26/Sep/2025
As expectativas quanto a COP30, que ocorrerá em novembro em Belém, evidenciam o quanto o multilateralismo vive uma crise sem precedentes. Os rumores quanto a baixa participação dos países-Parte acendem um alerta. No jargão das negociações, as decisões adotadas nas COPs se baseiam em um processo guiado pelas Partes (Party driven process), e é preciso ter ao menos 2/3 das Partes (130) para poder deliberar os temas que são aprovados por consenso. Além de marcar os 10 anos do Acordo de Paris, a COP30 será o momento de conhecer a ambição climática para o período 2031-2035. Há 168 contribuições nacionalmente determinadas (NDC) vigentes, e até 24/09/2025 apenas 55 países atualizaram suas metas (já excluindo a NDC dos Estados Unidos, que devem ter a saída formalizada em janeiro de 2026). A União Europeia já anunciou que não deverá apresentar a NDC até o final de setembro. Espera-se que Austrália, que será confirmada como sede da COP31, apresente sua nova NDC, bem como China, Índia, Indonésia, África do Sul, dentre outros.
Isso será determinante para cristalizar o comprometimento global com a necessidade de ampliar as ações climáticas, a despeito das convulsões geopolíticas que assolam o mundo. Vale frisar que, de acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), limitar o aquecimento global em no máximo 1.5ºC exige que as metas globais alcancem ao menos 60% de redução de emissões até 2035, considerando os níveis de 2019, e metas alinhadas com a neutralidade de emissões em 2050. Do ponto de vista das negociações, espera-se que sejam aprovadas decisões extremamente relevantes em Belém. Os indicadores para a meta global de adaptação e caminhos para balizar a transição justa são dois temas de destaque. O debate sobre adaptação inclui a urgência de fortalecer a disponibilidade e o acesso facilitado a recursos financeiros para apoiar os países na implementação de ações voltadas para promover resiliência diante dos impactos dos eventos climáticos extremos.
Em paralelo às negociações, a COP30 deverá consolidar uma nova forma de atuação do setor privado e da sociedade civil com base na Agenda de Ação. Desde o Acordo de Paris se acordou que a mobilização de atores não estatais será crucial para obter resultados de mitigação e de adaptação. Nos últimos anos, a Agenda de Ação tem gerado iniciativas que visam impulsionar ações climáticas em diversos setores. O Global Methane Pledge, adotado na COP26, o Global Renewables and Energy Efficiency Pledge, adotado na COP28, e a Baku Harmoniya Climate Initiative for Farmers, adotada na COP29, são exemplos importantes. Como destacado na 4ª e na 7ª Cartas da Presidência da COP30, a Agenda de Ação deve ser um motor de implementação para a expansão de soluções sustentáveis, tendo como referência 6 eixos temáticos e 30 objetivos.
Transformar a próxima década em um amplo mutirão global para a implementação de ações que gerem resultados de mitigação e de adaptação, como amplamente destacado pela Presidência da COP30, exigirá reorganizar a Agenda de Ação voltada para um enfoque de projetos e ações concretas. Conectado ao anseio de disseminar as transições necessárias para fortalecer o Acordo de Paris, a COP30 será palco da apresentação do relatório do Roadmap Baku-Belém sobre a meta de US$ 1,3 trilhão até 2035, acordado na COP29, com a aprovação da nova meta coletiva e quantificada de financiamento climático (NCQG). Financiamento climático é o coração da agenda da UNFCCC e do Acordo de Paris. Desde o Acordo de Copenhague, onde se aprovou a meta de US$ 100 bilhões por ano até 2020 por meio de recursos mobilizados pelos países desenvolvidos, estava previsto que os recursos adviriam de ampla variedade de fontes, públicas e privadas, bilaterais e multilaterais, incluindo fontes alternativas de financiamento.
No entanto, a disputa entre países em desenvolvimento e países desenvolvidos quanto a origem dos recursos, considerando o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, criou uma espécie de vínculo quase automático de financiamento climático com doações que viriam de países desenvolvidos. A NCQG cristaliza o entendimento de que o financiamento climático será gerado de uma ampla variedade de fontes, públicas e privadas, bilaterais e multilaterais, incluindo fontes alternativas. Reconhece o papel das Partes em apoiar financiamento, a relevância dos recursos vindos dos bancos multilaterais de desenvolvimento, do capital privado, dos recursos filantrópicos, dentre outros. Os países desenvolvidos são a principal causa do acúmulo histórico de GEEs na atmosfera e espera-se que mobilizem ao menos US$ 300 bilhões por ano até 2035.
Dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontam que em 2022 os países desenvolvidos proveram US$ 115,9 bilhões em financiamento climático de várias fontes. O relatório Global Landscape of Climate Finance 2025, da Climate Policy Initiative, aponta que em 2023 o financiamento climático amplo atingiu US$ 1,9 trilhão. Desse total, somente US$ 65 bilhões foram dedicados para adaptação e US$ 470 bilhões provêm de recursos domésticos/individuais voltados para energias renováveis. Entre 2021 e 2023 houve um crescimento médio de 26% no financiamento climático, em comparação com 8% entre 2018 e 2020. Neste compasso, será possível atingir US$ 6 trilhões até 2028. Somente para catalisar transição energética, as estimativas de financiamento ultrapassam US$ 4 bilhões por ano até 2030. Investimentos em clima e natureza demandam ao menos US$ 2,4 trilhões até 2030.
E essa demanda será crescente até 2050, quando se espera alcançar a meta de neutralidade global de emissões e remoções. A transição para economia de baixo carbono precisa ser compreendida como oportunidade para fomentar desenvolvimento. Não se trata apenas de reduzir emissões de GEEs, mas sim de fomentar projetos inovadores que geram fontes renováveis de energia, conservar e restaurar florestas, estimular inovação na agricultura, de construir adaptação nas cidades e no campo, dentre inúmeros exemplos que promovem desenvolvimento econômico e social, geram empregos e melhoria na qualidade de vida. O Roadmap de financiamento que será apresentado na COP30 tem o mandato para desconstruir a lógica de que financiamento é uma agenda voltada para fundos multilaterais abastecidos em parte com recursos de doação, como o Fundo Verde para o clima.
O Círculo de Finanças criado pela Presidência da COP30 propôs cinco trilhas para repensar financiamento: i) reforma dos bancos multilaterais; ii) expandir financiamento concessional (com taxas de juros menores, períodos de carência maiores, esquemas de garantia facilitados); iii) instrumentos inovadores para mobilizar capital privado; iv) ampliar a capacidade dos países mobilizarem recursos por meio de plataformas nacionais e v) fortalecimento de marcos regulatórios voltados para financiamento. A despeito das incertezas geopolíticas, financiamento na perspectiva de empréstimos que catalisarão negócios que gerarão desenvolvimento tem como enorme desafio se diferenciar do financiamento de projetos não alinhados a objetivos climáticos. O sucesso do Acordo de Paris está intimamente relacionado à possibilidade de ampliar investimentos massivos que retornem ganhos de mitigação, adaptação e cobenefícios que permitam, sobretudo, promover ações que gerem desenvolvimento sustentável. Para que seja possível transformar a nova década em uma efetiva fase de aceleração de projetos que tragam benefícios climáticos, a COP30 tem o desafio de destravar financiamento proveniente de várias fontes, torná-lo mais barato e acessível. Fonte: Rodrigo C. A. Lima. Broadcast Agro.