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30/Jul/2025

Tarifas dos EUA: entrevista com Rubens Ricupero

Na guerra das tarifas declarada por Donald Trump, o Brasil se encontra bem-posicionado. A avaliação é do ex-embaixador na Itália e ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero. O País, além de registrar déficit comercial com os Estados Unidos há 17 anos, tem a seu favor uma reserva em dólares que financia em até 16 meses suas importações. A queixa do Brasil junto ao órgão de resolução de controvérsia da Organização Mundial do Comércio (OMC) tem um valor legal e moral, mas sem efeitos práticos já que Trump não respeita nada.

Ele acrescenta que a solidariedade do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro é sincera, porque ambos foram questionados pela Justiça por decisões tomadas após suas respectivas derrotas eleitorais. Além disso, para o ex-embaixador, o presidente Lula deveria parar de falar na criação de uma moeda para o comércio entre os Brics porque a medida carece de resultados práticos, mas o presidente não está errado em contestar o ataque de Trump ao Brasil via tarifaço. Segue a entrevista:

O Brasil perde muito com a tarifa de 50% às exportações para os EUA imposta por Donald Trump?

Rubens Ricupero: O comércio do Brasil com os EUA é importante, mas não é o mais importante para nós. É lamentável, mas é uma perda que pode ser absorvida.

Por quê?

Rubens Ricupero: Temos uma diferença que nos separa de uma maneira nítida de outros países da América do Sul. Todos os países do Peru para o Norte destinam aos Estados Unidos cerca de metade das suas exportações. Em um dos casos, o México, é mais de 80%. O Brasil envia apenas 12%. Os Estados Unidos são o segundo destinatário das exportações brasileiras. O primeiro é a China, com 30%. A Ásia representa quase 50%. Um país que só agora que está crescendo, o Bangladesh, importa mais de US$ 1 bilhão em algodão do Brasil.

Bangladesh sozinho já importa US$ 1 bilhão do Brasil?

Rubens Ricupero: Sim, importa mais do que os cinco países nórdicos somados - Islândia, Suécia, Dinamarca, Noruega e Finlândia. Em Bangladesh está a grande indústria de tecidos, então eles importam algodão em rama e transformam em tecidos. O comércio exterior brasileiro é diversificado.

Mas não há diferença entre o que exportamos para a China e Estados Unidos?

Rubens Ricupero: A China consome sobretudo petróleo bruto, soja em grão e minério de ferro. Os Estados Unidos, embora respondam por 12% das nossas exportações, são importantes para manufaturas, inclusive as de alto conteúdo tecnológico - os aviões da Embraer, os motores elétricos da Weg e produtos siderúrgicos da Tupi. Mas o comércio brasileiro é diversificado. A Europa recebe 15% a 16% das nossas exportações. A Argentina e a América Latina representam 10%. Não há uma concentração num só mercado.

Independentemente disso, o Brasil deve entrar com queixa junto ao órgão de resolução de controvérsias da OMC. Qual o efeito prático dessa ação?

Rubens Ricupero: Até onde sei o Brasil já entrou com a queixa no sistema de solução de controvérsias e é um caso fácil de ganhar. Ganha, mas não leva, porque o Trump não liga. Tem um valor moral e legal, até para marcar o precedente para o futuro, mas não vai adiantar nada. O Trump nem cita a Organização Mundial de Comércio, nem toma conhecimento da existência dela.

Fala-se que falta diálogo entre os presidentes Lula e Trump. Você concorda?

Rubens Ricupero: Não houve contato de alto nível entre os mandatários do Brasil e dos Estados Unidos. Nisso, há uma diferença com outros países. Quase todos os outros tiveram contato. Não sei se teria adiantado porque a situação no Brasil é única. É o único em que existe um componente político, que é o caso do Bolsonaro e da queixa que o Trump faz das decisões do Supremo Tribunal Federal.

O Bolsonaro é realmente importante para o Trump?

Rubens Ricupero: Quando Trump se queixa que o Brasil persegue o Bolsonaro, está na verdade defendendo a posição dele. O Bolsonaro está sendo processado exatamente pela mesma acusação que o Trump sofreu dos Estados Unidos, de ter perdido a eleição e procurado reverter isso por meio de procedimentos ilegais. A solidariedade dele a Bolsonaro é sincera. A diferença é que aqui corre um processo e Bolsonaro provavelmente vai ser condenado entre setembro e outubro.

Fala-se também que Trump teria se irritado com a fala de Lula sobre uma moeda para o comércio entre os Brics.

Rubens Ricupero: Isso é especulação. Lula deveria parar de falar nisso porque não traz resultados práticos. Quem recebe pelas exportações são os exportadores, e eles querem receber em dólar. Desde 2023 existe um acordo entre Brasil e China para usar moedas locais em transações comerciais e nunca avançou porque o exportador não quer receber em yuan. No comércio com a Argentina, por exemplo, o exportador não vai querer receber em peso.

Lula erra no discurso contra Trump nesta questão do tarifaço?

Rubens Ricupero: Eu não acho que o presidente está errado. Não começamos essa guerra. Foram Trump e os Estados Unidos. Tenho visto muitas críticas ao governo brasileiro, mas quem critica são os traidores da Pátria. O Brasil nunca se recusou a negociar. Em março, mandou uma delegação do Itamaraty aos Estados Unidos, chefiada pelo secretário de Assuntos Econômicos. E, em maio, no dia 20, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, junto com o vice-presidente Geraldo Alckmin, mandaram uma carta aos Estados Unidos pedindo que dessem uma resposta às ofertas que o Brasil tinha feito. E eles nunca responderam. Do lado brasileiro, nunca houve a recusa e o engajamento na negociação comercial.

Fonte: Broadcast Agro.