14/Nov/2025
O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) preparou anúncios que totalizam US$ 6 bilhões para a primeira semana da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30). O presidente do BID, Ilan Goldfajn, argumenta que é natural a concentração de anúncios porque a conferência é no Brasil e o País é o maior cliente da instituição. Todas as iniciativas buscam impulsionar soluções para a emergência climática, sendo que boa parte é destinada para o bioma amazônico. Para esta sexta-feira (14/11), o BID reservou quatro anúncios. Um deles é de US$ 3,4 bilhões para oferecer hedge cambial para empresas e investidores.
O ex-presidente do Banco Central conta que a multiplicidade de iniciativas é mais do que bem-vinda. “Não haverá um único instrumento capaz de resolver todos os problemas”, disse Ilan, pontuando que alguns instrumentos terão escala, outros não. Diante do fato de muitas dessas iniciativas acessarem os mesmos bolsos soberanos, Ilan pontua que a coordenação entre elas é necessária, assim como o acesso a recursos privados. Desde a semana passada em Belém, Ilan demonstra otimismo com a mobilização de empresas e governos nacionais e subnacionais na “direção certa” para solucionar a emergência climática. “A pergunta a ser feita é se a velocidade está certa”, afirmou. Segue a entrevista:
Nos últimos dias, houve vários anúncios de medidas para alavancar o financiamento climático. Quais são os grandes desafios nesse tema?
Ilan Goldfajn: Vejo todos os esforços com bons olhos. Não haverá um grande instrumento que vai resolver todos os problemas. A crise climática é um problema de todos os países, dos Estados, das prefeituras. Se cada um fizer a sua parte gerando impacto, é possível fazer na escala suficiente. Focamos em várias iniciativas e instrumentos. Só do que estamos fazendo, são US$ 6 bilhões. Se cada um fizer os seus US$ 6 bilhões, te garanto que soma bastante.
Qual sua avaliação do TFFF? Acredita que possa ter demanda no mercado pelos títulos que o fundo vai emitir?
Ilan Goldfajn: Todas as iniciativas têm o seu valor. Algumas vão ter mais escala, outras menos. O importante é inovar e tentar trazer o setor privado para dentro, com a gente colocando dinheiro só para garantir o risco.
Acha que o TFFF terá demanda?
Ilan Goldfajn: A gente vai saber. O BID não é quem está fazendo. Eu posso dizer que dou força para todas as iniciativas que existem. E a gente está fazendo a nossa contribuição. Não acho US$ 6 bilhões pouca coisa.
Vendo os anúncios que saíram até agora, a impressão é que vão acessar os mesmos bolsos de sempre.
Ilan Goldfajn: O bolso está pequeno em todo o mundo. Os países em desenvolvimento estão com dívidas e problemas fiscais. Os desenvolvidos estão com guerras. Enfatizamos dois elementos. Um: coordenação. Vamos trabalhar em parceria para juntar forças. Dois: vamos juntar forças para trazer o setor privado. O setor privado tem recurso disponível e não está alocado nas prioridades que queremos. Os investidores institucionais - grandes seguradoras e grandes fundos de pensão - poupam para, se acaso acontecer alguma coisa, estarem cobertos. Essa poupança busca estabilidade e pouco risco.
Mas os projetos ligados ao clima têm um risco maior.
Ilan Goldfajn: Isso que vamos anunciar amanhã. Projetos de resiliência e adaptação não são fáceis. Mas, olhando o balanço das instituições locais, já existe uma quantidade de empréstimos e de projetos que deram certo. Projetos de energia renovável, por exemplo. São US$ 500 bilhões em projetos na América Latina e no Caribe. Precisamos comprar isso que está performando e remodelar.
O que é remodelar?
