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20/Oct/2025

Licenciamento Especial acelera obras na Amazônia

A Licença Ambiental Especial (LAE), parte do novo licenciamento ambiental aprovado em agosto, deve acelerar a aprovação de empreendimentos de grande porte na Amazônia. Alguns exemplos são o asfaltamento da BR-319 (Manaus-Porto Velho), hidrovias no Rio Araguaia e a Ferrogrão, de Mato Grosso ao Pará. A LAE foi incluída no licenciamento ambiental pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e depois transformada em Medida Provisória (MP) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O modelo cria um rito simplificado para obras classificadas por um conselho de governo como “estratégicas” e impõe prazo máximo de 12 meses para a análise desses pedidos de empreendimentos. Ambientalistas veem risco de uso de critérios políticos em detrimento dos técnicos na priorização dos projetos. Também apontam que o limite de um ano é curto para cumprir as três fases de análise. Entidades ligadas ao setor de infraestrutura, por sua vez, têm defendido desburocratizar os trâmites e criticam a necessidade de um novo processo de licenciamento para cada projeto aberto em uma área.

Um dos projetos de interesse do presidente do Senado é a exploração de petróleo na Margem Equatorial da Foz do Rio Amazonas, o que deve levar receitas para o Amapá, seu Estado natal. A Petrobras diz seguir todas as exigências ambientais. E o Ministério do Meio Ambiente afirma manter os compromissos climáticos, com a biodiversidade e com os povos tradicionais. Ao sancionar o novo licenciamento aprovado pelo Legislativo, Lula vetou parte dos dispositivos que flexibilizavam as regras. Em aceno para Alcolumbre, porém, transformou a emenda da LAE em Medida Provisória, que já está em vigor desde agosto. O Congresso ainda deve votar os 63 vetos do presidente. A pavimentação total da Rodovia BR-319, que liga Porto Velho a Manaus, é motivo de polêmica há décadas. Com cerca de 885 quilômetros de extensão, ela corta a área mais bem preservada da Floresta Amazônica: passa às margens ou em alguns casos pelo meio de 42 unidades de conservação ambiental, 69 reservas indígenas e mais de 6 milhões de hectares de terras públicas.

Cerca de 200 quilômetros (no início e no fim da via) são asfaltados. O trecho central é de terra batida e costuma ficar intransitável no período de chuvas. Grande parte do fluxo entre as cidades é feita de barco pelo Rio Madeira e o trajeto leva dias. A estrada é a única ligação terrestre da capital do Amazonas ao restante do País, e é defendida por moradores e políticos locais, além de representantes da indústria, para facilitar o transporte de mercadorias. Na opinião dos ambientalistas, o asfaltamento da estrada aumentaria a destruição do bioma, impedindo o País de cumprir a meta de desmatamento zero até 2030. Em 2024, Lula se comprometeu a retomar as negociações para reconstruir a rodovia. A medida foi na direção contrária a uma nota técnica emitida pelo Ministério do Meio Ambiente, de Marina Silva, que apontou risco de a obra elevar a taxa de desmate em até quatro vezes. Por ora, a licença prévia para a obra está suspensa por liminar concedida pela Justiça Federal.

A decisão atendeu a recurso do Observatório do Clima (grupo de organizações do terceiro setor) em ação civil pública que pede a anulação da licença por inconsistências legais, técnicas e ambientais no processo de licenciamento realizado pelo Ibama em 2022, no governo Jair Bolsonaro (PL). O projeto capitaneado pelo agronegócio para escoar a produção de grãos pelos portos da Região Norte do País prevê construir 933 quilômetros de ferrovia entre Sinop (MT) e Miritituba (PA), com a promessa de reduzir emissões por transporte e reduzir custos logísticos. Desenhado há mais de uma década, o empreendimento teria capacidade de movimentar 50 milhões de toneladas de grãos, tornando-se um dos grandes indutores do chamado Arco Norte, que hoje funciona principalmente pela BR-163. Mas, não saiu do papel pelos impactos ambientais, principalmente o risco de desmate no Parque Nacional do Jamanxim, reserva no Pará. Também é questionada a falta de consulta pública à população da região durante o estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental.

A consulta é uma etapa prevista por tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. O andamento do projeto está suspenso desde 2021, após liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal. A União entregou à Corte manifestação que afirma ser possível passar pela área de proteção ambiental respeitando a faixa de domínio da BR-163/MT e documentos para comprovar a consulta prévia a líderes de comunidades, prometendo destinar R$ 715 milhões em contrapartidas ambientais. Em maio, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) disse que trabalharia para liberar a construção. Em estudos no Ministério da Casa Civil, há projetos de concessão de hidrovias como a do Rio Madeira (de Porto Velho, em Rondônia, a Itacoatiara, Amazonas), de Tocantins e outras. A hidrovia do Madeira tem importância estratégica para o agronegócio, principalmente para escoar a produção agrícola de Mato Grosso e Rondônia, mas está com o leilão travado no Senado. No Rio Tocantins, o Ibama licenciou o derrocamento do Pedral do Lourenço, formação rochosa que restringe a passagem de embarcações de carga, mas a intervenção foi suspensa em junho pela Justiça Federal.

