15/Sep/2025
Os juros básicos (Selic) no nível mais alto em quase duas décadas, de 15% ao ano, estão provocando estragos nas finanças de empresas e consumidores, que enfrentam crescente dificuldade para manter suas contas em dia. Como consequência, o número de empresas e de pessoas físicas inadimplentes no País atingiu um nível recorde neste ano. Em julho, o Brasil somava 8 milhões de empresas (um terço das companhias existentes) com dívidas em atraso. Cada uma delas tinha sete compromissos não honrados na data. No caso dos consumidores, são 78,2 milhões de brasileiros (quase metade da população adulta) inadimplentes, segundo a Serasa Experian, datatech especializada em dados e informações financeiras. Em ambos os casos, é a maior marca desde o início da série, em 2016. Cada brasileiro negativado tem, em média, quatro dívidas com pagamento atrasado. Das empresas inadimplentes, cada uma tem sete compromissos pendentes.
E a inadimplência segue em níveis recordes entre consumidores e empresas, mesmo em um contexto de desemprego na mínima histórica e de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), ainda que em desaceleração trimestre a trimestre. Ou seja, apesar das condições que poderiam favorecer a queda do calote, ele continua em alta. O cenário de dívida média por CPF (Cadastro Nacional de Pessoa Física) e CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) mostra o quão difícil é para o consumidor e para a empresa saírem da situação de inadimplência. Há uma relação direta entre o aumento da inadimplência e a elevação dos juros básicos. Entre setembro de 2024 e junho deste ano, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central elevou a taxa Selic para conter a alta da inflação. E agora essa alta está se manifestando na atividade.
Mesmo com o Banco Central tendo interrompido a alta dos juros em junho, as consequências do aperto monetário serão observadas nos próximos três trimestres, por causa da defasagem que há entre as decisões de política monetária e os efeitos na economia real. O ambiente mais restritivo à aprovação de novas concessões de crédito também agrava o quadro da inadimplência. É que a desaceleração nas concessões, tanto para o consumidor quanto para as empresas, tem sido um obstáculo para quem precisa renegociar dívidas. Isso porque a dificuldade enfrentada pelo brasileiro para pagar em dia as dívidas está na redução da renda líquida. Ou seja, o que sobra de fato no seu bolso diminuiu, segundo a Acrefi, associação que reúne as financeiras. A inadimplência de empresas e consumidores na modalidade crédito livre (com destinação não regulada pelo governo) atingiu em julho 5,2% do saldo a receber pelo sistema financeiro, de acordo com o último relatório de crédito do Banco Central. Trata-se de um dado preocupante, pois esse é o maior nível do indicador em oito anos.
Em julho, a inadimplência do consumidor nessa modalidade de financiamento foi de 6,5%, com alta de 1,2% desde o início do ano. No caso das empresas, a inadimplência em financiamentos com recursos livres atingiu 3,3%, com avanço de 0,8%. Na visão da Acrefi, os dados de inadimplência foram afetados também pela mudança na forma de computar o ‘calote’, que permitiu antecipar a contabilização da chamada Provisão para Devedores Duvidosos (PDD) nos balanços dos bancos. Tem uma parte que é a mudança do critério de contabilização, mas, independentemente disso, a inadimplência está em alta. Com relação ao endividamento dos consumidores, além da alta dos juros, dois fatores têm afetado a renda líquida das famílias: a inflação elevada e as apostas esportivas. A inflação ao longo desses últimos meses tirou poder aquisitivo do orçamento, principalmente de famílias de média e baixa renda, e há comprometimento de uma parte significativa do orçamento com as bets.
Entre as empresas, as mais castigadas pelo aperto dos juros são as de menor porte. Dos 8 milhões de companhias inadimplentes, 7,6 milhões são pequenas e microempresas, elas responderam por 52,8 milhões das 58,6 milhões de dívidas “negativadas”. A Serasa Experian lembra que as pequenas e microempresas são as mais afetadas porque não têm histórico de crédito, nem como dar garantias para obter novas linhas para refinanciar dívidas. Também há riscos de desdobramentos importantes no emprego em razão do avanço da inadimplência entre as pequenas e microempresas, já que elas respondem por cerca de 70% dos postos de trabalho da economia brasileira. O levantamento da Serasa mostra ainda que mais da metade das empresas inadimplentes, de todos os portes, é do setor de serviços, reflexo da grande importância do setor na economia brasileira.
No entanto, há um avanço importante na inadimplência de empresas do setor industrial em julho na comparação anual, o que pode ser reflexo da desaceleração da atividade e do tarifaço imposto pelo governo dos Estados Unidos às exportações brasileiras. Alguma questão relacionada a tarifas provavelmente pode estar prejudicando a inadimplência desse setor, mas não foi possível isolar esse fator para saber o que é consequência dos juros elevados e o que pode ser reflexo das tarifas. A perspectiva para a inadimplência das empresas e do consumidor é ainda de meses difíceis. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) projeta aumento do endividamento e da inadimplência até o fim do ano. A entrada de recursos extras, como o 13º salário e o pagamento de precatórios, somada à desaceleração da inflação, pode trazer algum alívio. Porém, a situação só será revertida com a queda dos juros, que só deve ocorrer a partir do primeiro trimestre de 2026. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.