Ilan Goldfajn: Trazer (projetos) de vários bancos, juntar, diversificar, verificar, colocar nossas garantias de novo, dinheiro público e vender como Triple A (AAA). Ou seja, levar para os investidores institucionais algo que é palatável. Isso é o que chamamos de Reinvestir+. Uma vez que você tira esses US$ 500 bilhões do balanço dos bancos, eles podem se comprometer a financiar outros US$ 500 bilhões. Já estamos recebendo propostas de bancos internacionais para trabalhar com a gente.
Mas, nesse caso, é um outro instrumento de garantia, para além daquele anunciado ontem?
Ilan Goldfajn: A garantia de ontem foi uma garantia para o Xingu. É a primeira vez que um banco como o nosso coloca uma garantia para o setor privado poder investir.
E amanhã?
Ilan Goldfajn: É algo mais global. Como vamos fazer para que o mundo chegue a US$ 1,3 trilhão? Está faltando US$ 1 trilhão, e isso precisa vir do setor privado. Então as nossas garantias, junto ao dinheiro que vamos trazer dos bancos locais, é o que queremos.
Em síntese, vocês compram a carteira de financiamento de bancos da América Latina e Caribe e transformam isso em bond. E o setor privado, que quer um bond-BID, Triple A, coloca esse dinheiro e, pronto, fechou a conta?
Ilan Goldfajn: Exatamente. Só que não vai ser BID, vai ser um fundo. A parte do BID Invest vai ter âncora, vai participar. E [haverá] um fundo, que não é só BID. Estamos tentando ser âncora em várias propostas nossas. Essa é uma delas.
Sobre o ‘Amazônia Para Todos’. Como vocês têm sentido a demanda no mercado?
Ilan Goldfajn: Ainda não chegamos na demanda. Mas vejo interesse do Banco do Brasil, da Caixa, do BNDES, de poder chegar ao varejo. Essa é a ideia da Amazônia Para Todos: pegar nossos projetos, colocar na Bolsa e vender cotas de R$100.
Mas e o retorno?
Ilan Goldfajn: Vai ser a taxa de retorno que os nossos projetos dão. Nossos projetos não dão retorno altíssimo, mas dão retornos positivos. O varejo nesse negócio tem que entrar um pouco pela causa [socioambiental].
No Círculo de Ministros de Finanças da COP, uma das recomendações é que bancos multilaterais invistam mais em moeda local. Quanto a participação das operações em moeda local na América Latina e no Brasil, e quais as condições para crescer?
Ilan Goldfajn: Trabalhamos com moeda local onde há capacidade, ou seja, onde o mercado financeiro tem profundidade. Hoje, trabalhamos de forma intensa para mitigar risco cambial. O EcoInvest tem um componente de mitigação cambial. Um dos anúncios relevantes que faremos é o de hedge cambial para investidores em desenvolvimento sustentável e resiliência, através do EcoInvest.
Pode detalhar?
Ilan Goldfajn: Vai haver um leilão com os bancos. Os bancos terão uma demanda para poder ter os recursos e financiar as empresas. Vamos prover o hedge para que esses bancos possam provê-lo para as empresas. A forma mais fácil que encontramos é assinarmos um acordo com o Banco Central. Temos um número grande para o hedge cambial com o Banco Central, que, por sua vez, vai passar esse hedge para os bancos. Esses últimos, por sua vez, vão passar para os investidores que vão estar no EcoInvest.
Dada a postura do presidente Donald Trump de negação da emergência climática, os Estados Unidos têm atrapalhado o avanço do financiamento climático?
Ilan Goldfajn: Vejo que nas questões principais há consenso. Por exemplo, desastres naturais. Só na América Latina e no Caribe, tivemos 70 desastres naturais no ano passado. Custaram US$ 10 bilhões. Todo mundo sabe que os desastres naturais são um problema e todo mundo quer participar da solução. Acho que está todo mundo na direção certa e caminhando. A questão que se coloca é se estamos na velocidade certa ou não. Essa é a dúvida. Mas eu acho que as coisas estão andando.
Fonte: Broadcast Agro.