinheiro ao comprarem os títulos públicos. Os bancos estão com recursos disponíveis. Se os bancos não fizerem isso, haverá uma quebradeira geral. As empresas não vão pagar, as pessoas não vão pagar e vai ser uma quebradeira geral. Os bancos também podem quebrar mais para frente. O setor de comércio, um dos mais prejudicados pelo confinamento forçado da crise, previa um aumento das vendas do varejo de 3%, mas a previsão já é de uma queda de 4% e pode ficar pior. É preciso evitar que o País entre numa depressão. O momento é de início de uma recessão. Depressão é mais grave. Nos próximos dois ou três meses, será possível observar se a recessão vai virar depressão. Fonte: Agência Estado. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.