01/Aug/2025
Oficializada na quarta-feira (30/07), pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a tarifa de 50% imposta aos produtos brasileiros trouxe uma longa lista de exceções, o que aliviou o pior cenário imaginado por especialistas; pelo menos por ora. Para a MB Associados, o Brasil acabou sendo beneficiado, mas novamente sem muito sentido econômico. Não parece haver um racional muito claro sobre o que foi cortado e o que foi deixado, a não ser uma vaga ideia de alternativas de importação para alguns desses produtos. Na avaliação de analistas, o governo Trump traz um cenário de bastante incerteza para o comércio global.
As regras multilaterais são ignoradas e os acordos de comércio não significam liberalização comercial, mas sim administração de comércio, afirma o Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento. Com um cenário global mais adverso, os especialistas apontam que chegou a hora de o Brasil encampar uma abertura da economia e endereçar reformas que melhorem a produtividade do País, o que contribuiria para colocar a economia brasileira mais próxima do patamar das nações ricas. Uma alternativa viável seria iniciar um processo de abertura comercial e aprofundar as reformas estruturais que promovam estabilidade macroeconômica e ganhos de produtividade. A economia brasileira apresenta um grau de proteção que restringe sua integração às cadeias globais de valor, afirma UBS Global Wealth Management. Opinião de especialistas:
- Sandra Polónia Rios (Diretora do Cindes)
O Brasil enfrenta um contexto internacional em rápida deterioração. O País não aproveitou as décadas em que o comércio internacional crescia a taxas elevadas, movido pela formação de cadeias globais ou regionais de valor, e era regido por regras multilaterais e por acordos preferenciais de comércio. Durante esse período, a economia brasileira se manteve fechada, com elevadas barreiras às importações e ficou praticamente à margem da rede de acordos preferenciais de comércio. O resultado foi a estagnação da produtividade e a perda de participação da indústria no PIB e nas exportações. O mundo está migrando para um cenário dominado por políticas comerciais que priorizam preocupações geopolíticas e de segurança. Com Trump, as regras multilaterais são ignoradas e os acordos de comércio não significam liberalização comercial, mas sim administração de comércio. Diante da rápida e radical mudança de contexto, cabe traçar estratégias que possam fomentar um salto de produtividade. Além disso, uma reforma da política comercial, que inclua a revisão das tarifas, a facilitação do comércio e a aceleração da negociação de acordos com países com mercados relevantes, é crucial.
- Sergio Vale (Economista-chefe da MB Associados)
A versão século 19 de Trump tem sido mantida. Ele vê as tarifas de importação como um instrumento de melhora do déficit comercial norte-americano e de aumento de arrecadação. Não vai mudar estruturalmente nenhuma das duas contas, mas Trump não se importa com a matemática econômica. Seu ativismo tarifário é quase por ser um dos poucos instrumentos que ele tem a mão para manobrar com certa flexibilidade. Mas até aqui há limites. A indústria norte-americana tem tentado trazer algum mínimo de razoabilidade para uma discussão tarifária já de partida bizarra. Vemos isso nas exceções que o governo norte-americano acaba precisando conceder para não machucar sua economia. De certa forma, Trump retrocedeu ainda mais de sua persona de século 19 e mimetiza Maria Antonieta agora, sugerindo brioches à população norte-americana, ou, qualquer coisa no lugar do café. Mas dado que ele nada conseguirá de efetivo em relação à conta comercial nos próximos anos, voltaremos a ver ele mexer nas tarifas contra o Brasil e contra o resto do mundo algumas vezes. A suposta vitória que Trump é uma vitória de Pirro, que afastará ainda mais o mundo de comercializar com os Estados Unidos, que se tornam, cada vez mais, parceiros não confiáveis.
- Solange Srour (Economista do UBS Global Wealth)
A tarifa de 50% sobre produtos brasileiros por parte dos Estados Unidos é um desafio que vai muito além do aspecto comercial. Nesse contexto, é fundamental que o Brasil atue com pragmatismo e visão estratégica. Reações precipitadas podem agravar os custos econômicos. Embora a legislação brasileira permita, a adoção de contramedidas tende a ser potencialmente danosas. O resultado pode ir além de uma retração no comércio de bens e serviços, atingindo o fluxo de capitais e investimentos. Uma alternativa viável seria iniciar um processo de abertura comercial e aprofundar reformas estruturais que promovam estabilidade macroeconômica e ganhos de produtividade. Será importante oferecer apoio pontual aos setores mais afetados, mas vale destacar que, caso haja apoio via crédito, este deve ser transitório, evitando-se a criação de dependências permanentes e distorções alocativas. Por fim, o Brasil deve reafirmar seu compromisso com o multilateralismo e com uma diplomacia econômica equilibrada, evitando fortalecer exclusivamente o Brics, sob o risco de fomentar um isolamento ideológico. Não podemos fechar pontes com outros parceiros prioritários; ao contrário, devemos buscar parcerias multilaterais sólidas.
- Lia Valls Pereira (FGV Ibre)
Neste primeiro momento, o que chama a atenção é o teor ainda muito político. Chama a atenção também que, dentro do decreto, os Estados Unidos colocam que qualquer medida de retaliação do Brasil vai ser respondida da mesma forma. Ou seja, com tarifas também mais altas. Os Estados Unidos já incluíram muitos produtos que eram do interesse brasileiro na lista de exceção, embora alguns importantes não estejam incluídos, como café, calçados, frutas e cacau. Agora é ver, com as negociações dos próprios setores da economia brasileira, se algum tipo de concessão interessaria aos norte-americanos. No fundo, o que o Trump faz não é protecionismo. Ele, na verdade, impõe sanções de caráter comercial porque ignora qualquer compromisso que tinha em relação às tarifas consolidadas pela Organização Mundial do Comércio (OMC) e coloca os países, ainda mais o Brasil, com pequeníssima possibilidade de retaliação. A situação do Brasil é mais complicada pelo fato de Trump sempre insistir no tema político. Esse é o pior cenário. De qualquer forma, o governo brasileiro tem de continuar tentando uma negociação mais técnica.
Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.