28/Jul/2025
Nos últimos dez anos, o número de empresas brasileiras que passaram a exportar aos Estados Unidos (EUA) cresceu quase 70%. Em 2024, mais de 9,5 mil companhias nacionais venderam produtos e serviços àquele país, com a entrada de quase 4 mil novos fabricantes nesse mercado em uma década, segundo estudo da Amcham e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Boa parte dessas empresas não integra grandes corporações. Em sua maioria, são fabricantes e prestadores de serviço de médio porte que investem durante anos para conquistar a confiança dos clientes em um dos mercados de consumo mais disputados do mundo. Sem "pai rico" ou acesso a grupos organizados que defendam seus interesses, essas companhias ficaram sem interlocução, a não ser a do governo brasileiro, para negociar com os Estados Unidos, que ameaçam impor tarifa de 50% sobre todos os produtos fabricados no Brasil a partir de 1º de agosto.
Na prática, começou uma corrida contra o tempo. Acostumados às muitas adversidades que enfrentam no País, os empresários negociam com clientes e fornecedores, antecipam exportações e refazem planilhas de custos e planos para o futuro, apesar do cenário incerto. A Prática Produtos, fabricante de equipamentos para cozinhas industriais, restaurantes e panificadoras, afirma que está encarando o tarifaço como outros desafios que já superou. A Prática chegou aos Estados Unidos há exatamente uma década. Hoje, o mercado norte-americano responde por 10% do faturamento anual, de cerca de R$ 400 milhões, e por 30% das exportações. A empresa mantém uma filial em Dallas, que emprega dez funcionários (a maioria é norte-americana; apenas dois são brasileiros). A empresa investiu US$ 4 milhões na conquista do mercado norte-americano, aplicados em estrutura física, certificações e no atendimento a uma série de requisitos.
Além dos Estados Unidos, a empresa possui filiais no Chile e na Alemanha e exporta para 40 países. Independentemente de qualquer contingência, o mercado norte-americano é vigoroso e as oportunidades são imensas: não dá para abrir mão de estar lá. Num primeiro momento, a empresa redirecionou a produção da fábrica em Pouso Alegre (MG), onde trabalham a maioria dos 750 empregados. Reforçou a linha destinada à exportação para criar o que chama de "pequeno pulmão" de estoque com os preços atuais, caso as tarifas subam na proporção prometida. O estoque nos Estados Unidos saltou de 300 para 450 fornos, avaliados em cerca de US$ 6 mil cada. Na etapa seguinte, começou a fazer contas. Em sua projeção, a alta de preços não chegará a 50%, pois a tarifa incidirá sobre o valor de transferência entre matriz e filial, e não sobre o preço final ao consumidor. Um dos recursos é regular o preço de transferência para deixar a conta mais viável.
Também será preciso mexer um pouco na margem e negociar com distribuidores. A solução funciona na teoria caso a tarifa suba 50%. Se a guerra comercial escalar ou as condições mudarem, não. A empresa também estuda implantar uma linha de montagem "leve" nos Estados Unidos. Com um grande armazém em Dallas, a ideia é concluir ali a etapa final da produção, redirecionando para aquele país peças hoje importadas pelo Brasil. Uma das vantagens da Prática é haver poucos concorrentes no mundo que fabriquem os fornos rápidos de sua linha. O equipamento combina micro-ondas, ar quente em alta velocidade e um conversor catalítico que transforma gordura em água e gás carbônico. Assim, a comida não deixa cheiro ao ser aquecida e o forno pode ser usado em espaços pequenos, como lojas de conveniência, cafés e lanchonetes de hospitais. Grandes redes, como 7-Eleven e Oxxo, usam os fornos da marca, que desenvolveu a tecnologia Internet of Kitchen (IoK).
O sistema permite a esses grupos gerenciarem de maneira centralizada todos os pontos de venda. A Mecalor, fabricante de equipamentos industriais para operações com temperatura e umidade controladas, começou a trilhar caminho parecido ao da Prática há cerca de três anos. Com operações no México, na Colômbia e nos Estados Unidos, a empresa exporta para mais de 25 países e planejava crescer com mais força no mercado americano nos próximos anos. Tem 500 funcionários, sendo 450 no Brasil, e fábrica na zona norte de São Paulo. Atualmente, cerca de 20% dos R$ 450 milhões de receita da Mecalor vêm das exportações, dos quais 1,5% têm origem nos Estados Unidos. Até o anúncio da majoração das tarifas, o plano era dobrar faturamento e vendas aos Estados Unidos em cinco anos. A Mecalor calcula ter investido R$ 10 milhões em três anos em testes, certificações e na montagem de sua estrutura naquele país. A ideia era aumentar as exportações nos próximos anos, até ter certeza de que valeria um investimento maior nos Estados Unidos ou no México.
Mesmo diante das perspectivas desfavoráveis, a Mecalor não descartou os planos de crescer nos Estados Unidos. Por fabricar equipamentos sob medida para grandes indústrias, hospitais e farmacêuticas, a empresa não teve como antecipar encomendas. Nos Estados Unidos, seus produtos são usados em fábricas operadas por robôs, que exigem controle preciso de umidade e temperatura; em uma fabricante de embalagens, no processo de resfriamento de frascos; em câmaras de validação de choque térmico da indústria automotiva; e em equipamentos da área diagnóstica. O País tem vocação para produzir máquinas e equipamentos com tecnologia, e o mercado externo é essencial para manter essa engrenagem em funcionamento. No ano passado, o segmento encolheu por causa das condições conjunturais no Brasil e a exportação ajudou a minimizar esse efeito. A empresa está otimista, mas o momento é de cautela. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.