O governo do Pará encaminhou ofício no dia 16 ao governo federal em defesa do empreendimento. Segundo o Instituto de Energia e Ambiente (Iema), o licenciamento desse tipo de projeto normalmente é feito para cada intervenção realizada, como a explosão de rochas ou dragagem de sedimentos para permitir a circulação de embarcações de maior porte. Com a LAE, ainda não está claro se esses projetos serão liberados de uma só vez. A Casa Civil não deu detalhes sobre o processo de licenciamento das hidrovias. Há 21 blocos sob contrato na Amazônia Legal e outros 67 em diferentes estágios de oferta (um arrematado no leilão de áreas de petróleo realizado em junho, um em oferta e 65 em estudo para Oferta Permanente de Concessão). Na costa amazônica, são 25 blocos já contratados, 19 arrematados no último leilão e outros 249 em estudo, segundo dados do Monitor Amazônia Livre de Petróleo, do Instituto Arayara. Conforme a análise da organização, os blocos sob contrato já estariam aptos ao licenciamento por LAE, e o restante seria igualmente propício à licença especial.

Na prática, devido ao prazo estabelecido na LAE, o licenciamento desses empreendimentos seria mais rápido do que o do bloco da Margem Equatorial da Foz do Amazonas, que causou impasse entre setores do governo e fez Lula acusar o Ibama de “lenga-lenga” na análise da exploração de petróleo na região. Não significa inviabilizar a atividade econômica. Na etapa de planejamento, se estudam várias alternativas para atender à demanda, garantir o fluxo de mercadorias, por meio de projetos que tenham menores riscos sociais e ambientais, diz o Iema. A Petrobras afirma fazer avaliações dos impactos e riscos de suas atividades, incorporando medidas para evitá-los, mitigá-los, compensá-los ou potencializar impactos positivos. Todas essas medidas e ações são incorporadas nos processos de licenciamentos e atestadas pelo órgão licenciador, declara a companhia. Na formulação atual, a Licença Especial representaria um “cheque em branco” para projetos de alto risco ambiental e social, segundo avaliação do Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra), que reúne mais de 50 organizações voltadas ao desenvolvimento sustentável.

Entre os pontos críticos, na avaliação de especialistas, estão: a ausência de definição sobre o que é considerado estratégico; e a manutenção de procedimento único e simplificado de licenciamento, inclusive quando há exigência de Estudo de Impacto Ambiental (EIA), com prazo máximo de 12 meses. Na prática, as disposições simplificariam o licenciamento de projetos de transporte (rodovias, ferrovias e hidrovias), mineração, hidrelétricas e perfurações de petróleo, incluindo obras do novo Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que reúne empreendimentos considerados estratégicos pelo governo. O Ministério do Meio Ambiente diz que a definição para projetos estratégicos, das equipes de analistas ambientais dedicadas a esses projetos e outros detalhes sobre o procedimento da LAE serão regulamentados. O Conselho de Governo definirá os empreendimentos prioritários. O órgão, com representantes de 11 ministérios (como Meio Ambiente, Transportes e Minas e Energia), teve seu formato definido pelo governo na quarta-feira, 15, mas ainda não foi indicada data para reunião.

No texto original de Alcolumbre, era previsto rito único de análise na LAE, mas a nova versão prevê três etapas. Especialistas, porém, apontam que na prática o prazo máximo de um ano é curto para o rito trifásico (que se divide entre licença prévia, de instalação e operação e costuma ser aplicado à maioria dos projetos de grande impacto). Na maior parte dos grandes empreendimentos, a LAE é inexequível, afirma Suely Araújo, ex-presidente do Ibama na gestão Michel Temer (MDB). Para ela, hoje coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, o novo modelo reforça a visão de que o licenciamento é entrave burocrático e não um processo para que os projetos passem por adequações ambientais. Conforme o Ministério do Meio Ambiente, o maior tempo despendido nesse tipo de projeto é para a elaboração dos estudos por equipes especializadas contratadas pelas empresas, o que não é contabilizado nesse período de 12 meses.

Para a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa), a LAE é incompatível com a necessidade de estudos aprofundados e rigorosos para projetos de interesse público e submete decisões que deveriam ser técnicas a pressões políticas. A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base afirma defender procedimentos técnicos necessários no processo de concessão do licenciamento e diz que não faz sentido fechar os olhos para o risco de danos ambientais irreversíveis em empreendimentos de grande impacto na Amazônia. Por outro lado, critica a exigência de um novo processo de licenciamento para cada novo projeto na mesma área, como era antes. É preciso que o histórico de dados de determinada região seja considerado e se procure ganhar tempo sem comprometer a segurança ambiental. O Ministério dos Transportes afirma conduzir estudos internos e dialogar com órgãos responsáveis do governo federal pela regulamentação para dimensionar a aplicação da legislação nos projetos estruturantes de rodovias e ferrovias, além da integração ao planejamento setorial no âmbito do Plano Nacional de Logística 2050. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.